Um imenso formigueiro chamado hip-hop

Sempre quando se fala em movimento hip-hop nos vem à cabeça de maneira geral as grandes figuras de expressão do movimento que ganharam destaque seja pela quantidade de CD’s vendidos, seja pelo número shows que fazem, pela quantidade de fãs que arrastam ou

Quero aqui contar minha admiração por um mano que faz o trabalho que mais aprendi a zelar dentro do movimento, aquele trabalho mano a mano, de incansável formiguinha, de exemplo de atitude própria.


 


Não se enganem vocês achando que tudo é satisfação neste tipo de trabalho. Pra ser sincero, e digo isto de maneira pessoal, tem horas que da vontade de se jogar enfiar a cabeça debaixo do travesseiro e deixar a canoa correr. Mas basta ver outra formiguinha trabalhando, carregando um peso até trezentas vezes o seu próprio que a gente se enche de esperança e se lança na luta com a mesma vontade de um principiante.


 


Sempre recebi cartas deste mano por e-mail narrando suas perspectivas, suas angústias e suas proezas e algumas delas me tiram ótimas gargalhadas, até porque irreverência é a marca registrada do Mano White Jay, o Psiquiatra da Rima.


 


Onde começa esta história? Acompanhe…


 


Em 2001 fui a Porto Alegre pela primeira vez e durante o II Fórum Social Mundial conheci um imenso formigueiro do movimento hip-hop no Rio Grande do Sul. No meio deste formigueiro percebi uma liderança que a partir da cidade de Viamão (região metropolitana de Porto Alegre) falava com uma pá de mano e mina. Fosse com um microfone no palco, numa rádio comunitária, com uma câmera na mão, rimando no ouvido dos outros ou gritando no meio da multidão lá estava o Psiquiatra da Rima soltando o verbo.


 


De todas as histórias vou contar uma que mostra bem que é a figura cidadão comum de sotaque gaudério e consciente acima de tudo.


 



Depois de tanto vê-lo com um cadarço e uma chupeta pendurada me atrevi a perguntar o que simbolizava aquele adereço diferente do que os manos costumam à adornar o pescoço.



Ele responde:
– Esta fita é pra lembrar que o mano aqui é pai de três baguris e a minha filha mais nova ainda não fica sem chupeta. E estes dias mano, ela não dormia porque a chupeta dela sumiu na baia. Dei mô banda pra achar algum mano que tinha guri novo pra me emprestar uma chupeta pra levar pra minha filha. Tem uns loco que usam colar com cifrão imitando ouro e prata pra querer ser o que não é, eu uso um cadarço com a chupeta da minha guria pra mostrar bem o que sou. Sou do hip-hop, sou mano e tenho minhas responsa lá na baia.


 


Esta semana ele me envia outra carta dizendo que esta desenvolvendo um projeto na cidade de Alvorada. Esta também fica na região metropolitana de PoA e tem um grande contigente do movimento hip-hop. Ressaltou que não deixa de estar atento às correrias em Viamão, mas é que em Alvorada a luta estava mais radicalizada e esta construindo a Nação Hip-Hop Brasil nesta cidade junto com outros guerreiros.


 


Disse também que seus esforços estão sendo requisitados em Porto Alegre e se for da vontade da rapa ele se encaminha de vez pra lá, mas que não peçam pra ficar restrito só a Porto, até porque pro hip-hop não têm fronteiras, disse ele.


 


Narrando a construção do projeto em Alvorada, White relatou que teve umas reuniões numas quebradas na cidade que tem alguns índices tristes como: maior índice de violência entre os jovens, um dos menores IDH do Estado e falta de saneamento.


 


Sobre isto ele falou que estava convencendo a alguns manos e minas a se debruçarem mais sobre os acontecimentos políticos e interferir diretamente na política da cidade não só de cima dos palcos, mas também ocupando espaços de decisões. Lembrou pra rapa que 2008 é ano eleitoral e os jovens da periferia precisam criar suas plataformas de reivindicações e pensarem em lançar candidatos do nosso próprio meio.


 


Na carta ele diz que insuflou a galera com algumas perguntas:
– Quem disse pra nós que o mano ou mina do hip-hop não pode virar um doutor na universidade? A quem interessa essa fronteira e cercas que colocam entre nós e os espaços de saber e decisão? Só se luta pela periferia com as ferramentas do hip-hop?


 


Despediu-se dizendo que participará dos cursos nacionais de formação teórica e política, pois foi através da elevação do nível de consciência pessoal e coletiva que o movimento hip-hop deixou de ser massa de manobra por parte de alguns, e que precisamos investir em mais formação principalmente entre o povo sofrido que é como ele se refere à periferia.


 


Falei do Mano White Jay o Psiquiatra da Rima, pois me espelho no trabalho deste guerreiro, mas lembro que como ele existem milhares de formiguinhas rompendo as fronteiras e derrubando as cercas que querem nos enclausurar.


 


O vírus libertário mais uma vez fortalecido reproduziu, somos todos portadores… Nação Hip Hop Brasil.

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