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Adalberto Monteiro: Canção Russiana

*

Renato,
lá na sala,
com aquela voz russiana
dele,
é uma lua
ardendo,
intumescendo
tudo o que tem vida
tudo o que habita
ou visita
a casa,
exceto quem teve
os ouvidos
arruinados por ruídos…
Os tímpanos
roídos
por besouros
carnívoros,
terríveis
bichos antigos.


 


 


A voz dele
ata-se
à voz da guitarra,
do piano
e de mãos dadas
vão passeando
em cada âmago
do corpo,
em cada cômodo
da casa
vão mergulhando
no poço da alma.
E cantam e cantam
e fremem e fremem
e meus mamilos
ficam enrijecidos
e você não esta
aqui
para suga-los
mordica-los.


 



Cantam, cantam,
e o inglês
caiu bem
na voz dele,
mas você não esta aqui
para traduzir;
então me ponho
a intuir
se as histórias
que ele canta
são alegres
ou triste;
se dizem
de mel
ou de fel.


 


 


Ele canta, canta
e tudo que tem sexo
passa a marejar
e a enrijecer,
a enrijecer
a marejar,
a expandir-se,
alargar-se,
canta, canta
e tudo que tem sexo
passa a inundar,
a alagar.


 


 


Ele canta, canta
e parece
que é um hino.
Então em mim
ergue-se uma clava forte
– zás –
para atravessar-te.
Torno-me um sertanejo
de braços fortes,
determinados
a ficar socando, socando
o teu pilão fundo;
resvalando, resvalando,
mesmo que se esfole,
mesmo que se afogue
até que a amêndoa
se destaque
até que
o azeite do gozo
se derrame.
Mas você não esta aqu.
fico
uma folha seca
girando
no redemoinho
das canções dele,
fico à deriva
da saudade
de
tuas carícias
e vem o sono
e
um sonho
unta-me
de mel.


 


 


Verbos do Amor & Outros Versos – Adalberto Monteiro