Uma visão republicana dos incentivos fiscais

Na semana passada, no Rio Grande do Sul, foi retomado um intenso debate acerca do um ponto que historicamente foi tratado de forma sectária em nosso Estado, qual seja: os incentivos fiscais. Ainda bem que dessa vez, salvo raras exceções, o debate vem sendo feito de forma mais tranquila, ainda há um certo “ranço” sobre o tema. O motivo da retomada do debate foi gerado pelo fato de que a fabricante de calçados Azaleia, grupo Grendene, anunciou na segunda-feira o fechamento de sua fábrica no município gaúcho de Parobé, causando uma demissão de 840 trabalhadores, além de outras demissões, como em 2005, quando 2,5 mil trabalhadores foram demitidos em São Sebastião do Caí, e em 2008, com outros 800 empregos extintos em Portão. Em decorrência desse fato o Governador Tarso Genro iniciou um debate acerca da revisão da política de incentivos fiscais no Estado.

No caso específico da Azaleia, o que está em debate é a postura da empresa de vários anos recebendo grandes valores dos cofres públicos do governo riograndense – há um cálculo de que a empresa tenha sido beneficiada com valores que variam de R$ 40 milhões do Fundopem entre os anos 1994/1998 – a empresa fechou uma de suas filiais sem dar a mínima explicação para o Governo Gaúcho. Para além da postura desrespeitosa da Azaleia para com o Estado do Rio Grande do Sul, há que se buscar uma visão mais ampla no que se refere aos incentivos fiscais. Digo isso, por que ainda existe pessoas que tentam fazer combate político com essa questão. A ex-deputada Luciana Genro (PSOL/RS) escreveu um artigo com o título “Devolvam nosso Dinheiro!”. Não há ilegalidade na concessão de benefícios fiscais, o que há é a falta de transparência e regulamentação mais protetiva aos interesses do Estado. Há que se criar mecanismos que responsabilizem as empresas beneficiárias de incentivos, estabelecendo prazos para sua permanência no Estado ou que obrigue ao ressarcimento de valores recebidos se a empresa sair antes do prazo acordado.

Para além da estreiteza que alguns setores oportunistas se utilizam do tema, há que se buscar um debate mais profundo com acerca do tema. A Associação de Magistrados do Rio Grande do Sul (AJURIS), nos dá um excelente exemplo de como tratar desse tema. A AJURIS está organizando um movimento pela transparência dessas concessões. A entidade alerta que há uma previsão de cerca de R$ 20 bilhões para o orçamento estadual em 2011 e que as renúncias fiscais, apenas de ICMS (imposto sobre circulação de mercadorias), chegam a mais da metade deste valor. Estes recursos deixam de entrar para os cofres do Estado e acabam fazendo falta para melhorar o serviço prestado pela Justiça gaúcha.

Esse debate deve ter por norte o papel do Estado no desenvolvimento econômico e social e, principalmente, a relação com a “rés” (coisa”) pública. Essa deve ser a questão de fundo , os incentivos têm origem nos recursos públicos, dessa forma há que se ter uma relação republicana com os recursos públicos. Só para se entender a importância da matéria, basta observar o papel do PROUNI e do Fundo dos direitos da criança e adolescente, na busca do desenvolvimento e ampliação de setores importantes para a sociedade. O Estado deve ter papel indutor, entretanto essa indução deve ser feita de forma transparente e republicana, não podemos ter relações obscuras com os recursos da sociedade.

Na atual conjuntura abre-se uma grande oportunidade de desenvolvimento para o Brasil, seja por questões nacionais ou internacionais, entretanto para que possamos dar um salto qualitativo importante precisamos superar os entraves que não permitem o desenvolvimento do País. Destarte, há que se enfrentar os problemas sem sectarismos ou simplismos, há que se entender o papel do Estado como indutor do desenvolvimento. Por fim, devemos ter claro que para combater as desigualdades sociais e regionais, precisamos estar pautados por uma visão republicana acerca dos incentivos fiscais e sobre o papel do Estado no desenvolvimento econômico e social, sempre pautados por um profundo respeito pelo interesse público.

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