Inácio Arruda – novo desafio: O Senado
No final do ano passado a jornalista, Viviane Lima, da Revista Plenário, publicada pela Assembléia Legislativa do Ceará, entrevistou o então senador eleito Inácio Arruda. Na entrevista o parlamentar fala de sua expectativa em relação ao Senado Fed
Publicado 13/02/2007 22:08 | Editado 04/03/2020 16:37
Inácio Arruda, 49 anos, iniciou sua vida pública nos anos 80, como presidente da Associação dos Moradores do Bairro Dias Macedo e logo em seguida, presidente da Federação de Bairros e Favelas de Fortaleza.
Do movimento popular, Inácio começou a sua vida pública. Em 1988 foi eleito vereador, em 1990, deputado estadual e em 1994, deputado federal, se reelegendo em 1998 e 2002. Nesta última eleição para a Câmara Federal, Inácio recebeu 302.627 votos, sendo na época o deputado federal mais votado em toda a história do Ceará. Inácio também disputou a Prefeitura de Fortaleza.
Seguindo a sua trajetória ascendente nos parlamentos, já tendo sido vereador, deputado estadual e federal, Inácio Arruda chega em 2007 ao Senado Federal. Eleito com 1.912.663 votos do eleitorado cearense (52,25% dos votos válidos) o cearense é o primeiro senador comunista eleito desde Luís Carlos Prestes, o lendário “Cavaleiro da Esperança”, em 1946.
De pés no chão e pragmático, Inácio diz que foi-se o tempo em que ser comunista era defender uma sociedade socialista padronizada e transportada de modelos. Para ele, não existe modelo, pois cada país vive suas particularidades e é nessa realidade que devem ser realizadas as ações para se melhorar a qualidade de vida do seu povo.
No Senado, Inácio promete ser vigilante com os projetos que são de interesse do Ceará e se mostra otimista com a eleição do novo governador do Ceará, Cid Gomes (PSB), fruto de uma aliança que teve como principais articuladores os partidos de esquerda o PCdoB, PSB e PT. Para ele, a parceria entre a Prefeitura de Fortaleza, o Governo do Estado a o Governo Federal vai trazer benefícios para o Estado. Em entrevista à revista Plenário, publicada pela Assembléia Legislativa do Ceará, Inácio fala mais sobre a sua eleição, o governo Lula e o Ceará.
Você é o primeiro comunista a ser eleito para uma cadeira no Senado Federal após Luís Carlos Prestes? No seu mandato, você irá se inspirar nessa figura emblemática para a história do Brasil?
Acho que no tempo de Luís Carlos Prestes, o Partido Comunista fazia muita política, fazia muitas ações e tinha muita firmeza nas posições. Ele defendi que o Brasil tem que ter o seu caminho, tem que ter o seu projeto, tem que ter a sua cara. Os comunistas naquela época tinham muito domínio da realidade brasileira, essa dimensão do que é a Amazônia, mesmo do que é o Nordeste. Agora, hoje ainda tem muita gente que confunde o que é o semi-árido cearense e o que é o semi-árido de Israel… Mas as experiências do mundo ensinaram também aos comunistas. Você tinha naquela época a idéia que se tinha um modelo de socialismo e você transportava aquele modelo de socialismo. E a realidade não é isso. Cada país tem a sua realidade. Nós queremos o avanço da nossa sociedade, mas nós temos as nossas particularidades. Nós precisamos de prioridades para as nossas particularidades. Nós desejamos uma sociedade socialista com a cara do Brasil.
O Governo Lula, do qual senhor é aliado, tem enfrentado vários casos de corrupção. O governo não está sendo inábil a enfrentar esses casos?
A direita é que fica colocando o foco na corrupção. A direita sempre deitou e rolou no Brasil, sempre comandando a economia, comandando o governo, mas eles perderam essa força neste setor. Mas a direita domina a mídia. Essa mídia é partidária. O Lula na eleição teve de enfrentar os partidos oficiais e também a mídia. E esse setor que apoia o governo não é dono de uma mídia própria para fazer um contraponto.
Mas não é uma decepção se descobrir caso de corrupção em um governo que sempre teve um discurso de ética e honestidade?
Pela primeira vez, agora no governo Lula, esses casos são colocados publicamente e, pela primeira vez, eles são investigados. Antes, isso tudo era colocado embaixo do tapete, tudo era abafado, tudo a mídia sabia. Essa mesma mídia sabia de tudo isso, mas escondia. E chegou a um ponto que o procurador geral da República era chamado de “engavetador geral da República” (Geraldo Brindeiro, quando procurador geral da República no segundo governo de Fernando Henrique Cardoso recebe esse apelido da imprensa por supostamente engavetar os processo de investigação de denúncias de corrupção que tinham como algo o Governo). Só isso já era para ser um escândalo, mas isso ficou só um apelido. Mas no governo Lula, não. Se a gente for olhar um pouco mais atrás, olhe o governo do Getúlio (Vargas, presidente do Brasil entre os anos de 1930 a 1945 e de 1951 a 1954), olhe o bombardeio que fizeram em cima do governo do Getúlio, se não é o mesmo? O governo do Kubitschek (Juscelino Kubitschek, presidente de 1956 a 1961) foi golpe em cima de golpe, golpe mesmo de Estado e a mídia em cima, batendo duro nele. Mas a mídia não destaca feitos do governo Lula como o transnordestina. Depois do governo Sarney (José Sarney, presidente de 1985 a 1990), só agora a obra teve início. O presidente iniciou, lá em Missão Velha (município a 444 quilômetros de Fortaleza), está em obras a transnordestina, que vai tirar um trem velho caindo aos pedaços de 30 km/h para ter um trilho onde o trem vai correr entre 90 e 160 km/h.
Então quer dizer que existe uma campanha de difamação do governo Lula?
O governo Lula tem essa particularidade: ele tem enfrentando esses problemas, fazendo com que as instituições que tenham a responsabilidade fiscalizar, o façam. Todos esses escândalos que estão sendo investigados pela Polícia Federal e Ministério Público, 90% tiveram origem em processos criados pela Controladoria Geral da União, criada pelo governo do Lula. O governo Lula contratou mais gente para a Polícia Federal, aumentou os salários, para dar mais tranqüilidade aos policiais federais. Isso aí é uma diferença grande entre o governo Lula e os governos passados, especialmente, o último governo que foram oito anos. Então, você tem uma coisa sendo tratada.
Qual vai ser a participação do PCdoB no Governo Lula? Você acha que você pode ser convidado para compor a equipe de Lula?
Não, eu acho que a minha responsabilidade é no Congresso Nacional, acho que eu devo contribuir ali no Senado da República, ali eu contribuo mais com o meu Estado, eu ajudo mais o Ceará, eu ajudo mais o meu próprio partido, eu ajudo mais o governo Lula.
Então, você está descartando caso haja um convite?
Não, também não posso descartar. Se for convidado, aceito com todo o prazer porque sei também que eu posso ajudar o meu País. Mas acho que ali, no Congresso, eu tenho condições de dar uma grande contribuição. É uma casa muito importante porque ali toda hora passam questões que são do interesse do Ceará.
Quais são esses projetos que você se compromete a defender no Senado?
Todos os grandes projetos de desenvolvimento do Ceará estão ligados à questão nacional. Então você veja: transposição de águas (do rio São Francisco) está ligada à questão nacional; a questão da transnordestina… Porque a transnordestina é um empreendimento privado mas tem duas estatais.
O metrô de Fortaleza é um grande empreendimento que ainda não foi concluído. No primeiro mandato do presidente Lula, o Metrofor ainda não foi concluído. Por quê? Não falta vontade política do Governo federal já que é ele quem libera as verbas?
O metrô de Fortaleza é uma empreendimento estadual, embora quem banque os recursos seja o Governo federal, quem repasse o governo seja o Governo federal. Então, é o Estado que precisa explicar o que é que ocorre. Por que vem tanto dinheiro e a obra não anda?
Então o dinheiro está sendo liberado e o Estado é que não está gastando?
Não, não é que não está gastando. O dinheiro quando entra…, existe alguma coisa que tem que ser explicada.
Mas o Estado sempre reclama que o dinheiro que chega não é suficiente para terminar a obra…
Bom, se não é suficiente, aí é outra coisa. Temos que saber o que está acontecendo com a obra que não é suficiente? Houve atraso na obra, alterou-se a obra, o que foi feito? Por exemplo, quando se começou a obra do metrô, não tinha ainda o Porto do Pecém. Eu estou aqui examinando o que ocorreu…. Quando surgiu o Porto do Pecém, você tem um novo brilho que surgiu, porque antes o transporte de cargas era feito todo dentro de Fortaleza, vinha até Parangaba, voltava por dentro de Fortaleza até a Estação João Felipe para sair pela Caucaia e pegar a Região Norte. E o que foi feito? Foi feito um desvio que sai do Mucuripe, entra na Parangaba, vai para Maracanaú e, lá, foi feito um desvio que vai para Caucaia e dali vai para o Pecém. Então foi feita uma nova malha ferroviária naquela região. Então precisa de todas essas explicações para dizer o que ocorreu… Durante esse período, as obras do metrô de Fortaleza ficaram em segundo plano, se priorizou fazer esse desvio.
Essa decisão então coube ao governo estadual?
Claro, quem conduz toda a obra é o governo estadual. Então, quem realizou todas as alterações no projeto foi o governo estadual.
Agora nós temos no Ceará, a Prefeitura de Fortaleza, Governo do Estado e Governo federal comandados por forças políticas aliadas. Essa hegemonia será positiva para o Ceará?
Nós temos um Governo do Estado que pode sentar com o Governo Federal e, sobretudo, também sentar com a Prefeitura, no que se refere a ela. O que ocorre? É porque a obra do metrô é uma obra cara e o Estado não tem como bancar. Ou a União banca ou você não tem a obra sendo realizada. E a União pensa: bom, essa obra não é minha, essa obra é de vocês, vocês querem pegar dinheiro a fundo perdido. Mas também não tem como ser de outra forma. Se não for a fundo perdido, a obra não será feita. Então, a União vai ter que bancar mesmo e o que a União não quer é que o Estado se endivide com essa obra nem force a União a se endividar. Mas se a União chancelar, o Estado pode tomar um empréstimo do Banco Mundial para tocar uma nova etapa do projeto. Também vamos chamar a Prefeitura de Fortaleza para conversar sobre isso. O metrô de Fortaleza também nasceu sem a presença da Prefeitura. Só no finalzinho do governo Juraci.
Quando se discutiu uma aliança dos partidos de esquerda em torno do nome de Cid Gomes para o governo do Estado, alguns nomes de esquerda se opuseram alegando que ele não representaria uma ruptura com o atual governo. O nome de Cid Gomes representará uma mudança no modo de governar o Ceará?
O centro dessa aliança política reúne PT, PCdoB e PSB. Essa já é uma mudança grande. Essas forças políticas chegam ao governo pela primeira vez no estado do Ceará. E esse governador, o Cid Gomes, está acompanhando pelo professor Pinheiro (Francisco Pinheiro, vice de Cid Gomes) de uma das alas mais à esquerda do PT. Acho que essa crítica perde muito essa energia. Acho que há um sectarismo forçado de afirmar que não há uma mudança.
O senhor começou sua vida pública sendo um homem de oposição e hoje está na situação. Com base na sua experiência, é mais fácil ser oposição?
É claro que é mais fácil fazer o discurso de oposição e é muito mais difícil você fazer o discurso de governo, defender as posições de governar. O governo contraria muitos interesses mais imediatos. No governo você tem que dizer não. Na oposição, você não precisa dizer não. No governo, você tem de dizer não porque o lençol está curto, você cobre um lado e descobre outro. Você sempre tem que negar alguma cisa. Você tem que fazer muito mais política sendo situação, ter muito mais habilidade na situação.
O PCdoB tem agora vereador, deputado estadual, deputado federal e senador. Como é que fica o processo de renovação de partido?
Uma grande mudança que está sendo discutida no PCdoB é que ele sempre ficou no parlamento. Nós temos que começar agora a pensar em governar e o Brasil está vivendo essa experiência. Então, a gente não pode ficar fora. Então, nas próximas eleições municipais, os comunistas cearenses têm a obrigação de disputar as eleições em vários municípios, se articular para disputar as eleições para várias prefeituras, participar dos governos municipais. Aqui no Estado do Ceará nós já participamos de alguns governos municipais e essas experiências são muito positivas e isso ajuda a formar também pessoas como quadros políticos que participam da gestão pública. Pois é isso que trata das coisas do povo. Só fazer discurso na tribuna, para falar, essa é a parte mais fácil, quero ver quem vai cuidar das coisas públicas. Então, o PCdoB tem essa obrigação de assumir mais obrigação.
Essa necessidade de disputar prefeituras inclui Fortaleza em 2008?
Não, porque nós temos uma parceria muito boa com a prefeita de Fortaleza, Luizianne Lins. Nós participamos da administração. Nós queremos é reelegê-la para que nós possamos continuar esse projeto aqui em Fortaleza. Ma nós temos 183 municípios restantes. Quem sabe a gente não disputa uns 20 ganha uns dois (ri). De repente, também disputar mais eleições para a Câmara de Vereadores. Acho que temos ainda muito espaço para ser ocupado.