A defesa do meio-ambiente e dos direitos humanos na China

Presidente do Banco Mundial, Paul Wolfowitz, ataca China com paupérrima propaganda ideológica do regime norte-americano


 

Por Osvaldo Bertolino


 


O repúdio do governo chinês às palavras do presidente do Banco Mundial, Paul Wolfowitz, segundo as quais a ajuda financeira chinesa à África compromete o desenvolvimento social e a proteção ambiental no continente, é um bom exemplo para se entender como os interesses econômicos dos monopólios privados internacionais distorcem questões fundamentais sobre as soberanias dos países. ''A China não pode aceitar um comentário que diz que a assistência financeira à África enfraquece a situação dos direitos humanos'', disse Liu Jianchao, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, respondendo aos comentários de Wolfowitz publicados no jornal Financial Times.


 


Os empréstimos dos bancos chineses à África, disse Wolfowitz, ignoram os ''Princípios do Equador'', um compromisso voluntário que obriga os projetos de desenvolvimento pagos com financiamento privado a respeitar padrões de conduta social e ambiental. ''A China não pode aceitar essa acusação'', disse Liu Jianchao, que sublinhou que ''a China adota uma posição de não interferência nos assuntos internos dos outros países''. ''A China não quer ver impostos a si mesma outros valores e sistemas sociais, e vice-versa'', ressaltou o porta-voz. Para ele, a cooperação entre China e África ''tem sido positiva, na base da igualdade e benefícios mútuos, com o objetivo de promover o desenvolvimento social e econômico e melhorar a qualidade de vida dos povos africanos''.


 


Dois motores


 


A capital chinesa recebe entre 3 e 5 de novembro chefes de Estado e de governo do Fórum de Cooperação Sino-Africano, com a presença já confirmada dos mais altos representantes de 48 países africanos. Wolfowitz também criticou os empréstimos da China, da Índia e da Venezuela aos países pobres. Para ele, ''existe o risco real de ver países que se beneficiaram de perdão de dívidas voltarem a ficar altamente endividados''. A verdade é que a ascensão política e econômica desses países — sobretudo a China — representa um imenso desafio para os países centrais. O problema não tem nada a ver com meio-ambiente e direitos humanos. É a vitalidade da economia chinesa, com seu crescimento acelerado, que incomoda.


 


Existem, basicamente, dois motores responsáveis pelo avanço irresistível da economia chinesa. Em primeiro lugar, há a estrutura política, que permite uma vigorosa ação do Estado. Em segundo lugar, o governo está sempre formulando estratégias inovadoras. É claro que há nisso uma contradição que diz respeito a todos os países, não apenas à China: a deterioração ecológica é um fenômeno de sociedades industriais. O problema é que os países centrais só se tornaram defensores do verde depois que aniquilam todo o seu verde. É assim com os Estados Unidos, cuja voracidade em relação ao meio ambiente, desde suas origens como nação, não tem par. É um pouco assim, também, com o Japão. A fuligem no ar japonês é assustadora.


 


Protocolo de Kyoto


 


A China, ao contrário dos Estados Unidos, aderiu ao Protocolo de Kyoto. E isso tem peso. O governo chinês, pode-se dizer, não se descuidou desse detalhe quando decidiu ajudar a África. As soluções propostas para o combate à pobreza pela Organização das Nações Unidas (ONU) são o financiamento internacional aos países mais periféricos da economia mundial para eles se adaptarem às transformações ambientais e reduções na emissão de gases mais rigorosas que as fixadas pelo Protocolo de Kyoto. Também são reivindicados mais projetos públicos, de pequena escala, na área de energia renovável. Tais iniciativas poderiam ajudar tanto a atenuar as mudanças climáticas quanto a reduzir a pobreza.


 


Internamente, a China acaba de anunciar um plano de investimentos de US$ 175 bilhões entre 2006 e 2010 em proteção ambiental. O dinheiro será gasto, entre outras coisas, no controle da poluição e em melhorias no meio ambiente rural. Além disso, entidades do Estado têm dado prêmios a ativistas ambientais e publicado informações sobre a magnitude do problema. Talvez nenhum chinês discuta a necessidade de melhoria ambiental no mundo. O que os incomoda é a forma como essa questão é interpretada e usada para atrapalhar o desenvolvimento do país.


 


Bolha de sabão


 


Os países que estão se desenvolvendo enfrentam um desafio que a maior parte dos países ricos não conheceu. O processo de industrialização e ocupação territorial nos países centrais ocorreu há muitas e muitas décadas, no tempo em que só alguns visionários falavam em preservação ambiental. Grande porção da cobertura vegetal da Europa e dos Estados Unidos desapareceu há décadas para ceder lugar à construção de cidades, estradas e barragens. A consciência ecológica desses países despertou apenas quando as grandes obras de engenharia já estavam feitas — assim como os grandes estragos. Somente depois disso é que leis ambientais rígidas começaram a ser aprovadas.


 


Sobre direitos humanos, as bases das declarações de Wolfowitz têm a consistência de uma bolha de sabão. A china tem dito que deve-se combinar a aplicação dos princípios gerais dos direitos humanos com a situação nacional dos diversos países. Devido à diferença de sistemas sociais, aos níveis de desenvolvimento econômico, às tradições históricas e culturais dos diversos países, é natural que suas observações e métodos de pôr em prática os direitos humanos não sejam iguais. Levando em conta a situação nacional e sua tradição, de acordo com as experiências adquiridas durante longo tempo, a China formou seu próprio conceito sobre direitos humanos. As palavras de Walfowitz, por tudo isso, não passam de repetição da paupérrima propaganda ideológica do regime norte-americano