Lição de uma vida que completa 90 anos

Perguntado sobre o que acha da exposição que homenageia seus 90 anos de vida, o escritor Júlio Romão sorri e diz que ''não acredita que fez tanta coisa''. A mostra aberta na galeria do Clube dos Diários exibe através de fotografias e documentos a trajetór

A exposição é apenas uma das muitas atividades previstas na homenagem a Júlio Romão. ''Em abril lançaremos toda a programação. A intenção é propagar a trajetória de luta do escritor pela cultura do Piauí e do Brasil'', conta o dramaturgo Ací Campelo, que coordena o evento. A exposição tem entrada franca e será levada para o Liceu Piauiense e universidades federal e estadual nas próximas semanas até maio, mês em que o escritor faz aniversário. Também fazem parte da programação seminários e palestras sobre a obra do homenageado.



ROMANCE DE SUCESSO – A vida do escritor piauiense por si só daria um romance de sucesso. Quando deixou a sua terra natal foi para o Maranhão, onde trabalhou como conservador de móveis. Aproveitando a passagem por São Luis de um navio cargueiro que transportava retirantes para a região sudeste, enfiou-se no porão da embarcação indo parar no porto do Rio de Janeiro.



''Cheguei sozinho, sem conhecer ninguém. Dormi com mendigos e morei em albergues'', lembra Júlio Romão, com uma memória de dar inveja e que dá conta de detalhes mínimos acontecidos há dezenas de anos atrás. Pouco depois de chegar à capital carioca, o piauiense consegue o primeiro emprego na área de limpeza em um escritório. ''Meu patrão era um senador da República muito rico. Ele não precisava trabalhar, mas ia ao escritório todos os dias. Era poliglota e conhecia a literatura. Foi ele que me inspirou''.


Negro, pobre e nordestino Júlio Romão decidiu abrir uma caminho diferente para si. Aproveitou todas as oportunidades que a vida lhe deu. E não foram poucas. Quando resolveu cursar o 2º Grau, o diretor da escola lhe deu uma bolsa de estudos comovido com a determinação do rapaz sem dinheiro. ''Sempre tive muita sorte'', sorri.



Esse foi o primeiro passo para chegar à Universidade do Brasil, por onde se graduou em Filosofia. Tempos depois, fez parte da fundação do Instituto Brasileiro Geografia e Estatística (IBGE), órgão em que trabalhou durante muitos anos.
 


PAIXÃO LITERATA – Paralelo ao serviço público, Júlio Romão dedicava-se a uma outra atividade que talvez seja a sua grande paixão. Escreveu 42 livros entre obras técnicas na área da estatística e ainda livros de comunicação, etnologia e para teatro. Dessa última área, o livro ''A Mensagem de Salmo'', escrito em 1967, no Rio de Janeiro, acaba de ter lançada a segunda edição no Piauí pela Lei A. Tito Filho – a primeira aconteceu em 1990, feita pela Academia Piauiense de Letras.



No período do lançamento da primeira edição no Rio de Janeiro, o autor foi agraciado com o título de Cidadão Carioca e virou nome de rua no bairro do Méier, tendo mudado depois para o bairro de Madureira.



''A Mensagem de Salmo'' inspira-se no simbolismo das parábolas de Cristo, enfatizando sua atualidade. Segundo Júlio, a peça teatral atraiu a ira da ditadura e ganhou uma versão cinematográfica no México.



Em Teresina, um decreto municipal oficializou recentemente sua inclusão na programação de espetáculos religiosos no Teatro João Paulo II, durante a Páscoa. A idéia foi inspirada na encenação da Via Sacra de Nova Jerusalém, em Pernambuco.



Essa é mais uma das homenagens ao escritor piauiense, que prestes a completar 90 anos no dia 22 de maio, revela que está tentando finalizar mais três livros. ''Não tenho medo de morrer. A morte é natural. Tenho medo é de ter uma doença e não poder mais produzir. Tenho medo é de viver morto'', finalizou Júlio Romão.


 


De Teresina,
Eugênio Rego


Publicado originalmente no Jornal Diário do Povo