Gramsci: Um novo bode expiatório

O nome de Antonio Gramsci tornou-se um tipo de injúria demoníaca nos modernos séculos 20 e 21, sobretudo diante dos impiedosos olhos daqueles que o condenam sem ao menos dar margem ao que ele diz em seus escritos. E querem calá-lo. Quaisquer ideias que sejam minimamente semelhantes àquilo que Gramsci escreveu são, amiúde, denunciadas sob a acusação daquilo que ficou conhecido como marxismo cultural.

Em tempos de cárcere, diziam: “Precisamos impedir esse cérebro de funcionar durante ao menos vinte anos”. Em suma, estamos ouvindo novamente essa velha proclamação dos italianos fascistas acerca deste grande pensador marxista, não obstante, sob palavras mais pomposas.

A leitura de clássicos da literatura marxista como “Os Intelectuais e a Organização da Cultura” e “Maquiavel – A política do Estado moderno” transformou-se em uma dadiva dos iluminados de inclinação política à direita. Esses livros, que outrora pertenciam somente à seção dos livros de teoria política, hoje talvez devessem estar também junto dos livros de ficção e poesia, afinal, com o que dizem por aí, só podemos concluir que pensadores como Marx e Gramsci devem ser lidos e compreendidos metaforicamente. Quando Gramsci diz que o intelectual orgânico é uma célula de contra-hegemonia nos meios hegemônicos para a desconstrução do pensamento único, eles entendem que a função do intelectual orgânico é construir uma hegemonia comunista; quando Gramsci diz, em seu livro sobre Maquiavel, que a ideia do Príncipe é obsoleta e que, em um contexto atual, deve-se pensar nele como um partido, eles entendem que Gramsci quer que O Partido Comunista siga à risca a cartilha de Maquiavel. Visto esses resultados, acredito que talvez devessem tirar essas opinições como teste de sanidade.

Não bastando somente esse revisionismo chocho em cima dos autores marxistas e da falsificação quase que integral das suas respectivas obras, criam um clima de medo constante de um golpe comunista à base de uma revolução cultural gramsciana. O que pode ser mais eficaz para a criação de uma histeria coletiva senão uma repetitiva ameaça de terror, como nos tempos do integralismo de um Olímpio Mourão Filho e o seu Plano Cohen? Ou, como em um artigo do Ênio Silveira publicado no nono volume da antiga revista Encontros com a Civilização Brasileira, a tão atual ideia de que os comunistas estão por trás de todas as grandes e pequenas ações políticas que têm ocorrido nos últimos meses, como vemos: “tomando-os (os comunistas) como responsáveis diretos ou indiretos de quase todos os males e problemas que afligem o País no campo sócio-econômico e ameaçam sua estabilidade institucional. Há uma greve? — Foram os ‘comunistas’ que a insuflaram… Luta pela anistia? — São os ‘comunistas’ que inflamam a campanha… Marcham contra a carestia as donas de casa? — Podem ver que, instigando-as, há algumas agitadoras ‘comunistas’… Organizam-se movimentos em defesa da Petrobrás, da Amazônia, contra o escândalo da compra da Light? — Atrás deles estão os ‘comunistas’, sempre os ‘comunistas’…”.

Não há nenhuma novidade. Já dizia Marx, sabiamente — “A história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa”. Essa grande paranoia, como é historicamente conhecido, sempre premeditou desastres políticos, sendo o último deles, aqui no Brasil, a ditadura civil-militar de 1964.

E continuam enxergando comunistas em toda parte, enquanto se mantêm amedrontados e sonhando com uma intervenção, seja ela de origem divina ou militar. Por um bom tempo não foi preciso (e não podiam) usar o “fantasma do comunismo” como estratégia, mas não é de hoje de tudo isso está voltando à tona e as asinhas

É através destes ataques à pessoa e à obra de Gramsci, numa tentativa de desmoralizar e falsificar o comunismo, que tentam justificar ditaduras de natureza anticomunista. Uma das maiores fraudes políticas da história recente do nosso país hoje é condecorada com elogios, o que não esconde e nem mascara o seu horror e a sua deformidade em essência. Nem a perversidade daqueles que a defendem.

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