Bolsonaro e o genocídio de 300 mil brasileiros

Ilustração: Laerte

A pandemia do novo coronavírus – que avança sob a guarida do bolsonarismo – acaba de alcançar uma nova e deplorável marca no Brasil. De acordo com o consórcio de imprensa que compila e atualiza diariamente as estatísticas da doença, o país ultrapassou, nesta quarta-feira (24), o patamar de 300 mil mortos por Covid-19.

Deve-se frisar que esse dado, já extremamente alarmante, não dá conta de toda a extensão da tragédia. É notória a subnotificação de casos e óbitos, a ponto de especialistas – como os pesquisadores do Observatório Covid-19 – cogitarem que mais de 415 mil brasileiros podem já ter morrido em decorrência direta da pandemia.

Se por um lado há divergências quanto ao número efetivo de vítimas da pandemia no Brasil, em contrapartida é cada vez mais consensual que o presidente Jair Bolsonaro é o principal responsável pelo genocídio em curso. Sua incompetência está por trás de vários fracassos acumulados nos quase dois anos e três meses de seu governo. Mas o que prevalece na crise sanitária não é o despreparo mas, sim, o descaso atroz, a mentira contumaz, a criminosa negligência.

Na terça-feira (23), dia em que o Brasil totalizou 12 milhões de casos confirmados, Bolsonaro ousou fazer um pronunciamento de quatro minutos em cadeia nacional de rádio e TV para manipular números e informações sobre o combate à pandemia. “Em nenhum momento, o governo deixou de tomar medidas importantes tanto para combater o coronavírus como para combater o caos na economia”, fantasiou o presidente. “Somos incansáveis na luta contra o coronavírus”, emendou, em outro engodo.

Apesar da brevidade da fala, diversos veículos e agências de checagem de notícias apontaram uma série de erros, distorções, contradições e mentiras – só a Folha de São Paulo viu “11 diferenças entre a realidade da pandemia e pronunciamento”. Tamanho cinismo foi repudiado de imediato, com panelaços populares em todo o País – o que se repetirá, em dimensões ainda maiores, a cada novo pronunciamento. É o reflexo do crescente percentual de brasileiros que veem como ruim ou péssima a forma como Bolsonaro enfrenta a crise da Covid, elevando, por tabela, a rejeição ao próprio governo genocida.

Diferentemente de outros líderes mundiais preocupados com a vida e o destino da população de seus países, Bolsonaro sabotou todos os esforços que podiam mitigar os efeitos da pandemia e acelerar seu controle. Desqualificou permanentemente a gravidade da doença e os métodos preventivos. Fez lobby para medicamentos e tratamentos sem comprovação científica. Promoveu o negacionismo por meios da mídia oficial, de suas redes sociais e de vergonhosas ações na Justiça, como a que tentava reverter medidas restritivas em três estados.

Sob o falso dilema de ter de escolher entre a vida das pessoas e a economia do País, o presidente eleito com 57 milhões de votos deixou uma e outra à deriva, traiu o juramento presidencial e condenou a população a um cotidiano de barbáries. Não bastassem as 300 mil perdas humanas – que põe o Brasil na condição de novo epicentro da pandemia –, a economia sofreu a pior recessão da série histórica e caiu três posições no ranking mundial dos maiores PIBs.

A parceira Bolsonaro e pandemia, fez a nação brasileira regredir. As mais básicas noções e práticas civilizatórias foram afrontadas. O desprezo à aflição do povo, notadamente das famílias mais pobres, desnudou a faceta desumana do governo. Mesmo com o desemprego recorde e a inflação dos alimentos e do gás de cozinha, o auxílio emergencial foi suspenso e desfigurado. Começam a faltar insumos e leitos de UTI (Unidades de Terapia Intensiva) para Covid na maioria dos estados. Tampouco há vacinas para todos – tudo indica que a imunização deve se estender até 2022.

As 300 mil mortes por Covid-19 simbolizam esse estado deprimente de coisas e reforçam o isolamento de Bolsonaro. Ainda que mantenha o apoio de cerca de 30% do eleitorado – a crer nas últimas pesquisas –, o bolsonarismo é confrontado por governadores, prefeitos e parlamentares, setores do judiciário e da grande mídia, acadêmicos e especialistas, instituições de referência e entidades dos movimentos social, sindical e estudantil. A todos eles se somam, agora, economistas e até banqueiros, cientes de que nem mesmo o mercado tem algo a ganhar com um governo tão vil e irresponsável.

É preciso deter a pandemia e o bolsonarismo, antes que o número de vítimas da Covid-19 e do desgoverno dobre ou triplique. As vozes em defesa da vacina já para todos e do auxílio emergencial de R$ 600 falam cada vez mais alto, têm ressonância e ecoam Brasil afora. Não há perspectivas de avanços concretos com a permanência do presidente no poder. Fora, Bolsonaro!