Palpite infeliz de Lula

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva aventurou-se a tecer comentários sobre a evolução da espécie humana sob a ótica […]

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva aventurou-se a tecer comentários sobre a evolução da espécie humana sob a ótica das ideologias. No comentário que fez ao ser homenageado pela revista IstoÉ como personalidade do ano,  nesta segunda-feira (11), Lula mostrou uma compreensão limitada do movimento que ele próprio encabeça e encarna — a maior guinada à esquerda que o Brasil já deu.



“Eu acho que é a evolução da espécie humana: quem é mais de direita vai ficando mais de esquerda, quem é mais de esquerda vai ficando social-democrata. […] Não tem outro jeito. Se você conhecer uma pessoa muito idosa esquerdista, é porque ela está com problema. Se você conhecer uma pessoa muito nova de direita, é porque também está com problema. Então, quando a gente está com 60 anos, […] a gente se transforma no caminho do meio, aquele caminho que precisa ser seguido pela sociedade”, professorou.



Ao fazer o comentário, Lula talvez se deixe levar pela experiência empírica de sua época e de seu partido. A geração que assistiu à crise e à derrota da experiência socialista soviética por certo esfriou seus ímpetos de esquerda. O PT, fruto desse ambiente, idem, ibidem.



No entanto, quem encare a “evolução da espécie humana” de um ponto de vista mais amplo perceberá o oposto. A sociedade tem caminhado historicamente para a esquerda nos dois séculos e pouco desde que o termo foi cunhado (a onda neoliberal do fim do século passado, assim como a nazifascista de 1922-1943, ou a restauração pós-1815, não passam de contra-ofensivas quando vistas pela ótica da história). Mesmo antes de chegar ao nome “esquerda”, já a raça humana se mostrava cada vez mais irrequieta e inconformada, revolucionária, audaz.



Esta marcha evidentemente não agrada ao centro nem à direita. Menos ainda em nosso país onde a direita, sintomaticamente, recusa-se a assumir que o é. Também no resto do mundo, após o naufrágio soviético, tentou-se um movimento para adotar o “padrão brasileiro” e dar por superada a distinção. A tentativa terminou frustrada em 1994 por uma pequena obra-prima, Direita e Esquerda, do pensador italiano Norberto Bobbio.



Na relação e na tensão entre classe-vida e teoria, Lula é um magnífico expoente do primeiro pólo. Aí é o seu elemento. Aí dá nó em pingo d'água, com sagacidade e intuição de fazerem inveja. Mas não se peça a ele para teorizar sobre a evolução da espécie humana. Nem se acredite que esta “não tem outro jeito” a não ser o centro.