Um Sertão Negro

No dia 13 de Dezembro de 2007, nos organizamos aqui na cidade de Potengi, para acompanhar um importante momento da história deste município, por volta da 18:00 horas seguimos para a comunidade denominada Sítio Carcará, e lá tivemos a honra de participar d

Entre os que participaram da fundação da entidade estavam, o presidente da Federação das Associações, a Vereadora Ivete Guedes, Eu e Edson Representando a Nação Hip-Hop Brasil e a Zulu Nation, Bebé, representando a comunidade da Vila Campos.

No meio daquelas pessoas que ali estavam, eu tive uma certeza, de que aquele povo, queria acima de tudo um reconhecimento, pois por todos esses anos que habitam aquela região, conviveram com o atraso e a exclusão, os únicos benefícios que ali chegaram, foram a água encanada e a energia, não existe um calçamento, uma praça, uma creche, uma quadra esportiva, enfim, o desprezo e o desrespeito ao povo do carcará é visível, e quando tomamos a iniciativa de incentivar a criação da Associação, já foi encarado como uma vitória, pois sentimos a profunda insegurança, o medo, por muitos anos esse povo vem sendo massacrado, contam-nos histórias que a alguns anos atrás, ainda eram espancados, só pelo preconceito, o próprio administrador da cidade, mandava seus homens ir lá, e bater nos negros do Carcará, e sentimos na expressão daquelas pessoas, que nos receberam com confiança, acreditando que ninguém estava ali naquele dia para se beneficiar ou se exaltar, estávamos ali, porque acreditamos que nosso povo merece respeito.

Quando falei, citei Zumbi, Mandela, falei da Zulu Nation, do papel que o movimento hip-hop tem na reconstrução da consciência negra. Falei do 20 de Novembro, muitos por lá, nem tinham conhecimento de nada disso, é um povo que por força do preconceito ficou excluído, trancado em uma prisão que impediu o conhecimento de chegar até lá, o presidente da Federação colocou a importância da organização, a importância de uma associação, falou da questão dos recursos que estão sendo disponibilizados para comunidades negras. A vereadora Ivete colocou-se a disposição daquele povo. Edson falou da importância das lutas, que juntos podemos chegar muito além do que muitos imaginam, podemos construir um novo Carcará dos Negros, como é conhecida a comunidade, Bebé falou da importância que tem uma associação, e falou dos projetos culturais que desenvolve na Vila Campos, e já se dispôs a ir ao Carcará fazer oficinas de teatros com os jovens de lá. Representantes da comunidade agradeceram, falaram das dificuldades que enfrentam para trabalhar, estudar e até da grande dificuldade da relação social, pois aqui, ainda impera uma cultura atrasada, de preconceito e descriminação, onde nossos irmãos Afro-Descendentes ainda vivem às margens de tudo.

Mas tenho certeza, que a semente que foi plantada ali, foi a semente da liberdade, e lembro-me quando falei que esse povo chegou ao Brasil como escravos, vindos da Zâmbia, uma representante da comunidade falou; “E nunca deixamos de ser escravos, nos tiraram apenas as correntes”, em seguida uma senhora lembrou: “A casa do Inficado, onde nosso povo trabalhava e vivia amarrado ainda está em pé, e lá quem quiser ir pode ver as argolas que éramos amarrados”, entre muitas outras histórias que ouvimos.

Acredito, que a partir de 13 de Dezembro, renasce um Carcará mais forte, uma comunidade que o povo vai lutar pelos seus ideais, e com certeza vai mostrar para a comunidade racista que quem está no atraso é quem tentou e tenta atrasar o povo, e que naquelas veias corre sangue de Zumbi, Mandela, Osvaldão entre outros heróis que ergueram-se diante das injustiças…

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