Kjeld: Observatório mediu e comprovou parcialidade da mídia

Os meios de comunicação oferecem um conteúdo muito interessante para os mais diversos ramos de estudo, em especial nas Ciências Políticas. Daí o surgimento de órgãos de pesquisas sobre o assunto mídia e política. O Observatório Brasileiro de Mídia é uma d

por Dida Egen


 


Ao contrário do Observatório da Imprensa, mantido pelo jornalista Alberto Dines e que tem se dedicado basicamente a defender os interesses das empresas de comunicação, o Observatório de Mídia é bem mais crítico em relação ao comportamento da mídia. A entidade é composta por pesquisadores, professores e analistas políticos que acompanham e monitoram como a mídia se comporta diante de fatos importantes e em que medida preserva os seus princípios de isenção, neutralidade e imparcialidade diante dos fatos.


 


Um dos diretores do Observatório de Mídia e presidente do Observatório Social, Kjeld Jakobsen, explica nesta entrevista como a entidade trabalha. Ele fala também sobre o papel dos meios de comunicação durante as eleições de 2006.


 


Quando surgiu o Observatório Brasileiro de Mídia?
Kjeld:
Durante a campanha eleitoral para prefeitura em 2002, eu já havia iniciado um trabalho de análise e acompanhamento. E desde então, o jornal O Estado de São Paulo, já demonstrava uma preferência em termos de candidatura, embora eles jamais tenham admitido isso publicamente, nem em editorial e nem qualquer tipo de posicionamento, que aliás é o que se repete hoje. No 5º Fórum Social Mundial, em Porto Alegre, numa assembléia, fundamos o Observatório Brasileiro de Mídia, filiado ao Media Watch Global, com a intenção de contribuir para o debate da democratização dos meios de comunicação.


 


Quais foram os veículos analisados durante a campanha eleitoral de 2006?
Kjeld
: Nós fazemos um monitoramento de 5 jornais de alcance nacional importante (Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo, O Globo, Jornal do Brasil e Correio Brasiliense), além de 4 revistas semanais (Veja, Época, IstoÉ e Carta Capital). E nós vemos esse comportamento se repetindo, com exceção da Carta Capital, que é a única que adotou uma posição em termos de candidatura preferencial. O leitor da Carta Capital sabe do posicionamento editorial da revista, do ponto de vista dessa eleição presidencial. Mas, os leitores dos demais órgãos oficialmente não sabem, embora pelo que nós pudemos medir, se torna meio óbvio que há preferências por parte desses organismos. Preferência no seguinte sentido: 1º, de não querem o Lula, 2º, por decorrência, por conseqüência preferirem o 2º colocado, Alckmin.


 


Como você analisa o apoio declarado pela revista Carta Capital ao candidato Lula?
Kjeld
: O que move o interesse de uma revista por querer agradar ou desagradar o governo, o que eles podem esperar do ponto de vista de ganho do governo, é a publicidade. Porém, a publicidade é distribuída à partir de critérios já definidos para todos os órgãos que solicitam, se oferecem para ter publicidade. A Veja, por exemplo, que é absolutamente oposicionista ao governo recebe mais publicidade que a Carta Capital, até porque tem mais assinantes, então ela recebe publicidade proporcionalmente. O que nós tentamos monitorar: primeiro, a imprensa quer se tornar árbitra dos fatos, segundo, a imprensa quer influenciar a opinião pública. Apesar de declarações de que o papel de um veículo de comunicação como a TV é de entreter, divertir e orientar o povo brasileiro. E obviamente existem os interesses comerciais dos donos dos meios de comunicação. No caso da Carta Capital, eu diria que ela adotou uma posição correta no sentido de dizer quem apóia. Então as pessoas podem ler as matérias que estão na revista a luz dessa informação e aí subtrair ou somar o subjetivismo disso.


         Normalmente na Europa você tem jornais e revistas claramente posicionadas. Por exemplo, quem compra o Humanité na França sabe que é o jornal porta voz do Partido Comunista Francês; na Itália, o Corriere della Sera, sabe que é o jornal do Vaticano, e assim sucessivamente. O The Washington Post e o The New York Times, quando tem eleições nos Estados Unidos, eles costumam declarar o apoio a determinado candidato. E isso não gera nenhuma crise. É a mínima transparência que se pode esperar e o leitor opta se ele compra o jornal ou não.


 



Como são feitas as análises do Observatório de Mídia?
Kjeld
: O trabalho é muito simples. Nós pegamos os jornais e revistas, lemos colunas, reportagens, artigos e cada vez que é mencionado um dos candidatos abrimos uma ficha. Analisamos se a matéria mencionou determinado candidato de forma positiva, negativa ou neutra. Além disso, também se analisa o morfômetro, para se medir o destaque dado a matéria. Isso também pesa. Então nos primeiramente analisamos as posições e dentro dessas posições, analisamos se foram positivas, negativas ou neutras. Para reduzir a margem de erro, as matérias são analisadas por mais de uma pessoa, pois há controvérsias.


 


E especificamente nessa campanha, qual foi o resultado da análise?
Kjeld
: Acabamos descobrindo que Lula candidato e Lula presidente teve uma super exposição. Ao mesmo tempo, Lula candidato, Lula presidente teve mesmo índice de exposição negativa, sempre alto. No primeiro turno era de 50 a até 60% de exposição negativa e 20% positiva. Particularmente nas duas últimas semanas, durante o episódio do dossiê a exposição negativa foi muito grande. O candidato Alckmin que recebe o segundo volume de exposição, teve um tratamento mais positivo, sendo 40% de exposição positiva e apenas 20% de exposição negativa. Isso é prejudicial ao candidato, nesse sentido é que aparece o desequilíbrio. Claro que não tem como um jornal ou uma revista deixar de cobrir uma notícia que é negativa ou positiva pro cidadão. O presidente Lula, foi mais visado porque a intenção clara era de colocá-lo na berlinda, de expô-lo mesmo. O que se observou foi sempre a tentativa em fazer ligações entre Lula e os fatos, que não foram praticados por ele.


 


No governo FHC, também tivemos denúncias de corrupção, como a compra de votos para a reeleição, e a imprensa se calou…
Kjeld
: A imprensa apoiava a reeleição de Fernando Henrique. Esses episódios de sanguessuga, Marcus Valérios começaram no governo FHC. Agora tem uma diferença nesse governo aqui, ao mesmo tempo em que é mais visado, ele também é um governo mais aberto para a população, além disso tem uma preocupação maior em combater a corrupção, o que a Polícia Federal vem fazendo nunca se viu nesse país, até juiz que a classe mais intocada, talvez a mais corrupta desse país, foi preso.


 


A Veja e tantos outros veículos saem desmoralizados, perdem credibilidade após essa tentativa de derrubar o governo com denúncias atrás de denúncias?
Kjeld
: Saem desmoralizados porque aquilo que afirmam não se comprova. O problema é que quando você inventa uma história ela se sustenta durante um certo tempo, depois não mais. E um dos problemas que vem ocorrendo no Brasil é que o risco desses meios de comunicação perderem a credibilidade é muito grande e eles (os meios) não estão levando isso em consideração.