Peru: mais um novo desafio

Com previsão para o próximo dia 7 de maio, o segundo turno das eleições presidenciais no Peru poderá trazer mais uma grata notícia, caso seja confirmado o favoritismo do candidato Ollanta Humala do movimento União pelo Peru. Do

Para o segundo turno a situação ainda é indefinida com uma diferença a favor do ex-presidente Alan García em relação à conservadora Lourdes Flores, no momento em que escrevo.

O atual presidente Alejandro Toledo amarga enorme rejeição popular. Lourdes Flores, a candidata do FMI e apoiada pelo grande empresariado chegou a ser apontada como favorita, mas poderá terminar em terceiro lugar. Uma outra candidata, Martha Chavéz, que chamou a atenção apenas por defender abertamente o déspota corrupto Alberto Fujimori, em nenhum momento chegou a representar qualquer coisa. Aliás, ela também é adepta do famigerado Opus Dei, como certo candidato à presidência no Brasil. 

O resultado das eleições peruanas deverá confirmar a onda de repúdio dos povos latino-americanos ao projeto neoliberal. Ollanta Humala é um ex-militar de 43 anos que se diz simpatizante do presidente venezuelano Hugo Chavéz. Através de um movimento militar Humalla tentou derrubar Alberto Fujimori. Depois do fracasso do golpe, busca chegar a presidência pela via eleitoral prometendo mudanças profundas na sociedade peruana. De qualquer forma, como adverte Miguel Urbano Rodrigues (1), Humala deve ser analisado com cautela. Sobre ele pesam denúncias de violações dos direitos humanos quando ajudou a reprimir o grupo maoísta Sendero Luminoso nos anos Fujimori.

Mas as coisas realmente estão mudando na América Latina. Num passado recente um candidato com as propostas de nacionalização e restrições ao livre comércio com os Estados Unidos teriam pouca viabilidade eleitoral, além de ter que agüentar chacotas da mídia e de supostos especialistas em assuntos internacionais. São outros tempos. Atualmente, nacionalização de recursos estratégicos e a denúncia das condições assimétricas do comércio mundial já podem ser consideradas propostas de governo. E Ollanta é o único candidato com grande possibilidade de vitória que declara simpatia por essas propostas.

A economia vai bem, mas o povo vai mal.

No governo Toledo a economia caminhou de forma satisfatória. Em 2005 a economia cresceu 6,7% com uma inflação de apenas 1,5% (2). De fato, durante a administração Toledo a taxa de inflação se manteve abaixo da expansão do PIB, como se observa no quadro abaixo:

Em relação ao comércio externo, se observa que, depois de sucessivos déficits na balança comercial, o Peru registra desde 2002 crescentes superávits que deram um certo alívio no saldo de transações correntes que apresenta também sucessivas melhoras. Em 2000 o Peru registrava um déficit em transações correntes de 2,9% do PIB. O resultado do comércio refletiu nas reservas internacionais que acumularam um saldo de US$ 14, 097 bilhões no final de 2005.

De qualquer forma é importante não se esquecer que os países periféricos vêm atravessando um ótimo cenário externo por conta da alta nos preços das commodities (3) e pela crescente liquidez internacional. Em relatório do ministério da Economia e
Finanças publicado em agosto de 2005, o governo peruano reconhece que os resultados positivos da economia estão intimamente ligados a evolução dos preços dos bens de exportação, e de forma otimista entende que este cenário deverá se manter favorável (4).  O problema é que essa situação não pode durar para sempre. Em algum momento os preços devem cair simplesmente pelo fato de que, mesmo que a demanda continue aquecida, os altos preços das commodities devem atrair novos produtores o que significa aumento de oferta.

Entretanto, mesmo com números positivos na economia, Toledo e seu governo amargam péssimos índices de popularidade. Mas então qual seria a explicação para esta aparente contradição? Realmente, bons indicadores econômicos não significam necessariamente que o povo também vai bem. Esta constatação se aplica perfeitamente ao Peru sob o atual governo. Ora, o crescimento peruano beneficiou principalmente os mais ricos, pois a maior parte da população continua sofrendo o descaso de anos de neoliberalismo: a taxa de pobreza no Peru continua acima dos 50%, com quase 20% da população em condições de extrema pobreza. O subemprego atinge 60% dos trabalhadores num país em que energia elétrica e água potável são um “luxo” desfrutado por apenas 20% dos peruanos.

Num quadro como esse, cumprir as promessas de campanha pode significar uma questão de sobrevivência política. Os recentes episódios de sublevação popular no continente, como, por exemplo, no Equador em abril de 2005, é um sinal claro de que a vida está um tanto perigosa para governantes traidores. Estes que depois de eleitos se preocupam unicamente em mostrar bons fundamentos econômicos para ricos empresários e dão às costas ao povo que prometeram servir. E que isto sirva de alerta.

1. Cf. RODRIGUES, Miguel Urbano (2006). As muitas incógnitas da eleição peruana. (www.vermelho.org.br).
2. Os dados utilizados foram retirados do sítio do banco central do Peru e do Instituto Nacional de Estadística e Informática (INEI).
3. A pauta de exportação do Peru inclui manufaturas de prata, cobre, zinco, minérios, petróleo e derivados, algodão, café e açúcar.

4. Cf. Marco Macroeconómico Multianual 2006-2008 (revisado). ( www.mef.gob.pe).

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