Condoleezza vem aí; e daí?

A secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, estará nesta quinta-feira em Brasília, e na sexta em Salvador da Bahia, seguindo depois para Santiago do Chile. A pauta do encontro às 11 horas com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o chanceler Celso Amorim, do tipo ''sem restrições'', deve incluir a recente crise provocada pela incursão militar da Colômbia em território do Equador.



O que os brasileiros têm com isso?



Condoleezza, a braço direito de George W. Bush, representa o único (!) governo das Américas que apoiou (!!) a invasão perpetrada pelas tropas do presidente fascistóide da Colômbia, Álvaro Uribe. Assim como encarna as Guerras do Iraque e do Afeganistão, as torturas em Abu Graib e Guantânamo, ou a continuidade do martírio palestino.



E daí?



Com essa ficha, Condoleezza por onde passa desperta reações indignadas e massivas. Os povos, mesmo sem acesso ao que a dama de ferro da diplomacia americana conversa, sabem que boa coisa  não é. Sobre a violação da soberania equatoriana pelo exército da Colômbia, o comentário de Condoleezza foi que as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, o pretexto da invasão) ''são uma organização terrorista'' e ''ninguém devia ter relações com ela''.



A visita seria uma boa oportunidade para as forças avançadas e solidárias do Brasil agirem no sentido de engrossar também esse caudal protestos. A busca de um projeto de desenvolvimento soberano para o país não terá êxito se ficar de costas para o seu entorno internacional, principalmente quando se trata dos vizinhos sul-americanos, ou das pretensões do Império do Norte, e mais ainda quando o tema está na intersecção de ambos.



Desgraçadamente, esta ainda é uma consciência que engatinha. Talvez seja porque o Brasil é grande e a maioria dos brasileiros moram a milhares de quilômetros da fronteira mais próxima. O fato é que este tem sido um ponto fraco da ação progressista no país. As convicções antiimperialistas são vivas e profundas, mas parecem cochilar quando o tema está para lá da fronteira.



E no entanto, a visita de Condoleezza e o projeto estratégico que ela encarna têm tudo a ver com os rumos do Brasil amanhã e depois. A integração continental é parte inseparável do projeto de um Brasil avançado. E o governo Uribe mostrou pela enésima vez, na primeira madrugada deste mês, que é uma quinta-coluna – como se dizia na Guerra Civil Espanhola – a trabalhar contra ela.



Não vem ao caso que Uribe tenha se isolado no episódio e terminou obrigado a recuar, pedindo desculpas duas vezes ao Equador. Nem que Bush seja hoje um ''pato manco'' em fim de mandato, e ao que tudo indica Condoleezza esteja às vésperas de voltar para sua faculdade no Mississipi. A intromissão dos EUA nos assuntos latino-americanos não vem de hoje, e está longe do fim. O ''Plano Colômbia'', que apetrechou o exército daquele país com as armas,  as costas quentes e os recursos tecnológicos usados na incursão do dia 1º, foi concebido na última passagem dos democratas pela Casa Branca. Questões estratégicas reclamam que se pense estrategicamente. E isso implica em pisar no acelerador da solidariedade internacional e muito especialmente da latino-americana.