A grande liquidação do BNDES

Em seu discurso de Ano Novo no dia 31 de dezembro de 1951, Getúlio Vargas falou longamente sobre a herança que recebera do seu antecessor, general Eurico Gaspar Dutra. Enquanto citava números e fatos, denunciou a evasão de divisas, o saque aos recursos do país e o abandono da infraestrutura, uma das principais bases da Revolução de 1930.

No mesmo discurso, Vargas anunciou a criação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (mais tarde, com o acréscimo do “Social”, BNDES) e da Petrobras, no âmbito do Plano Nacional de Reaparelhamento Econômico do Estado. Essas duas instituições foram essenciais para mais um salto da industrialização e da modernização do país. Por ter esse papel, sempre foram alvos de políticas entreguistas.

No governo Bolsonaro, o banco e a empresa voltam a ser ameaçados pela política econômica antinacional. Segundo um documento protocolado na Securities and Exchange Comission (Comissão de Títulos e Câmbio dos Estados Unidos), necessário para realizar ofertas de vendas registradas nos Estados Unidos, o BNDES poderá vender suas ações da Petrobras por meio de bancos. O valor pode levantar até R$ 23 bilhões.

O banco também já vendeu a totalidade das ações que detinha na Light, está prestes a liquidar a participação da União na Dataprev e está sendo autorizado a “contratar estudos” para privatizar os Correios. O BNDES e outros bancos públicos, segundo o governo, terminarão 2020 com vendas superiores a R$ 60 bilhões. Em 2019, BNDES, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil venderam R$ 36,5 bilhões em ativos.

Essa dinheirama toda está sendo entregue ao caixa central do governo e servirá para alimentar a boca voraz da dívida pública, sem garantia de que com esses recursos, somados a outro vultoso montante tirado do orçamento, haverá redução do saldo devedor – como estão apregoando os prosélitos do rentismo. É dinheiro que, de uma forma ou de outra, serviria para financiar o desenvolvimento econômico e social do país.

Essas mamatas foram precedidas de uma caluniosa campanha contra o BNDES, a dita “caixa preta” tantas vezes repetidas por Bolsonaro. O relatório da consultoria contratada para revelar os “segredos” conhecidos apenas por ele constatou, a um custo de R$ 48 milhões de dinheiro público, que a acusação não passava de fantasia. Mas serviu ao propósito da guerra suja contra a esquerda e à campanha a favor das privatizações.

Como afirmou em nota o presidente da Associação dos Funcionários do BNDES (AFBNDES), Arthur Koblitz, o relatório da consultoria externa não é um fato isolado. “Suas conclusões são convergentes com os fatos apurados em CPIs sobre o BNDES, em comissões de apuração interna e, muito importante, no primeiro posicionamento da Justiça sobre denúncia do Ministério Público contra empregados do BNDES”, revela.

Com esses dados, constata-se facilmente que a liquidação do patrimônio público brasileiro é uma explícita operação de transferência de riquezas do povo para o circuito das oligarquias financeiras. Além do prejuízo econômico, ela tira do Estado instrumentos essenciais para o desenvolvimento do país, comprometendo seriamente o futuro da imensa maioria do povo.