O Equador e o novo consenso na Terra do Jaguar

O triunfo do progressista Rafael Correa no segundo turno para presidente do Equador confirma e impulsiona uma  tendência latino-americana, com epicentro na América do Sul: a Terra do Jaguar já não tolera o jugo neoliberal do Consenso de Wahington. Um novo consenso oposto ao de Washington vai se construindo.


 


O multimilionário Álvaro Noboa, essa caricatura de oligarca pró-americano, que representou a direita no segundo turno, não admite a derrota. Wall Street tem faniquitos. A mídia dominante latino-americana, mais uma vez, engole a derrota do seu candidato e redireciona sua artilharia, agora contra a principal proposta política de Correa — uma Assembléia Constinuinte que arrebate o poder da “partidocracia” conservadora e o entregue povo. Os escribas de aluguel quebram a cabeça em busca de novas teses para desqualificar o fenômeno. Inútil: o segundo turno equatoriano, como o brasileiro quatro semanas antes, não deixa lugar a dúvidas.


 


Com o resultado no Equador, após o crucial resultado no Brasil e a volta por cima do sandinismo na Nicarágua, fecha-se o quadro das eleições de 2006 no continente (falta ainda a Venezuela, mas até os mais céticos dão como certa a reeleição de Hugo Chávez). A onda mudancista cobre agora toda a América do Sul exceto a Colômbia de Álvaro Uribe. E mesmo este enfrenta, ao lado da guerrilha, uma oposição de esquerda sem precendentes no país.


 


É uma onda desigual e plural, mas convergente. Em vão os ideólogos da direita enchem páginas cogitando sobre o lugar de Chávez, Lula, Evo Morales ou Fidel Castro no ranking dos seus líderes. Dez vezes mais importante é o denominador comum social e político que forma a base do processo: os povos latino-americanos já não aceitam ser governados à moda antiga.


 


Há ainda outro denominador comum neste movimento: o sentido integracionista. O continente, que compartilha uma identidade histórica, linguística, social e política com notáveis traços de unidade, retoma a proposta de Simón Bolívar e inicia o percurso para realizá-la.


 


Não se trata de um devaneio romântico mas de uma necessidade imposta pelo cenário concreto deste início de século 21. Tanto assim que o integracionismo perpassa a onda latino-americana em curso, desde as cúpulas governamentais até as efervescentes bases nas massas trabalhadoras. No mundo de hoje a América Latina só terá o seu espaço caso se una para ocupá-lo.


 


O Equador fornece um bom exemplo. O país abdicou de sua moeda própria e dolarizou sua economia em 1999, numa das mais radicais “reformas” da ofensiva neoliberal dos anos 90. Durante a campanha eleitoral que o levou à vitória, Rafael Correa explicitou sua oposição à dolarização, mas também a impossibilidade de simplesmente revogá-la: seria tarefa acima das forças de um país de 13 milhões de habitantes e US$ 57 bilhões de PIB. Como alternativa, acena com a perspectiva de um bloco continental dotado inclusive de uma moeda comum, caminho possível para libertar seu país dessa trampa neoliberal.


 


Forças centrípetas e centrífugas atuam sobre o processo integracionista. Entre as últimas pesam, sobretudo, os interesses imperiais dos Estados Unidos e as oligarquias locais colonizadas. O novo consenso latino-americano vai se construindo apesar delas. O admirável não é que enfrente percalços, mas que já tenha avançado tanto em tãos poucos anos, quando enfrenta tão empedernidos inimigos. Reúne todas as condições para avançar e vencer.