Mudas, telepáticas, cegas, inexatas, rotas e alteradas

As guerras são imorais. Não há guerra justa e nem justificável, pois todas banalizam a barbárie. Fiquei assustada ao ler o e-mail “Pensem nas crianças mudas, telepáticas”, que divulga o abaixo-assinado “Chega de derramamento de sangue: cessar fogo, já!”.

Desde então, tenho cantarolado “Rosa de Hiroshima” (Vinícius de Moraes e Gerson Conrad), que é uma canção de acalmar, pois possui o dom de desacumular tensões, pela intensidade da denúncia e do alerta de seus versos: “Pensem nas meninas / Cegas, inexatas, / Pensem nas mulheres / Rotas, alteradas, / Pensem nas feridas / Como rosas cálidas”.


 


Dói constatar que São Paulo está sitiada sob a ameaça de pessoas privadas de liberdade por terem cometido delitos e que, condenadas, foram afastadas do convívio social.


 


O tapete debaixo do qual governantes escondiam a perda paulatina do controle da garantia do direito a uma vida sem violência está roto e esfarrapado. Há uma situação de guerra em nosso país. Guerra é guerra. E temos a nossa, notadamente nas regiões metropolitanas.


 


Sucessivos governos se recusaram a ver isso. Só recentemente (e justiça se faça, sob a marca do governo Lula) começa a aparecer, com toda a pujança, a desfaçatez da pilhagem histórica e impune com que um número expressivo de homens públicos se apodera do dinheiro público, como alguém se locupleta de uma herança: por direito.


 


Isso tem nome: é roubo de dinheiro público que deveria chegar aos grotões urbanos e rurais para cimentar cidadania, prevenindo e minorando sofrimentos de crianças mudas, telepáticas; das meninas cegas, inexatas; das mulheres rotas, alteradas…


 


Talvez seja espantoso para os incautos aparecer como suspeito de ser um sanguessuga o caridoso deputado federal Osmânio Pereira de Oliveira, mineiro de Pedra Azul (Paulinho, valei-nos!), advogado, empresário e presidente do conselho curador da Fundação Mário Penna (especializada em tratamento de câncer), a quem o povo mineiro, de boafé, concedeu consecutivos mandatos.


 


Católico fundamentalista fervoroso e juramentado, o deputado Osmânio pode ser uma fraude ética abençoada pelo Vaticano, sob o comando de quem, em nome de Deus, ele tem como maior feito parlamentar ser perseguidor voraz do direito de decidir das mulheres.


 


Osmânio, idealizador da proposta de plebiscito sobre os corpos das mulheres, é um andarilho de partidos (MDB; PSDB, várias idas e voltas, e vice-líder do PSDB, de 1997 a 1999; e PTB) e parece que agora é um sem-partido e em breve um sem-mandato (sangue de Jesus tem poder!).


 


Não tem pudor de dizer que renuncia à sua candidatura a deputado federal em 2006 porque o seu fiel eleitorado não aceitará votar em nomes sobre os quais pairam suspeitas. Ah, coitado! Se quem dá aos pobres empresta a Deus, quem rouba dos pobres rouba de Deus!


 


Nas civilizações contemporâneas, há consenso em não se aplicar a lei de Talião, “olho por olho, dente por dente”, estabelecida por Moisés e um dos fundamentos do Código de Hamurabi.


 


Ladrões de Deus devem ser punidos segundo os rigores da lei: penas justas, porque estão em dívida para com a sociedade, já que violaram as normas de conduta aceitáveis para a vida social, definidas por contrato ético. Está na hora de um novo contrato social e ético para o Brasil.


 


Logo, é tempo de cismar. É tempo de repensar. É tempo de releituras. É tempo de questionamentos. É tempo de tomar as rédeas do futuro em nossas mãos. E de duvidar de tudo. Estava certo o velho Marx.

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