Pós-debate: os dois lados comentam

Por Maurício Hashizume e Marco Aurélio Weissheimer, na Agência Carta Maior*
As repercussões do primeiro debate do segundo turno, na noite de domingo (8), extrapolaram as avaliações da imprensa e se tornaram objeto de manifestações dos representantes de

Na manhã desta segunda-feira (9), a coordenação da campanha à reeleição do presidente Lula convocou coletiva de imprensa com o ex-ministro e governador petista eleito em primeiro turno na Bahia, Jaques Wagner. Embalado pela vitória que afastou o grupo do senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA) do governo estadual, Wagner foi escalado para fazer as vezes de porta-voz da chapa da coligação “A Força do Povo”, que engloba o PT, o PCdoB e o PRB, do atual vice-presidente e novamente candidato ao mesmo posto, José Alencar.



O governador eleito da Bahia veio a público para explicitar a avaliação geral do comando da campanha de Lula e para preencher algumas lacunas deixadas no debate que colocou o presidente frente a frente com o ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, da coligação “Por um Brasil Decente”, formada pelo PSDB e pelo PFL.



“Não vencerão a eleição com um tema só”



Wagner admitiu que o presidente ficara surpreso com a “agressividade encomendada” do adversário tucano. Segundo o ex-ministro, o oponente de Lula ficou repetindo um “mantra único” – “onde está o dinheiro (da malograda operação de compra do Dossiê Vedoin)?” –, remoendo o envolvimento de petistas em ações ilegais. “Eles não vencerão a eleição com um tema só. A sociedade é mais complexa do que isso. Confiamos na maturidade do povo”, declarou Wagner, que oficialmente não ocupa cargo na campanha. Ele garantiu que os petistas não pensarão duas vezes em revidar esse tipo de acusação, sublinhando que também houve casos nebulosos de desvio na administração tucana do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. “O PSDB não é escola para ensinar ética ao PT”.



O ministro Tarso Genro (Relações Institucionais), em coletiva concedida em Porto Alegre, avaliou que “a mistificação do ‘sabia/não sabia’ caiu por terra quando o presidente Lula fez referência à desenvoltura da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) em ataques que simplesmente paralisaram e aterrorizaram a capital paulista neste ano. “Com 12 anos de governo, Alckmin não sabia que a maior organização criminosa que o país já viu estava tomando conta da segurança pública em São Paulo, estava tomando conta dos presídios?”, indagou Genro. “Nós acreditamos que ele não sabia, pelo princípio da boa fé, mas fica desmascarada a mistificação em torno dessa questão do ‘sabia/não sabia’, no que se refere às irregularidades cometidas no Estado brasileiro”.



Alckmin: Refleti “a indignação do povo”



Em seu blog de campanha, Alckmin veiculou comentários sobre a sua atitude no debate. “Muitos dizem que se surpreenderam com uma postura crítica, até agressiva, de minha parte. Não há motivos para isso. Minha atuação simplesmente refletiu a indignação do povo diante de tantos escândalos e da postura de um presidente que se acha acima do bem e do mal quando se recusa a vir a público dar as explicações que deve a todos”, sustentou.



O presidenciável assinalou que pretende “resgatar nosso País deste estado dramático em que foi colocado por Lula e seus companheiros (de gabinete e de churrascadas)” e pediu explicações sobre o dinheiro do dossiê, da verba das cartilhas sumidas da Secretaria de Comunicação da Presidência, e de todos os inúmeros escândalos do governo federal. “Tive a oportunidade de, em nome do povo, perguntar diretamente a Lula, sem rodeios, sobre tudo isto. Mas ele não tem respostas. Foi ao debate, mas se recusou a explicar. Deve ser difícil para ele ter de enfrentar tão abertamente um processo verdadeiramente democrático”.



Rico agora também vai preso



O avanço no processo democrático, salientou Jaques Wagner, requer, antes de mais nada, o combate à hipocrisia. Lembrou que a questão ética não é apenas uma questão de governo, mas das instituições e da própria sociedade. “O que determina isso é o temor da lei, para que as pessoas saiam do caminho do erro. Não é a filiação partidária”. O combate à corrupção, portanto, precisa ser promovido pela estrutura do Estado. “Nós não manipulamos nada e essa é a cara do nosso governo”, defendeu, destacando a atuação da Política Federal (PF) e do Ministério Público Federal (MPF).



Ele considerou equivocada a interpretação de que o povo age de forma conivente com as irregularidades ao se apresentarem de modo favorável à continuidade de Lula no Poder Executivo. “Faz parte da estratégia deles criminalizar o PT e criar um clima de desestabilização, colocando dúvidas sobre a condução do governo. Não somos ingênuos e não vamos entrar nesse jogo”, antecipou Wagner. O governo Lula, segundo o governador eleito da Bahia, fez “mais e melhor que os outros no combate à corrupção” e é isso o que o povo quer saber.



A PF, por exemplo, realizou operações “desde a Daslu ao dólar na cueca, sem distinção de nome, sobrenome ou filiação partidária”. O delito é incentivado pela sensação de impunidade, completou. Em sua campanha na Bahia, Wagner disse ter sentido a alegria das pessoas mais simples ao saber que “aquela velha regra de que rico não vai mais preso”, o famoso “carteiraço”, está sendo pelo menos parcialmente contrariada neste governo. “O presidente citou um fato histórico, a compra de votos para a reeleição de FHC. Citou também o caso dos vampiros, das sanguessugas, que passaram absolutamente impunes no governo anterior”, completou Genro.



Outro ponto tocado por Wagner na coletiva foi o tema da pressão por um julgamento precipitado de pessoas citadas em casos ilícitos, que pode implicar em graves injustiças. Ele citou o caso do deputado federal petista eleito para a próxima legislatura, Geraldo Simões. O parlamentar fora acusado (inclusive por matérias de revistas semanais de circulação nacional) de ter levado propositalmente, de maneira criminosa e com fins políticos a praga da “vassoura-de-bruxa” para plantações de cacau, acabou inocentado e foi eleito no último dia 1º pela Bahia. O caso do ex-segurança da Presidência da República, Freud Godoy, que apareceu (citado “graciosa e gratuitamente”) em capas de jornais como participante do esquema de crime, é parecido. A própria PF e o Ministério Público já se pronunciaram sobre o caso e não têm elementos que envolvem Freud, citado de bobeira pelo ex-araponga Gedimar Passos, que trabalhava na campanha à reeleição, em depoimento à Polícia Federal. “Não há nada mais dolorido do que pagar pelo que não se fez, como no caso da Escola Base. Aquela gente nunca será a mesma”.



“A escolha é entre dois projetos”



Na avaliação de Jaques Wagner, o grau de virulência de Alckmin não impediu que o ponto central fosse diferenciado: os distintos modelos político-administrativos defendidos por cada uma das candidaturas. “A escolha não é entre dois homens, mas entre dois projetos políticos”, disse. Um dos pontos de clivagem, na opinião do governador eleito, saltou aos olhos dos telespectadores quando o tucano defendeu “a concepção atrasada de que a gestão pública é ineficiente” e expôs a “baixa responsabilidade social” de seu projeto.



A opção do candidato tucano de investir pesado em temas isolados como a venda do avião utilizado pela Presidência comprado por Lula e a suspensão dos gastos com passagens e diárias de funcionários federais e publicidade do governo federal, anteviu o governador eleito pela Bahia, pode repelir votos da classe média. “É muito difícil achar que isso é coisa séria”, classificou.



“Ele disse que eu vou privatizar. É mentira”



Já Alckmin criticou as “mentiras” propaladas pelo seu concorrente. “Ele (Lula) disse que eu vou privatizar o Banco do Brasil, os Correios, a Petrobras, a Caixa Econômica Federal e que eu vou acabar com o Bolsa-Família. É tudo mentira. E até que eu vou acabar com a Zona Franca de Manaus, que está na Constituição brasileira. É mentira. Eu falo a verdade. E falo frente a frente, não pelas costas”, completou.



Wagner recorda, porém, que a gestão de FHC junto à Petrobras, por exemplo, não passou de mera preparação para a privatização – parcial ou integral – da empresa. A ‘ineficiência’ dos funcionários públicos elevou os preços das ações da estatal do setor energética de US$ 14 para US$ 80, ironizou o ex-ministro de Lula. “É só pegar um histórico com a curva de investimentos”, sugeriu. A reconhecida gestão pública de excelência, reconhecida internacionalmente, permitiu avanços na área de gás, biodiesel, etc. “A Petrobras é outra”.



“A candidatura tucana não representa o novo. É o passado. É o antigo”, atacou Wagner. “A novidade é o Lula”. O PSDB não tem argumento, de acordo com ele, nem no campo da gestão. Em viagens e diárias, FHC gastou US$ 900 milhões e Lula, US$ 700 milhões. O avião – apelidado de Aero Lula – não é apenas um transporte para a Presidência, mas um avião da propriedade da Força Aérea Brasileira (FAB). Equipamento para as Forças Armadas, inclusive para treinar pilotos. “Com R$ 22 bilhões investidos na área social, o avião (de cerca de R$ 125 milhões) desaparece”.



O governador ressaltou ainda que o governo federal não colocou dinheiro no trecho Oeste do Rodoanel de São Paulo, por causa de uma proibição de repasse imposta pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Sobre o alegado aparelhamento do Estado, Wagner apresentou dados que garantem que o número de funcionários nomeados sem concurso permanece praticamente estável em relação à porcentagem verificada na Era FHC; sem contar que o próprio Lula assinou decreto que limita a porcentagem de cargos comissionados conforme o grau de hierarquia dentro do governo.



Aécio: “Precisamos deste novo governo”



“O melhor para o destino dos mineiros, e de todos os brasileiros, seria que se encerrasse o ciclo do PT no governo e se iniciasse o ciclo de uma administração preenchida pelo mérito das pessoas, não pela filiação partidária”, afirmou o governador tucano reeleito de Minas Gerais, Aécio Neves, aos jornais Correio Braziliense e O Estado de Minas. “Precisamos deste novo governo para fazer um governo que planeje o futuro e que tenha coragem de fazer, nos próximos anos, com que os gastos correntes cresçam na proporção menor do que cresce o PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro”, adicionou. Entre as propostas de Alckmin, o governador de Minas destacou a transferência da totalidade dos recursos da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) e a não contenção de verbas para Segurança Pública.



Wagner aposta no diferencial do projeto político-administrativo do presidente Lula. O predomínio de maioria absoluta folgada (mais de 60%) nas disputas presidenciais já faz parte do passado, julgou o ex-ministro, para quem as acirradas eleições devem ser decididas por não mais do que 10% a 15% de eleitores de opinião mais volátil, disputados a peso de ouroneste derradeiro período de campanha. “O povo não acredita mais no salvador da pátria, em céu e inferno. Nessa coisa de que um é o santo e o outro é o diabo”, relatou o governador petista.



* Intertítulos do Vermelho