Vendo o Senado – a pauta de 2008
Na abertura dos trabalhos do Congresso, dia 6, uma Quarta-Feira de Cinzas, o senador Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN) confessou que o trabalho da Casa “está muito aquém do momento vivido pela nacionalidade brasileira” e propôs uma reflexão sobre o papel qu
Publicado 08/02/2008 11:13
A segunda sessão legislativa ordinária da 53ª legislatura foi inaugurada com pompa e circunstância. A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Ellen Gracie, leu a mensagem de praxe do Judiciário. Já a mensagem do presidente do Executivo, Lula, aos senadores e deputados de ambos os sexos foi lida pelo 1º secretário do Congresso, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR). O presidente da República prometeu “atenção redobrada” em 2008 para as áreas de segurança pública, educação e saúde, comemorou o “momento excepcional” da economia brasileira e listou o que considerou serem as principais realizações do seu governo. A ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, representou o chefe do Executivo na sessão.
Definição de prioridades dia 12
O Senado retoma suas atividades com a pauta de votações desobstruída e poderá decidir quais matérias terão prioridade nas primeiras votações do ano. De imediato, 225 proposições estão prontas para receber voto em Plenário. No dia 12 os líderes partidários devem definir quais as matérias prioritárias. Entre as 225 proposições, há 38 propostas de emenda à Constituição (PECs), 80 projetos de lei do Senado (PLS), 49 projetos de lei da Câmara (PLCs), 12 projetos de decreto legislativo (PDS), dez projetos de resolução do Senado (PRS), além de outras matérias, como requerimentos e pareceres.
Dentre as proposições estão o fim da reeleição para chefes do Poder Executivo, o fim do voto secreto nas votações do Senado e da Câmara para cassações de mandato parlamentar, a extinção do instituto da medida provisória. Também podem ser deliberados a redução da maioridade penal, o estabelecimento do ensino fundamental em tempo integral,a indenização para os passageiros em caso de atraso nos vôos, dentre outros assuntos.
CPIs dos cartões e das ONGs
Neste início de ano, as maiores polêmicas talvez fiquem centradas na CPI sobre o uso dos cartões corporativos. O senador Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo, protocolou na própria quarta-feira o requerimento para instalação da CPI destinada a investigar gastos com cartões corporativos e adiantamentos a funcionários do governo (contas do tipo B). Disse que o governo não pretende neutralizar a CPI da oposição, mas quer investigar os gastos com cartões (consumo e saques em dinheiro) e os adiantamentos para posterior prestação de contas durante os últimos dez anos, o que alcança o governo Fernando Henrique Cardoso. “O governo não tem medo de investigar e o próprio presidente Lula autorizou o requerimento”, informou. Segundo a Controladoria Geral da União (CGU), os gastos do governo FHC com suprimento de fundos (que envolvem os cartões corporativos) foram de R$ 213,6 milhões, em 2001, e de R$ 233,2 milhões, em 2002. No governo Lula, eles foram reduzidos e mantêm, nos últimos cinco anos, a média anual de R$ 143,5 milhões, mas foram denunciadas irregularidades no seu uso.
A oposição reagiu. “Estão querendo fabricar uma enorme pizza. Toda CPI que quer abarcar o mundo com as pernas não chega a lugar nenhum”, disse Alvaro Dias (PSDB-PR). Mas confessou ter assinado o requerimento “por coerência”. Mais enfático, o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), distribuiu nota classificando a iniciativa do governo de “farsa”. Propôs que a oposição se reúna dia 11 “para unificar as ações e combater e denunciar qualquer tentativa de fraudar as apurações”.
O presidente Garibaldi deverá colocar em discussão na reunião de líderes do dia 12 o pedido da CPI. Ele devolveu o requerimento ao seu autor, Jucá. porque foram acrescentados trechos escritos manualmente ao texto original. Agora, Jucá colherá novamente as assinaturas dos 31 senadores que apoiaram o documento original a partir da próxima segunda-feira.
Garibaldi considera “no mínimo pouco racional” que haja duas comissões parlamentares de inquérito no Congresso para investigar o uso dos cartões corporativos, em referência à tentativa dos parlamentares de oposição de criação de uma CPI mista para tratar do tema, a partir de articulações da Câmara dos Deputados.
Na rasteira das denúncias, o diretor-geral do Senado, Agaciel Maia, anunciou que, em três semanas, a Casa começará a divulgar, em sua página na Internet, os gastos dos senadores com a verba indenizatória de R$ 15 mil mensais a que cada um tem direito para despesas com hospedagem, aluguéis, combustível, divulgação e consultoria. A verba indenizatória existe desde 30 de janeiro de 2003, para ser utilizada no pagamento de despesas relacionadas ao exercício da atividade parlamentar.
Bate-barba Heráclito e Suplicy
Mas a CPI já originou asperezas em plenário. No dia 7, um dos principais opositores do governo Lula, o senador Heráclito Fortes (DEM-PI) criticava a antecipação do governo na instalação da CPI quando disse ao Eduardo Suplicy (PT-SP) que ele não ficasse “constrangido” com os atos do Executivo e provocou: “O senhor, que defendeu os boxeadores cubanos, agora está numa postura de agachamento aos atos do governo”. (Durante os Jogos Pan-americanos do Rio de Janeiro, no ano passado, dois boxeadores cubanos abandonaram a delegação de seu país para tentar asilo no Brasil).
Irritado, Suplicy pediu respeito, aos gritos: “Absolutamente. Não estou agachado. Assinei o requerimento e convidei V. Exª a assiná-lo. V. Exª o assinou. Não há um gesto de agachamento da parte de quem quer que seja. Não use uma palavra inadequada, porque fico bravo aqui. Fico bravo se V. Exª usar de palavra inadequada. V. Exª, que tem tido uma relação de respeito para comigo, não use de palavra inadequada!”
Heráclito: “Deixe para obstruir na CPI e deixe-me terminar o meu discurso, por favor.”
O presidente Garibaldi teve que intervir: “Senador Eduardo Suplicy, se V. Exª insistir em pedir um aparte não autorizado pelo orador, vou desligar o seu microfone”.
Pela turma do deixa-disso, Raupp pediu a palavra, mas sem sair do tema: “Eu vejo que esta é mais uma CPI movida por questões políticas. O governo passado abafou praticamente 100% das CPIs”.
Mais tarde, serenado, Suplicy se referiu, na tribuna ao senador Heráclito Fortes, “que, por vezes, gosta de me provocar, mas, em outras ocasiões, me trata com grande respeito”.
Suplência em discussão
Até 12 de maio, o Senado deverá também encerrar as atividades da CPI composta de 11 titulares e sete suplentes que apuram a liberação, pelo Governo Federal, de recursos públicos para organizações não governamentais – ONGs – e para organizações da sociedade civil de interesse público – OSCIPs –, bem como a utilização, por essas entidades, desses recursos e de outros por elas recebidos do exterior, a partir do ano de 1999 até a data de 8 de novembro de 2007.
Possíveis mudanças nas normas para eleição de suplentes no Senado voltam também ao debate, desta vez ancoradas nas denúncias envolvendo Edson Lobão Filho (sem partido, ex- DEM), que substitui o pai que deixou a Casa para ser ministro das Minas e Energia. O corregedor do Senado, Romeu Tuma (PTB-SP), abriu procedimento de investigação sobre o novo senador. A apuração vai basear-se nas diversas reportagens publicadas na imprensa e na investigação que vem sendo feita pela Receita Federal e pela Polícia Federal.
Outros assuntos, como a entrada da Venezuela no Mercosul e reforma política também devem pontuar a ação legislativa de 2008. Além da continuidade dos trabalhos das comissões permanentes em funcionamento, como a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) que realizará dia 14 audiência pública para discutir a transposição de águas do rio São Francisco. Já o presidente da Comissão Mista de Orçamento (que envolve Câmara e Senado), senador José Maranhão (PMDB-PB), pretende divulgar dia 12 os cortes para adequar a proposta ao fim da CPMF.
Espera-se um trabalho mais intenso no primeiro semestre, já que no segundo ocorrerão eleições, fazendo com que os parlamentares se desloquem para seus estados de origem – seja como candidatos, seja apoiando os postulantes aos cargos. No ano passado, em especial em função da sanha oposicionista de tirar da presidência da Casa o alagoano Renan Calheiros (PMDB), o Senado contou com algumas sessões ardentes. Neste ano talvez elas não atraiam a mesma atenção de 2007, mas deverão ocorrer também reuniões animadas – e policiadas pela imprensa.