Uma visão sobre o currículo na educação

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É na escola que o professor e o estudante tornam claras as suas visões perante o mundo, posicionando-se frente ao currículo a partir da bagagem construída culturalmente e socialmente no seio da família e dos que com eles convivem em sociedade. O currículo se apresenta como a mola-mestra do processo da construção do projeto pedagógico em si, dando forma ao aprendizado como processo.

Para começar a conversar parto do entendimento que o currículo para a educação precisa articular os conhecimentos e as práticas de ensino-aprendizagem, isso se dá sempre em um contexto circunscrito e determinado historicamente, na ideia de ser necessário buscar a garantia aos estudantes do direito a ter acesso aos conhecimentos e também a cultura, ambos produzidos no contexto social.

Me parece que a elaboração do currículo na educação se constitui em um processo de tipo social, abarcando componentes intelectuais, epistemológicos e lógicos que se somam as relações sociais de poder inseridas em um determinado tipo de sociedade, no nosso caso uma sociedade capitalista, com suas nuances de disputa de classe, etnia, gênero, raça, cultura, entre outros. Aqui há sempre posicionamentos que expressam valores em si, não nos causa estranheza de forma alguma, por compreendermos que a pedagogia tem como bases fundamentos sócio-filosóficos.

O currículo precisa ser construído na escola levando em conta essas contradições postas no ambiente da sociedade, buscando envolver e articular ao máximo as famílias, funcionários, estudantes e professores para que esse reflita o conjunto dos que utilizam e vivem a escola como espaço de vivência e de aprendizado. Isso precisa ser feito tendo como parâmetro as leis e normatizações sobre a temática da Educação postas e funcionais no Brasil no momento de sua construção. 

Tal currículo necessita articular competência e conteúdo, para fazê-lo pode buscar o estabelecimento de um currículo de tipo reconstrucionista social, para McNeil (2001) o reconstrucionismo social concebe homem e mundo de forma interativa. A sociedade injusta e alienada pode ser transformada à medida que o homem inserido em um contexto, social, econômico, cultural, político e histórico adquire, por meio da reflexão, consciência crítica para assumir-se sujeito de seu próprio destino.

Entendo isso na perspectiva de um currículo que contemple a transformação social e a formação de tipo crítico do sujeito, o afirmamos por não podermos entender a educação de outra forma que não a de ser um agente social promotor de mudanças, algo presente também na obra de Freire (2013).

É justamente nesse diapasão que a busca de um currículo que minimize as desigualdades e valorize as diferenças se insere: na compreensão das relações de poder e de classes em que o mesmo se edifica e que com essas precisa dialogar e reconhecer para poder cumprir plenamente os objetivos a que se propõe.

Jesus (2019) apresenta uma linha de argumentação a qual me associo para melhor compreender esse debate da função social do currículo: 

Sob o norte de emancipação do indivíduo, o currículo deve confrontar e desafiar o educando frente aos temas sociais e situações-problema vividos pela comunidade. Por conseguinte, não prioriza somente os objetivos e conteúdos universais, sua preocupação não reside na informação e sim na formação de sujeitos históricos, cujo conhecimento é produzido pela articulação da reflexão e prática no processo de apreensão da realidade. (p. 2644)

Essa perspectiva que entende e enfrenta a necessidade de buscar a emancipação do indivíduo em si e por si próprio é o que permite formar o cidadão pleno, que busque compreender e enfrentar os temas candentes presentes na sociedade de classes em que estamos inseridos, mais uma vez remontamos a Freire (2013) que compreendia o homem como um ser que não era liberto pelo outro, mas por si só, mediado pela educação e pelo ato de educar.

A transformação do currículo desejado em currículo efetivamente real é uma necessidade permanente para cada escola e para os que nela atuam, seja estudando ou educando, bem como a comunidade em que nela está situada, para que naquele contexto se busque interpretar e ter o currículo como uma ferramenta pulsante, viva, efetiva e que reflita o que se constrói, vive, forma e educa na educação e na escola.

Isso é possível. Quanto mais democrático e mais participativo a gestão de uma escola e a maneira que tratam a articulação do ensino com a comunidade e com as nuances sociais ela acabará, por consequência, sendo mais viva, plural e representativa do contexto em que se insere.

Referências

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2013.

JESUS, A. Ampliação da Obrigatoriedade Escolar no Brasil: o que aconteceu com o Ensino Médio? Ensaio: aval. pol. públ. Educ., v.28, n.107, abr./jun. 2019. Disponível em: http://lagarto.ufs.br/uploads/content_attach/path/11339/curriculo_e_educacao_0.pdf.Acesso em: 25/11/2020.

MCNEIL, J. O currículo reconstrucionista social. Campinas: Papirus, 2001.

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