Política Externa e o Caminho da Servidão

A política externa encaminhada pelo governo Lula é uma das áreas em que as diferenças com o governo de Fernando Henrique e os tucanos são mais visíveis. Um assunto que não costuma despertar grandes paixões em épocas de eleição, ultimamente vem causando ma

O caso da nacionalização do gás da Bolívia é exemplar: toda culpa foi colocada na conta do Itamaraty e na condução da política externa que estaria desorientada diante de um problema que, diga-se, foi insistentemente superestimado pela mídia conservadora. A revista Isto é do dia 10 de maio, por exemplo, chegou a estampar na sua capa a surpreendente notícia que o presidente Evo Morales poderia fazer o Brasil parar ao nacionalizar o gás, num patético show de desinformação.


 


 
De fato, desde o início, sob o comando do ministro Celso Amorim, a política externa ganhou contorno claramente diferente em relação ao seu antecessor. Antes mesmo de sua posse, em dezembro de 2002, o presidente Lula enviou a Caracas seu futuro assessor para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, para oferecer auxílio à Venezuela que passava por uma greve geral que paralisava o país. Outro ponto importante foi a nomeação do embaixador Samuel Pinheiro Guimarães para Secretário Geral das Relações Exteriores. Vale a pena recordar que o embaixador foi exonerado do cargo de diretor do Instituto de Pesquisas em Relações Internacionais (IPRI) do Itamaraty em abril de 2001 por criticar publicamente a entrada do Brasil no acordo de livre comércio das Américas (Alca).


 



Como foi noticiado recentemente, o candidato à presidência da República Geraldo Alckmin (PSDB-PFL) em recente visita a Lisboa no dia 10 de julho, fez criticas contundentes a política externa do governo Lula que, segundo ele, estaria deixando o Brasil isolado, ao contrário de outros países latino-americanos que buscam acordos bilaterais com os Estados Unidos.


 


Quais os fatos?


 



Mas vamos rapidamente analisar a afirmação de que o Brasil estaria isolado. Os fatos são que, no atual governo, além do crescimento das exportações, houve considerável aumento da diversificação dos parceiros comerciais, como muito bem destacou Bernardo Joffily (1). Países muito pouco ativos no comércio com o Brasil passaram a desenvolver laços de cooperação e amizade, como, por exemplo, os países Árabes e a Índia. O presidente Lula já visitou quase duas dezenas de países africanos, e o Brasil vem aprofundando a sua integração na América do Sul, dando prioridade aos países em desenvolvimento. Isto está muito bem representado na expansão da presença brasileira nos países em desenvolvimento: no atual governo foram abertas ou reabertas 14 embaixadas que permitem melhores relações diplomáticas e impulsionam nosso comércio. Durante o governo Lula as exportações para África cresceram 153% e para Liga Árabe 100% (2).  Tudo isso parece despertar um resquício de inveja naqueles que antecederam o atual governo, como afirmou o ministro Celso Amorim (3).


 



Ou seja, as evidências demonstram que a política externa do atual governo tem alcançado sucesso. Então em que se baseia o candidato Geraldo Alckmin quando afirma que “o Brasil está isolado”? Unicamente na não consecução de um acordo de livre comércio com os Estados Unidos. Ou seja, propõe para o Brasil o caminho da servidão nas relações externas. Aliás, na análise dos setores mais reacionários, todo o problema da política externa se resume em vender mais mercadorias; o resto não importa!


 



 É óbvio que acordo de livre comércio não é condição necessária para a realização de fortes vínculos comerciais, nem de laços de amizade e cooperação entre nações soberanas. Como lembrou o economista Paulo Nogueira Batista Júnior, as principais potências econômicas, Estados Unidos, Japão e União Européia, embora mantenham grande inter-relacionamento comercial, jamais tiveram  acordos de livre comércio entre si (4). O mesmo ocorre com a China e Estados Unidos etc.


 


No entanto, a asnice dita por Alckmin, que provavelmente deve ter causado risos contidos nos jornalistas presentes, pelo menos revela seu caráter “daslu” de amor aos interesses dos países ricos, em especial aos EUA. Talvez imagine que sua postura de lacaio lhe renderá benefícios no futuro. Mas engana-se. Como disse um dos principais negociadores norte-americanos para temas agrícolas, Jason Hafemeister, a ambição norte-americana não tem limites. (5)


 


O Mercosul avança
 


O Mercosul também já foi alvo de acusações sem fundamentos do tucanato. Aqui mais uma vez a realidade se impõe de forma avassaladora. O Brasil comemora a entrada da Venezuela, seu mais novo sócio permanente. Do mesmo modo há um esforço para que a Bolívia passe de membro associado a pleno. No último dia 20, durante a cúpula dos presidentes do Mercosul em Córdoba (Argentina), num clima de grande otimismo, o presidente Fidel Castro assinou um acordo histórico entre Cuba e os países do bloco impondo um revés na política de George Bush que tem endurecido na sua tentativa de isolar a nação Cubana (6). O presidente Lula falou de forma entusiasmada a respeito do momento atual que atravessa o Mercosul, “Hoje quem quiser falar em Alca precisa falar primeiro com o Mercosul. Queremos construir acordos com todos os países do mundo e que nossa soberania seja respeitada. Há dois séculos deixamos de ser colônias e não desejamos voltar a ser colônias” (7).  



 
Enfim, a política externa brasileira caminha a passos largos no sentido de maior integração e soberania nacional. E assim seguirá.


 


Notas


 


(1) JOFFILY, Bernardo (2006). Alckmin propõe em Lisboa marcha-à-ré na política externa. Vermelho, 17 de julho. (www.vermelho.org.br)


(2) OLIVEIRA, Eliane. Iniciativa diplomática dá novo impulso à exportação. O Globo, 10 de
julho.



(3) O BRASIL não usa marines (Entrevista com Celso Amorim) (2006). Carta Capital, nº 393, 17 de maio.


(4) BATISTA JUNIOR, Paulo Nogueira (2005). O Brasil e a economia internacional: recuperação e defesa da autonomia nacional. Rio de Janeiro: Campus.


(5) BALTHAZAR, Ricardo (2006). Ambição americana não tem limites, diz negociador agrícola. Valor Econômico, 19 de julho.


(6) O acordo prevê que, todos os acordos comerciais de cada membro do Mercosul tem com Cuba passam a valer para os outros países do bloco. O acordo não vale para a Venezuela que ainda não tem direito a voto no Mercosul.


(7) OLIVEIRA, Eliane e FIGUEIREDO, Janaína. Acordo comercial aproxima Mercosul de Cuba. O Globo, 22 de julho.

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