''The Economist'' diz que governo de esquerda faria bem ao México

O México realiza eleições presidenciais e legislativas neste domingo (3/7). Os eleitores escolherão um presidente para um mandato de seis anos e centenas de parlamentares, além do prefeito da capital e três governa

A conservadora revista econômica londrina “The Economist” afirmou hoje em editorial que o México precisa de um líder radical e que "há razões pelas quais uma guinada à esquerda cairia bem no México".

A declaração da revista é uma referência direta ao candidato da esquerda mais bem colocado nas pesquisas, o ex-prefeito da Cidade do México, Andrés Manuel López Obrador. Ele não admite comparações com o brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, nem com o venezuelano Hugo Chávez, mas, se vencer as eleições presidenciais mexicanas deste domingo, Obrador completaria a guinada latino-americana em direção à esquerda.

A disputa é acirrada para o ex-prefeito da capital, um viúvo de 52 anos de origem pobre, que começou a carreira política no seu Estado natal, Tabasco, onde dirigiu o instituto indígena e conviveu em humildes cabanas com os índios chontal.

Ele chega à eleição praticamente empatado com o candidato governista, Felipe Calderón, embora apareça com ligeira vantagem nos últimos dias, depois de acusar seu adversário de beneficiar um cunhado na época em que era ministro da Energia.

Com seu passado de agitador político, López Obrador surgiu como muitas das atuais lideranças de esquerda no Partido Revolucionário Institucional (PRI), que governou o México durante 71 anos, entre acusações de corrupção e autoritarismo, até a vitória do centro-direitista Vicente Fox na eleição de 2000.

Posteriormente, já nas fileiras do jovem Partido da Revolução Democrática (PRD), organizou em 1991 e 1994 passeatas contra supostas fraudes eleitorais cometidas pelo PRI em Tabasco, onde disputou o governo.

Segundo seus biógrafos, foi sua mãe, Manuela, quem mais influiu no seu caráter rebelde e na sua identificação com os pobres — algo que ajudou sua popularidade a disparar quando foi prefeito da problemática Cidade do México, de 2000 a 2005.

A campanha dele não se limita a prometer para todo o país os programas sociais que criou na capital. López Obrador também denuncia os privilégios em um país onde metade da população vive na pobreza, junto a verdadeiros impérios econômicos como o do magnata Carlos Slim.
"Todos os candidatos prometem combater a pobreza, mas seu tema central é a denúncia do privilégio, e isso, num país tão desigual como o México, tem ressonância", disse à Reuters a analista Soledad Loaeza, da entidade privada Colégio do México.


“Pelo bem de todos, primeiro os pobres”


O slogan "Pelo bem de todos, primeiro os pobres" cala fundo na população pobre e dá ao candidato uma aura messiânica.

"Temos uma grande esperança nele, parece um bom homem, alguém que enfim nos atenderá", disse a camponesa Flor, de Motozintla, região do miserável Estado de Chiapas, atingida no ano passado pelo furacão Stan.

"Chegou a hora da maioria", repete o candidato nos seus comícios, propondo "uma verdadeira purificação da vida pública". Essas frases provocam arrepios nas classes alta e média, especialmente entre os empresários, que temem que López Obrador se torne uma espécie de Robin Hood e acabe desestabilizando a economia.

Mas apesar da eleição presidencial do México ter sido amplamente tratada como uma luta entre ricos e pobres, o resultado da votação quase certamente será decidida por eleitores de classe média.


“El peje” anda de Nissan


Grisalho, moreno, o candidato é frequentemente alvo de piadas por seu sotaque interiorano. Seu apelido é "El Peje", corruptela de "pejelagarto", um peixe típico de Tabasco.

Ele desperta adoração de milhões por sua reputação de homem honesto e austero, que contraria a imagem típica que os mexicanos fazem dos seus políticos — inclusive de alguns colaboradores do ex-prefeito, envolvidos em escândalos.

Seus adversários, porém, o consideram autoritário, e alguns assessores admitem que muitas vezes ele não lhes dá ouvido e que é difícil fazê-lo mudar de opinião.

Ao mesmo tempo, parece não ter nenhuma ambição material. Ao contrário da maioria dos ocupantes de cargos públicos, vive em um modesto apartamento de classe média-baixa, com 120 metros quadrados, ao lado dos três filhos. Desloca-se há anos em um modelo popular da marca Nissan, o mesmo usado por inúmeros taxistas mexicanos.

"Até o último dos prefeitos de província que conheci vive melhor do que López Obrador", disse à Reuters um dos seus principais assessores, o ex-governador Ricardo Monreal.

Os analistas acham que sua campanha recebeu no ano passado um empurrão do próprio Fox, quando o presidente tentou processar o então prefeito da capital por desobedecer a uma ordem judicial. Transformado em vítima, López Obrador atraiu a simpatia de milhares de manifestantes que foram às ruas para evitar a perda da sua imunidade. Fox acabou desistindo do processo.

Entre os seus mitos pessoais, López Obrador cita heróis da história mexicana, como os ex-presidentes Benito Juárez e Lázaro Cárdenas. Garante que nunca falou nem por telefone com Chávez. "Não o conheço. Nem dou atenção quando me comparam a ele", afirmou recentemente.


Prisão de Echeverría

Dois episódios ocorridos nesta última semana de campanha podem influenciar no resultado da eleição de hoje: a prisão domiciliar do ex-presidente Luis Echeverría e a invasão do site de Obrador esquentaram.

Um juiz federal mexicano ordenou a apreensão de Echeverría, de 84 anos, por genocídio, devido à sua responsabilidade num massacre de estudantes, em 1968, quando era secretário de Governo.

O Partido Revolucionário Institucional chamou de "anacrônica e ridícula" a ordem de detenção, levantando a suspeita de uma tentativa de influir nas eleições do domingo.
Analistas políticos consideram o caso de Echeverría um símbolo do sistema autoritário representado pelo PRI, que governou o país de 1929 a 2000.

Enquanto isso, o Partido da Revolução Democrática (PRD) denunciava um ataque ao site do candidato presidencial esquerdista Andrés Manuel López Obrador, que foi alterado, passando a exibir uma mensagem apócrifa defendendo a resistência civil.
Os representantes de López Obrador vão apresentar queixa, pedindo à Polícia que investigue o caso.

Os mercados financeiros mantiveram a tranqüilidade nos últimos dias e só reagiram aos anúncios sobre a economia e as taxas de juros nos Estados Unidos.

Veja como a eleição mexicana funciona:

ELEIÇÃO PRESIDENCIAL

Há cinco candidatos. Não existe segundo turno nem margem mínima para que seja declarado o vencedor – ganha quem tiver mais votos.

A Constituição proíbe o presidente Vicente Fox de se candidatar à reeleição.
O Instituto Eleitoral Federal organiza o pleito, apura os votos e declara o vencedor. Se o resultado for contestado, o Tribunal Eleitoral Federal tem a última palavra, com prazo até 31 de agosto. O Congresso não tem poder para definir um resultado eventualmente contestado.

 CANDIDATOS

Andrés Manuel López Obrador, do Partido da Revolução Democrática (centro-esquerda). Ex-prefeito da Cidade do México, é apoiado por dois outros pequenos partidos de esquerda. Tem ligeira vantagem nas pesquisas.

Felipe Calderón, do Partido Ação Nacional (conservador). É o candidato do governo, e aparece tecnicamente empatado com López Obrador nas pesquisas.

Roberto Madrazo, do Partido da Revolução Institucional (PRI, que governou o México na maior parte do século 20). Tem apoio do Partido Verde e está em terceiro nas pesquisas.

Roberto Campa, do pequeno Partido Nova Aliança.

Patricia Mercado, do pequeno Partido Social Democrático e Alternativa Camponesa.

ELEITORES

Cerca de 71,7 milhões estão em idade de votar, mas apenas 71,3 milhões têm título eleitoral.

Pela primeira vez os mexicanos no exterior (principalmente nos Estados Unidos) poderão votar para presidente. Mas apenas 40 mil se registraram para isso, bem menos do que o previsto pelas autoridades.

Ao contrário do que acontece no Brasil, o voto não é obrigatório. Cerca de 37,6 milhões de eleitores votaram na última eleição presidencial, em 2000 — comparecimento de 64%, considerado elevado.

CONGRESSO

Serão escolhidos 500 deputados e 128 senadores. O PRI, principal partido da oposição, tem a maior bancada em ambas as Casas. A Constituição mexicana proíbe a reeleição de parlamentares.

CIDADE DO MÉXICO

Os moradores da capital escolherão também o novo prefeito, um dos cargos mais importantes no país, ocupado até meados de 2005 por López Obrador. O PRD controla a prefeitura da cidade desde 1997, quando começou a eleição direta para prefeito.
Serão eleitos também 66 vereadores e os administradores dos 16 distritos que formam a megalópole.

GOVERNADORES

Os Estados de Guanajuato, Jalisco e Morelos vão eleger novos governadores. Atualmente, o Pan, do presidente Fox, governa os três.