Raposa Serra do Sol. Agora sai?

Após um longo e tumultuado processo parece que, enfim, a reserva indígena “Raposa Serra do Sol” se tornará uma realidade de fato e de direito. Essa é a clara manifestação da imensa maioria dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) que já pronunciara

A área já foi demarcada e homologada pelo governo federal, a quem compete constitucionalmente essa atribuição. Não quero discutir o direito histórico e constitucional dos índios sobre essas terras. Isso é tão patente que nem mesmo os “arrozeiros” questionam. Eles questionam a “quantidade” e a demarcação em “área contínua”, sob o argumento de que seria “terra demais para pouco índio” e que uma parte da reserva já é ocupada por não índios com atividade produtiva.


 


A quantidade de terra das reservas indígenas obedece a critérios antropológicos que obviamente não estão isentos de parcialidades. Assim como a “titularidade” dos imensos latifúndios de não índios nem sempre resistem a uma simples perícia.
No caso em questão tanto o Congresso Nacional quanto o STF constituíram comissões técnicas que visitaram a área, ouviram as partes, se aconselharam com especialistas e fizeram variadas audiências públicas. Apesar desse rigor não houve uma contestação formal do quantitativo de terras, levando a crer que não havia ou não foi possível demonstrar parcialidades e/ou até mesmo eventuais fraudes no processo demarcatório. O “argumento”, portanto, parece revelar muito mais um preconceito do que uma justa preocupação com uma eventual concentração de terras, na medida em que essa mesma “preocupação” não é demonstrada em relação aos imensos latifúndios de não índios. Tecnicamente falando uma área indígena é uma reserva de recursos naturais necessárias à manutenção e reprodução do grupo alcançado, daí a necessidade de uma grande área, mesmo que o grupo não seja mais nômade, como é o caso.


 


A contestação da “área contínua” se baseia no argumento de que os índios não são nômades, que já existem produtores de arroz usando parte dessas áreas e na ameaça de integridade territorial nacional por eventuais movimentos separatista animado por potências estrangeiras. É verdade que uma parcela dos próprios beneficiados se divide em relação à questão. Mas nada impede que as terras continuem produtivas sob o controle dos índios. O que predominou para a demarcação contínua foram, além dos aspectos históricos e antropológicos, razões de natureza administrativa e gerencial que minimizasse conflitos e não os potencializassem em decorrência de uma relação já bastante tensionada entre índios e não índios.


 


O risco de eventuais tentativas separatista existe, é real, corresponde à lógica do imperialismo para a região, mas não necessariamente por conta de terras indígenas. A cobiça do imperialismo não tem limites. O Iraque não tem terra indígena, mas tem petróleo. Lá o argumento era a necessidade de livrar o país de um “ditador”, aqui pode ser para evitar “massacre” contra os índios ou mesmo para assegurar a demarcação de suas terras.


 


Como se pode ver, esse risco não é menor sem a demarcação das áreas indígenas. Será até maior, na medida em que acentuará a radicalização e provocará alinhamentos automáticos dos índios com esses grupos estrangeiros, o que seria um erro tático grosseiro. A saída passa por mais presença do estado na política, na economia, na promoção sócio cultural e no respeito aos usos e costumes desses grupos. Ter consciência disso é nossa obrigação. Zelar pela integridade de nosso território e a plena soberania do mesmo é o nosso dever.

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