Sem comentários

Queria ver você, sem pressa, fazendo como quem se interessa por esses meus breves comentários.
Sem inveja, sem essa de achar que o responsável é você. Pensa aí se não seria maravilhoso você sem agir com esse ar de quem tudo sabe, antes mesmo de ler?

Sem complicação, sem enrolação, sem a alegria descartável pago à prestação. Sem vaga, sem avião.

Sem glória, sem bóia, sem nóia, sem futuro promissor. Sem dúvida estúpida, sem medo, sem vir numas de libertador.

Sem falcatrua, sem ditadura, sem amargura, sem dar, sem dor.

Sem estudo, sem profissão, sem vídeo-game, sem Faustão.

Sem luar, sem amar, sem saber, sem beber, sem seus panos, sem seus manos, sem seu cano, sem sono, sem fome, sem sorte, sem crença, sem treta, sem pensar que é penta, sem direito a relaxar, sem história, sem boné, sem Mané de quem você possa se aproveitar.

Com música, mas sem rap; com DJ, sem scratch; com muro, sem grafite; com b.boy, que esqueceu os passos no tecoflex.

“Quero ver você não chorar, não olhar pra trás nem se arrepender do que faz.”

Quero ver você sem cola, sem plágio, sem escola, sem estágio, sem falso testemunho, sem seu maravilhoso dom de mentir.

Sem oração, sem união, sem agitação, sem libertação, sem jurisdição, sem grade, sem parte, sem todo, sem eira nem beira, sem vergonha, sem a tal da solidão.

“Uma par de mano preso chora solidão,
Uma par de mano solto sem disposição ” (Racionais Mc’s)

Sem angústia, sem jóia, sem temor, sem carro, sem cheque especial, sem esse estilo de jogador.

Sem crédito, sem beleza, sem cicatriz que te faz tanto sofrer.

Sem envelhecer, sem certeza nem da morte, sem desordem, sem reação, sem ser notado, sem sentido, sem persuasão, sem ser convencido, sem se vender, sem desmerecer, sem os dólares na suíça, sem ter o que comer.

Sem larica, sem domingos, sem roupas, sem pudor, sem maquiagem, sem máscara, sem vaidade, sem rancor.

Sem atestado, sem diploma, sem medalha, sem troféu, sem o veneno, sem o antídoto e também sem o féu.

Sem esperança, sem disposição, sem preguiça. Queria ver você sem pose de artista, sem tv, sem geladeira, sem alimentos e sem fogão.

Sem ter onde viver, sem vida, sem pão, sem vinho, sem professor, sem destino, sem sensação, sem religião, sem livro, sem sexo, sem fumaça na cachola, sem as coisas que você acha que é remédio, mas na prática só piora.

Sem corrente, sem barba nem cabelo, sem espírito, sem espelho onde não possa conferir o quanto seu reflexo é feio e mesmo assim me faz sorrir.

Sem árvore, sem água, sem animal de estimação, sem ar, sem oxigênio, sem respirar, e então?

Sem odor, sem o terror, sem suas queridas revistas pornô, sem egoísmo, sem individualismo, sem anoitecer, sem visão.

Já pensou você sem poder ler nem escrever, sem alarme, sem senha, sem segredo, sem cochicho, sem filhos, sem desejo. Queria ver você com diarréia sem banheiro, sem ninguém em volta nem pra te ignorar.

Sem imprensa, sem lei, sem balada pra dançar.

Sem cobertor tremendo no frio, sem fogo, nem faísca, sem pavio.

Dizendo: Falta água, falta óleo, falta açúcar, falta sal, falta a borracha que apague estas palavras de minha mente, falta também hospital.

Sem devoção, sem caridade, sem raiva, sem susto, sem explicação. Sem imaginação, sem idéia, sem orientação, sem alienação, sem respostas prontas para todas as perguntas que nem foram perguntadas.

De repente sem pai nem mãe, sem dor de dente, no lugar do presidente tomando medidas consciente.

Sem a ignorância que você tem da realidade, da imensidão, sem divisas, sem nação.

Sem desculpas, sem dó nem piedade, sem festa de aniversário, sem seu discurso de cor, sem partido, sem graça, sem igualdade, sem direitos adquiridos, sem criatividade.

"Queria ver você três dias sem comer, sua barriga ia roncar.
Aí ia ser outro barulho que vai te incomodar.
Você morre de fome ou vai roubar?
Ia tirar sua bunda gorda do sofá,
sair junto com os caras pra também se manifestar." (Faces da Morte)

Sem mentiras quando você diz que quer mudar de verdade. Com orgulho emprestado. Sem discernimento nem para julgar se o que você está lendo seve pra algo ou se é melhor deixar pra lá.

Sem namorado, sem opção, sem olfato, sem tato, sem audição, sem café, nem arroz com feijão. Sem saber de fato onde está o teto e o que é o chão.

Sem time, sem esporte, sem fazer, sem saber até mesmo quem é o fulano que eu chamo de você.

Quero ver depois dessa você dizer que não te conheço bem, que não sei o que você pensa, ou não sei qual é que tem…

Sem pedir por favor, sem hemodiálise, sem coração, sem reação, sem novela, sem trela, sem classe, sem cozer.

Aí queria ver se você se reconheceria; seria o arremedo da caricatura de você!

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