Saudades da Terra:
conflito, colonialismo e devastação na Amazônia [4]
Publicado 08/06/2010 20:30
O nome e a invenção do Brasil
A origem do nome “Brasil” deu margem a diversas hipóteses, antes de ser o país descoberto por Cabral batizou o Monte Brasil, no arquipélago dos Açores; donde passou ao Novo Mundo. O filólogo Adelino José da Silva Azevedo diz que se trata de palavra celta embora as origens mais remotas poderiam chegar aos fenícios, mercadores de um corante mineral vermelho extraído pelos celtas, povo minerador da Ibéria e Irlanda. Os gregos tomaram o lugar dos fenícios no comércio do produto que chamavam "kinnabar". Através do latim passou a "cinnabar" donde se chamou "cinábrio" em português e "cinabrio" em espanhol. Uma das características das línguas celtas é inverter as partículas, assim "kinnabar" passou a "barkino" e deu lugar a "barcino" aplicado a animais de pelo avermelhado, com variantes para designar a cor vermelha em diversas línguas tendo influência céltica.
Artesãos da Idade Média começaram a usar um corante vermelho extraído de madeira que, na Toscana, chamou-se "verzino", em Veneza "berziy" e em Génova "brazi". O nome logo foi usado para denominar também a madeira donde tal corante era extraído, conhecida na Espanha como "palo Brasil" ou "palo de Pernambuco", em Portugal "pau-brasil". Entre cronistas coloniais portugueses como João de Barros, Frei Vicente do Salvador ou Pêro de Magalhães Gandavo, há consenso sobre a origem do nome Brasil. Nos documentos só há uma versão, que é a do nome Brasil derivar do pau da tinta dito pau-brasil. Gandavo escreve que depois que o pau da tinta chegou a Portugal chamou-se de Brasil à colônia de Santa Cruz: "Chamaram de Brasil por ser vermelho e ter semelhança de brasa e daqui ficou esta terra com este nome de Brasil".
Na época os exploradores guardavam rigoroso segredo sobre lugares que achavam ou conquistavam, a fim de garantir privilégio de navegação e comércio. Assim se espalhou na Europa a notícia de que se havia achado certa "ilha do Brasil", no meio do oceano Atlântico, donde chegava o vermelho “brasil”. O gentílico "brasileiro" surgiu no século XVI, inicialmente apenas aos que faziam o mercado do pau-brasil. Só na primeira constituição brasileira, em 1824, "brasileiro" passou a designar oficialmente naturais do Brasil. Antes de "Brasil" as terras brasileiras descobertas em 1500 foram chamadas de Monte Pascoal, Terra dos Papagaios (designação popular), Ilha de Vera Cruz, Terra de Santa Cruz, Nova Lusitânia, Cabrália, etc. Os povos originais tupis chamavam ao país de Pindorama (terra das Palmeiras) e ao norte (Amazônia brasileira na atualidade) era chamado pelos mesmos de “Tapuya tetama” (terra dos Tapuias).
Do mesmo modo como na distância os navegadores viram, primeiramente, o “Monte Pascoal” antes de chegar à Ilha da Vera Cruz; também séculos antes eles viram primeiramente o “Monte Brasil” para depois achar as ilhas dos Açores… A “Ilha do Brazil” ou “Hy Brazil” era uma das ilhas míticas do Atlântico no ciclo de lendas de São Brandão, as Ilhas Afortunadas imaginadas ao extremo ocidente do velho mundo.
Cartografia do país do futuro.
José Saramago descreve como era sonho de qualquer Sancho Pança insone levantar cedo da cama para ir ao paço rogar licença de el-rei para navegar o Mar Oceano a fim descobrir uma ilha qualquer desconhecida, que nem um proletário desempregado anseia por acertar prêmio da loteria: saudade congênita de povos ribeirinhos… A cartografia medieval indica como a “Ilha do Brasil”, a Antília, a ilha de São Brandão, as Sete Cidades e as ilhas Afortunadas foram insistentemente procuradas na imensidão marítima. A ilha mítica do Brazil firma o topônimo muito antes de 1500 e invalida a teoria do pau-brasil. Não só a viagem secreta do cosmógrafo do rei (cartógrafo real) Duarte Pacheco Pereira (1498) ao Grão Pará para medições da linha de Tordesilhas (1494) e resguardo da costa do Brasil ainda encoberto; como a viagem de Vicente Pinzon (1500) ao Ceará já tinham acontecida antes do descobrimento de Pedro Álvares Cabral: na realidade o Brasil, como lugar mítico, já estava estabelecendo no vocabulário dos povos marítimos há séculos. E o país das Palmeiras é mais velho do que o jovem “país do Futuro”.
A busca da Ilha do Brazil foi uma fixação das navegações renascentistas do Atlântico. Desde muito antes de 1500, o Monte Brasil escalou na península em face da cidade de Angra, nos Açores. Depois se deslocou a sudoeste rumo ao mar das Caraíbas e depois foi ancorar no litoral do nosso Brasil de 500 anos. A palavra gaélica irlandesa é breazáil, ou simplesmente brazil, barcino ou bracino em castelhano; varzino ou brazino em português. Todos estes vocábulos têm significado geral de vermelho. Contudo é no gaélico irlandês onde permaneceu vivo o substrato celta. A palavra sobreviveu até ao século XVIII, como em O'Brasil dado a poema do irlandês Moore, sendo também referida pelo folclorista O'Flaherty. A origem da palavra gaélica O'Brazil é o celta Hy Breasil, que significa descendentes do vermelho, ou os do vermelho. Deste modo, o termo serviu de referência a fenícios e gregos que ao deixar o comércio de cinábrio com os celtas determinaram como o desaparecimento das ilhas míticas nas brumas do Mar Oceano. Em compensação, surgiu um povo afortunado e lendário que nunca mais voltou à Irlanda natal, para viver na paradisíaca “ilha do Brazil”, dentre o arquipélago imaginário da tradição de São Brandão.
Erupção do maravilhoso celta no além mar
Segundo Paulo Pereira, “Enciclopédia dos Lugares Mágicos de Portugal”, volume 8, Lisboa, 2006; a “ilha Brazil” transportada pelo imaginário celta decadente no continente europeu ressurge na cartografia náutica, desde o século XIII. Tem variantes do nome original e se localiza próximo a Irlanda donde vai para o meio do Oceano. Surgiu num velho mapa da Catalunha, de 1325 e 1330; no mapa de Dulcert de 1339, no dos irmãos Pizagani de 1375 e 1378; com o cartógrafo veneziano Andrea Bianco de 1436, citando o Mar dos Sargaços. A ilha ambicionada está no mapa veneziano Zuane Pizzigano e no de um anônimo de Weimar, ambos de 1424. Prova da fervura da demanda com que se achou o arquipélago dos Açores e as ilhas Antília, Satanazes, Saya e Ymana.
O historiador português Armando Cortesão formula a «hipotética eventualidade do conhecimento tardo-medieval dos Açores, do Atlântico Central, dos arquipélagos das Caraíbas ou Antilhas». Por aí também vai o descobrimento do continente americano pelos portugueses. As tais ilhas míticas do Atlântico aparecem na carta náutica do genovês Battista Beccario, onde as ilhas lendárias são claramente identificadas com os Açores reais, na expressão "ilhas nova ou recentemente descobertas". Também nas cartas de Bartolomeu Pareto (1455) e Gracioso Benincasa, de 1470 e 1482. Como «O'Brasil» é nome próprio irlandês; «Hy Bressail» ou «O Brazil» na acepção de «Ilha Afortunada»), «Brasil», «Bracil», «Bracir», são corruptelas da palavra original gaélica. Cartografia delirante de ilhas como a dos Demônios; Avalon, a lenda do rei arthur, ilha de são Brandão, Drogio, Emparedada, Estotiland e Grocelandia. A Ilha do Brazil foi procurada com esperança, inclusive pelo polêmico Cristóvão Colombo, comenta Paulo Pereira.
Os portugueses tirando da imaginação deram nome da “Ilha Brazil” à ilha península que se conhece nos Açores como Ilha Terceira, onde existe o Monte Brasil. Indaga aquele autor: «De resto, porque se chamaria àquela madeira pau-brasil, se a palabra brasil não tivesse um significado mítico, ligado com certeza às brasas, porque assim o admite a etimologia céltica e germânica de Renan”. Com apenas 2.400 km² de superfície o arquipélago dos Açores descobertos em 1427 por Diogo de Silves, piloto de el-rei de Portugal; foi o primeiro “Brasil” que encobriu o caminho marítimo para as Índias: primeiro passo para o Descobrimento. A Escola de Sagres servindo de capa às maquinações secretas de mercadores de Veneza e navegadores de Gênova. O golpe de Cristóvão Colombo apenas coloca Castela na corrida e eleva as tensões entre latinos e germânicos.
As explorações seguras dos portugueses começaram pela ilha da Madeira e Porto Santo para chegar à ilha de Santa Maria. Até o ano de 1439 foram descobertas 7 das 9 ilhas dos Açores: Santa Maria (127 km²), Terceira (406 km²), São Jorge (244 km²), Faial (172 km²), Pico (441 km²), São Miguel (760 km²) e Graciosa (62 km²). As outras, Flores (164 km²) e Corvo (16 km²), foram depois descobertas por Diogo de Teive, um escudeiro do Infante Dom Henrique, em 1452. A povoação das ilhas se fez a partir de 1439, por ordem do rei dom Afonso que encarregou seu tio, o Infante dom Henrique, a povoar as ilhas distantes para produção de trigo que escasseava no continente e já era raro na Madeira; a exploração comercial e apoio às frotas no seu regresso da África, Extremo Oriente e, mais tarde, do Brasil. Com escassez de população em Portugal, o povoamento das ilhas do atlântico foi imperativo para servir de base a futuras descobertas com aspiração máxima de chegar às Índias.