G-20: EUA resistem a dividir o poder no mundo

O encontro de ministros de Finanças e presidentes de bancos centrais do G-20, ocorrido neste final de semana em São Paulo, parece desenhar mais um cenário para a queda de braços que tem marcado encontros internacionais nos últimos tempos, colocando em lados opostos o grupo dos países industrializados (e o principal deles, os EUA), a União Européia e os países emergentes.


 


O Grupo dos 20 (G-20) é formado pelo Grupo dos Oito G8 (Estados Unidos, Canadá, Japão, Alemanha, Reino Unido, Itália, França e Rússia), os países emergentes (Brasil, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, China, Coréia do Sul, Índia, Indonésia, México, África do Sul e Turquia) e a União Européia. É a junção das principais potências econômicas do planeta, e a reunião de São Paulo tem o objetivo de preparar a que vai acontecer em Washington, no dia 15, convocada pelo pato manco George W. Bush, o derrotado presidente dos EUA.


 


O que está em disputa é nada mais nada menos do que uma espécie de governança mundial, que o encontro do dia 15 espera definir, na grave situação de crise econômica que os países ricos vivem hoje e, a partir do epicentro nos EUA, espalha pelo mundo como uma gangrena. A governança atual, estropiada tanto pela crise quanto pela resistência dos povos, corresponde ao domínio do imperialismo dos EUA e das instituições por ele controladas – FMI, Banco Mundial, OMC etc. A mudança acenada por Bush e seus aliados prevê alterações pequenas e superficiais, para manter tudo como está. 


 


O presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva deixou clara, na abertura do encontro, a necessidade da construção de uma nova arquitetura do poder mundial que inclua, em suas esferas decisórias, não só os ricos que até agora vem mandando no mundo, mas também os emergentes, entre os quais o Brasil. ''Cada país deve assumir suas responsabilidades'', disse, reconhecendo que nenhum ''está a salvo da crise financeira''. A crise pode ser vista como uma virada de página, sugere Lula. O sistema financeiro global ''ruiu como um castelo de cartas'', e precisa ser reconstruido, abrindo espaço para uma participação mais ativa dos emergentes nas decisões que afetam a todos. Ao criticar a ''fé dogmática na não-intervenção'' nos mercados apregoada pelos EUA e demais países ricos, Lula avaliou que os ricos não vão, sozinhos, ''resolver os problemas do mundo''.


 


O grupo dos emergentes, no qual Brasil tem um papel de destaque, deixa claro que não aceitará sozinho os ônus da crise, como sempre ocorreu no passado, quando os ricos resolviam seus problemas econômicos e financeiros à custa dos demais países. Este é o centro da queda de braços que se arma em São Paulo e vai repercutir em Washington. A polêmica se dá entre uma maior regulamentação do sistema financeiro mundial e criação de uma nova entidade mundial para regular as atividades financeiras globais, defendida pelo Brasil e pelos emergentes, ou a mera reforma do FMI e a manutenção das atuais regulações nacionais, como defende Bush. A disputa tem um sentido claro, mesmo na crise financeira e às vésperas do fim da troca de comando em Washington: os estadunidenses não aceitam dividir o poder que, tudo indica, já não tem sobre o mundo, como tinham antes.


 


A crise financeira tem a virtude de deixar claro que o mundo não pode continuar como está, principalmente com o agravamento da distância entre os países ricos e os demais e o aprofundamento da pretensão dos EUA ao domínio unilateral, acentuados nas últimas décadas. Contudo, é difícil acreditar que possa sair de reuniões como estas, do G-20, uma nova arquitetura que corresponda aos anseios dos povos, em negociações que envolvem interesses tão díspares como os das nações ricas, em oposição aos das nações emergentes. As soluções possíveis, nestas negociações, apontam na melhor das hipóteses para a volta de alguma dose de regulamentação sobre o capital, para salvar o sistema mundial onde ele domina. Elas não eliminam a luta, necessária, dos povos por uma nova ordem mundial de caráter antiimperialista, que aponte para a conquista e construção de uma sociedade nova, a socialista – esta sim portadora de promessas grandiosas de paz e progresso para os povos.