Editora Anita lança obra que questiona liberalismo burguês

Com um olhar acurado sobre as mazelas impostas aos dominados pelas classes dominantes, o intelectual italiano Domenico Losurdo lança na capital paulista o livro Liberalismo. Entre civilização e barbárie, da editora Anita Garibaldi. A obra trata d

“A última guerra contra o Iraque foi acompanhada por um singular fenômeno ideológico; tentaram fazer calar o movimento de protesto, de amplitude sem precedentes, que se desenvolveu na ocasião, lançando contra o movimento de protesto a acusação de antiamericanismo”. É dessa forma que Domenico Losurdo inicia o tópico “Mito e realidade do antiamericanismo de esquerda”, de sua mais recente obra Liberalismo. Entre civilização e barbárie, lançado pela editora Anita Garibaldi na noite de ontem (11) na livraria Fnac Pinheiros, em São Paulo.




Para uma platéia atenta, o intelectual italiano discorreu a respeito da supremacia dos povos brancos sobre os demais e traçou um panorama dessa hegemonia desde os tempos coloniais até os dias de hoje, ressaltando que nos Estados Unidos de Bush, país tido como referência democrática, negros, latino-americanos, índios e árabes ainda são submetidos a preconceitos seculares. Losurdo lembra que a sociedade estadunidense desenvolveu-se tendo como um de seus principais pilares a escravidão. “Em 32 dos 36 primeiros anos da história dos Estados Unidos,  os presidentes daquele país eram proprietários de escravos”, disse, citando como exemplo George Washington (1789-1797), Thomas Jefferson; (1801-1809) e James Madison; (1809-1817).




Desumanização




Ao falar do desenvolvimento do liberalismo, Losurdo tratou especialmente do duplo processo de desumanização que, segundo ele, além de atingir diretamente os escravos e povos colonizados, se estendeu aos trabalhadores europeus. “Então, os assalariados eram tratados como meros instrumentos falantes de trabalho. Havia aqueles que consideravam os escravos simplesmente animais bípedes”, lembrou o marxista. Com base nisso, Losurdo ressaltou que, quando Alexis de Tocqueville lança seu olhar à democracia na América, no século 19, o jurista francês na verdade estava levando em conta apenas a parcela branca da sociedade. Segundo Losurdo, se considerasse também os negros e índios, certamente não seria possível falar de democracia, uma vez que a base do sistema norte-americano é a da  “democracia para os senhores”.




A abolição da escravatura nos Estados Unidos não acabou com a discriminação e a segregação racial. Sob a égide liberal, que pregava a igualdade entre os homens perante a lei, o país continuava a excluir da sociedade e da vida política os negros americanos. Neste contexto, nasce em meados do século 19 a Klu Klux Klan. Em seu livro, Losurdo fala da ligação entre a organização e os círculos alemães de extrema direita, e entre a concepção norte-americana de white supremacy e o Terceiro Reich. “O programa de restabelecimento das hierarquias raciais acopla-se estreitamente ao projeto eugênico”, escreveu Losurdo. E completou dizendo que o projeto é uma forma de “cavar um abismo intransponível entre a raça dos servos e a raça dos senhores, depurando esta última dos elementos impuros, capacitando-a a afrontar e vencer a revolta servil que se delineava, em nível planetário, na onda da revolução bolchevique”.




Sobre Outubro de 1917, Losurdo lembrou que os princípios marxistas, que nortearam a Revolução Russa, tiveram o papel de expressar a voz daquele povo desumanizado. “O resgate da dignidade humana foi um dos pontos mais importantes da revolução”, disse o professor. Aliás, lembrou Losurdo, a revolução aplacou pelo menos três tipos de discriminação: contra as mulheres, os pobres e a racial. 





Hoje como ontem…




Voltando aos dias atuais, Losurdo não deixou de citar os descalabros cometidos pelos Estados Unidos de George W. Bush, com especial destaque para as prisões de Guantánamo e Abu Graib, como uma continuidade do tratamento dado pelo país aos que considera inferiores. “Ao ver a forma como seus prisioneiro são tratados, devemos nos questionar se realmente existe democracia para os norte-americanos. Afinal, quem vai para Guantánamo, se não os excluídos, que não fazem parte do povo dos grandes senhores?”, questionou. Losurdo lembrou ainda que mesmo entre os trabalhadores norte-americanos, a discriminação se faz presente. “É difícil unificar a classe operária americana porque dentro dela há estratificações étnicas, aspecto que a classe dominante procura reforçar para evitar a mobilização dos trabalhadores”, disse, ressaltando acreditar que esse processo já dá sinais de crise com a maior unificação da classe operária.




Como apontado por João Quartim de Moraes, professor da Unicamp e José Carlos Ruy, jornalista, no prefácio de Liberalismo. Entre a civilização e a barbárie, um dos grandes méritos de Losurdo é “retomar o universalismo de Lênin, para quem existe apenas uma humanidade, sem raças inferiores ou superiores, mas dividida em classes que dominam e classes que são obrigadas a trabalhar em benefício de outras”.




O livro Liberalismo. Entre a civilização e a barbárie pode ser adquirido na própria editora Anita Garibaldi, pelo http://www.anitagaribaldi.com.br/loja/ . Mais informações pelos telefones (11) 3289-1331/ 3266-4312 e 3266-4313.




De São Paulo,
Priscila Lobregatte