Os metalúrgicos, de novo no centro da luta social

A campanha salarial dos metalúrgicos deste ano retoma uma tradição de luta que muitos julgavam abandonada. E que volta ao […]

A campanha salarial dos metalúrgicos deste ano retoma uma tradição de luta que muitos julgavam abandonada. E que volta ao cenário, sinalizada no dia 1º pela greve nas montadoras Volvo, Volkswagen, Renault e Nissan, no Paraná. Ela foi reafirmada, ao longo da semana, por paralisações de duração diferenciada, manifestações de rua, recusa a fazer horas extras e trabalhar nos finais de semana, e assembléias que poderão adotar formas de luta mais incisivas, com a perspectiva de uma greve nacional.



O movimento está em pleno desenvolvimento envolvendo também os estados de São Paulo (Capital, ABC e interior), Rio de Janeiro, Bahia e Goiás. Os trabalhadores querem aumentos reais de salário (acima da inflação) de 5%, reivindicam a valorização do piso salarial, gatilho salarial quando a inflação atingir 3%, jornada de trabalho de 40 horas semanais sem redução do salário, ratificação da Convenção 158 da OIT (que inibe demissões imotivadas) e o fim da terceirização e do trabalho precário. No Rio de Janeiro, protestam contra demissões na indústria naval e reivindicam o fortalecimento do setor.



A pífia resposta dos patrões acendeu o estopim da luta. Eles ofereceram um aumento real de 1,25% nas montadoras; no caso da indústria de máquinas e na eletroeletrônica, a proposta não foi melhor (2%), menos da metade do reivindicado. Por isso, foram recusadas pelos trabalhadores.



A volta dos metalúrgicos ao cenário principal da luta social permite várias reflexões. Uma delas diz respeito às mudanças ocorridas desde o início do governo Lula. Sem a chantagem do facão neoliberal que pendia sobre seus pescoços, os trabalhadores rompem as amarras e vão à luta. Hoje, a ameaça do desemprego é menor. A volta do crescimento econômico pôs as empresas a funcionar a todo vapor, e a produção e venda de automóveis batem recordes sucessivos. Só no último ano a produtividade do trabalho teve aumento de 10%, embasando a reivindicação pelos trabalhadores de uma parcela maior nos ganhos obtidos.



Até julho, as montadoras produziram 2,01 milhão de veículos, e as vendas cresceram 21,8% em relação a julho de 2007. Para produzir tudo isso, o número de metalúrgicos (de todos os setores) chegou, no primeiro semestre deste ano, a 2,1 milhões, diz o Dieese. Voltou ao nível de 1991, ainda abaixo do maior contingente (o de 1987, quando havia 2,8 milhões de metalúrgicos). Mesmo assim, muiro maior do que o de janeiro de 2000, no governo de Fernando Henrique Cardoso, quando chegou ao fundo do poço, com apenas 1,2 mihão de empregados.



Outro ponto é a demonstração prática da viabilidade da jornada de 40 horas semanais, conquistada pelos metalúrgicos de Camaçari (BA). O acordo prevê que, para manter o nível de produção, os trabalhadores vão trabalhar oito sábados em dois anos (um por quadrimente), recebendo R$3.700,00 cada e com direito a oito folgas consecutivas durante as férias. O aumento salarial conquistado em Camaçari foi de 9,5%, incluindo um aumento real de 3,5%.



O movimento registra também a ''nacionalização'' da luta deste setor operário. Depois do auge da década de 1980, o movimento dos trabalhadores recuou, refletindo a ofensiva neoliberal e a ameaça representada por ela. Foi a época em que os patrões fugiram dos locais onde os trabalhadores estavam mais organizados, mais conscientes e onde a luta era mais acentuada. Espalharam suas fábricas pelo país, em regiões onde esperavam encontrar sindicatos mais fracos. Um exemplo é o que ocorreu com as montadoras, que agora estão espalhadas pelo país. Hoje, tudo indica que esta estratégia patronal esbarra em seus limites: os sindicatos ficaram mais fortes e a luta cresce nos lugares de industrialização mais recente da mesma forma como nos lugares onde ela é mais antiga.



Uma observação final diz respeito às profecias, típicas do período de hegemonia incontestada do neoliberalismo, que confudiam a crise no setor e o resultado da chantagem contra os trabalhadores com o ''fim'' do trabalho e o declínio da classe operária. Queriam o fim das leis sociais e trabalhistas, com a consequente precarização das condições de trabalho e da renda dos trabalhadores. A volta do protagonismo dos metalúrgicos (que fazem parte do chamado ''núcleo duro'' do proletariado) desmente aquelas teses conservadoras e reafirma a disposição de luta dos trabalhadores.