Trump é forçado a recuar depois de disparos em excesso no Twitter

A Rússia será avisada de qualquer intervenção. Mas maior preocupação do chefe do Pentágono é “evitar uma escalada incontrolável”

Por Sofia Lorena *

Donald Trump

“Preparem-se”, os “mísseis estão a caminho”, mas “pode ser muito em breve ou nem tão logo assim!”. Retirando as descrições de mísseis, “lindos, novos e ‘inteligentes’” e o termo “animal” com que agora se refere a Bashar al-Assad, esse podia ser um resumo da atividade nos últimos dias de Donald Trump na sua página do Twitter.

Já se sabe que o presidente dos Estados Unidos é impulsivo e usa a rede social de forma pouco disciplinada. Dessa vez exagerou. O “tiroteio de tweets sobre a Síria, a Rússia e a China dessa semana instaura um novo padrão para posições contraditórias e inconsistentes na abordagem de Trump à guerra, ao comércio e às relações com os seus adversários”, escreve o jornal The New York Times.

Confrontado com imagens de crianças mortas e asfixiadas, no domingo (8), Trump reagiu de imediato, prometendo que “o animal Assad” e os seus aliados pagariam “um preço muito alto”. Entretanto, chegou a falar em prazos de “24 a 48 horas” para tomar uma decisão, antes de avisar que os mísseis estavam “a caminho”.

Independentemente da responsabilidade de Assad no ataque que matou dezenas de civis em Douma, nos arredores de Damasco, ninguém parece saber quais são os objetivos de uma eventual resposta militar. Não ajuda que Trump tenha dito há pouco tempo que estava pronto para acabar com o esforço militar dos EUA na Síria. Além disso, se a ideia é contar com os aliados, convém ter noção dos seus constrangimentos: se Emmanuel Macron está pronto a avançar, o governo de Theresa May ainda delibera.

E se o Presidente americano quer mais do que ordenar alguns disparos inconsequentes é melhor ter a certeza que o Pentágono está pronto. Quarta-feira (11), o seu secretário da Defesa disse que tinha algumas alternativas para o Presidente. Já nesta quinta-feira (12), James Mattis sentiu a necessidade de acalmar os ânimos, afirmando que “ainda estão buscando provas” do ataque e que a sua “maior preocupação” ao dar uma resposta é “evitar uma escalada incontrolável”.

Trump antecipou-se e muito, mesmo porque as suas forças não estão prontas para o tipo de ataque que deverá ser decidido – disparo de mísseis cruzeiro a partir de navios, evitando assim o sistema de defesa antimíssil instalado pela Rússia na Síria. Neste momento, não há porta-aviões americanos no Mediterrâneo, embora lá se encontre o contratorpedeiro USS Donald Cook – o porta-aviões mais próximo e a caminho, o USS Harry S. Truman, só chegará à região no início de maio.

“Em termos táticos, os EUA não estão preparados para apoiar a linguagem belicosa do seu presidente com poder de fogo”, escreve Peter Beaumont no jornal britânico The Guardian. Assad já aproveitou esses dias para pôr a salvo sistemas de armas e aviões, ou seja, parte dos potenciais alvos.

Ao mesmo tempo, Trump mostrou-se especialmente duro com a Rússia de Vladimir Putin nos seus tweets, chegando a descrever a relação entre Washington e Moscou como “pior do que durante a Guerra Fria”. Na verdade, o Presidente referia-se à investigação sobre a possível conspiração da sua campanha com responsáveis russos para prejudicar a adversária, Hillary Clinton.

Em relação à Síria, as duas capitais continuam em diálogo (a linha criada para “refrear situações de conflito” funciona) e os responsáveis russos em contato com o Pentágono esperam receber as coordenadas de qualquer ataque antes desse ser lançado. Como confirmou aos jornalistas o porta-voz do Kremlin: “A linha existe e está ativa. Geralmente, é usada pelos dois lados”.