Obama, McCain e nós
Com as convenções dos partidos democrata e republicano, a campanha presidencial nos Estados Unidos entra em sua fase decisiva ainda […]
Publicado 02/09/2008 15:24
Com as convenções dos partidos democrata e republicano, a campanha presidencial nos Estados Unidos entra em sua fase decisiva ainda sem um franco favorito. Garantido, só o isolamento do presidente direitista em fim de mandato, que nem foi à convenção republicana, para alívio de seus correligionários. E a existência, desta vez, de uma polarização bastante nítida, em contraste com outras campanhas presidenciais americanas. A reta final da campanha anuncia-se polarizada, dura e suja.
O republicano John McCain preconiza a volta a um direitismo ''civilizado'', após o fiasco do neoconservador de ultradireita George W. Bush. Mas não se esquece de cultivar o preconceito e o medo no eleitor americano. Para vice escolheu Sarah Palin, governadora do Alasca, cujo traço mais visível é o conservadorismo: como Bush, ela luta pela recriminalização do aborto, permitido nos EUA desde 1973.
Barack Obama, ao contrário, prega a mudança e a esperança, puxando atrás de si – ou sendo empurrado por – um vigoroso movimento político de massas, sobretudo juvenil. Depois de moderar o discurso de olho no eleitor de centro, na fase pós-primárias democratas, Obama voltou a pisar no acelerador na convenção da última sexta-feira (29).
Seria prematuro predizer aonde irá o proclamado ímpeto mudancista de Obama caso chegue à Casa Branca. O Sistema estadunidense – um dos mais fossilizados do planeta – já enquadrou nas suas engrenagens os mais díspares presidentes, de um ou outro dos dois únicos partidos com carta de cidadania no país. Mas tampouco é acurada a visão que enxerga na política dos EUA uma única cor parda e chapada, sem contradições e imutável.
Qualquer que seja o desfecho da eleição, o movimento de massas que escolheu Obama como ícone já é um fato novo de primeira grandeza. O candidato democrata empresta-lhe uma cara, com sua juventude, a cor da pele, o carisma e o discurso incisivo. Mas é o movimento o personagem maior e mais fascinante, a ponto de não se discernir quem produziu quem. Não se via coisa igual nos EUA desde a campanha anti-racista dos direitos civis e a resistência à Guerra do Vietnã, quatro décadas atrás.
Dificilmente as multidões que hoje bradam ''Sim, podemos!'' voltarão para casa docilmente depois do 4 de novembro, ou se contentarão com migalhas cosméticas, especialmente caso seu candidato triunfe nas urnas. Mesmo possuindo uma outra natureza, e agindo em outras circunstâncias, elas são objetivamente aliadas da onda progressista que se alastra e se integra, ao sul, por toda a América Latina.
Repete-se de vez em quando na imprensa que o Brasil teria a ganhar com uma vitória de McCain em novembro, com o argumento de que os republicanos são menos protecionistas. A meia-verdade oculta uma miopia pragmática próxima da cegueira. Interessa aos povos do mundo e em especial da América Latina a reversão do surto neoconservador nos EUA. Entre McCain e Obama, por maiores que possam ser as limitações deste último, nem há o que discutir – como bem o percebe a platéia planetária que acompanha a eleição nos EUA.