UEE-SP vai à luta para recuperar autonomia universitária

Por Augusto Chagas, presidente da UEE-SP*
O Secretário de Ensino Superior do Estado de São Paulo, José Aristodemo Pinotti, disse à Folha de São Paulo que, de fato, as universidades Estaduais Paulistas precisarão de autorização do governador José Serra

Ao invés disto, o Cruesp (Conselho de Reitores das Universidades Estaduais Paulistas) se apressou em minimizá-la. Em nota publicada no site da USP na manhã desta mesma segunda-feira os senhores José Tadeu Jorge – reitor da Universidade Estadual de Campinas -, Suely Vilela – reitora da Universidade de São Paulo – e Marcos Macari – reitor da Universidade Estadual Paulista – nem citam as declarações e dizem alto e em bom som que tudo está resolvido: afirmam que “houve conversações e os entendimentos chegaram a bom termo”. Trata-se de uma grosseira tentativa de botar panos quentes na polêmica e de reduzir um debate que deve ser feito por toda a sociedade aos gabinetes do palácio dos Bandeirantes.



Em defesa da autonomia



A autonomia universitária há várias décadas está presente nos estatutos das universidades brasileiras mas ganhou garantia constitucional apenas em 1988. Foi em 1989, após muita luta e uma intensa greve, que as três universidades paulistas conquistaram esta prerrogativa. A partir dali, elas passaram a ter garantia sobre uma cota-parte do ICMS (principal imposto estadual), podendo gozar do direito sobre a execução do seu orçamento, viabilizando a autonomia administrativa e reforçando a autonomia didático-científica e a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.



Esta conquista é uma das razões para o sucesso das universidades. A partir dalí, elas se modernizaram, passaram a planejar o seu desenvolvimento, ampliaram em muitas vezes o número de matrículas oferecidas e sua produção científica – representam, juntas, 50% da pesquisa produzida em todo o país . A principal conquista desta prerrogativa, no entanto, está relacionada a independência da universidade aos governos. A garantia de recursos e de sua execução garante que as universidades paulistas conduzam seus caminhos com exclusiva visão acadêmica, baseada na sua democracia interna e na sua responsabilidade social. Possibilitou também, que as universidades tivessem uma garantia de financiamento podendo, ano a ano, lutar por expandir os seus recursos.



O Governo Serra e suas ingerênciasO ataque de José Serra começou ainda antes da sua posse formal. No dia 31 de dezembro o Governador Cláudio Lembo vetou o artigo da Lei de Diretrizes Orçamentárias do Estado que aumentava para 10,43% do ICMS a cota-parte para as universidades paulistas e que garantia sub-vinculação orçamentária para o Centro Paula Souza. Segundo palavras do ex-governador, “o veto foi feito a pedido do próprio Serra”.



Nos primeiros dias de governo, através dos decretos no. 51.460, 51.461 e 51.471, ele assina uma avalanche de medidas autoritárias: fragmenta a educação pública paulista em três secretarias diferentes ignorando qualquer vinculação entre elas; proibe a contratação de servidores e funcionários para toda a máquina pública, ignorando a autonomia das universidades; determina o contingenciamento de recursos por tempo indeterminado; demite a reitora da USP da presidência do Cruesp e nomeia o então empossado Secretário de Ensino Superior; anuncia que a partir de seu governo, as universidades terão que se enquadrar ao Siafem – Sistema Integrado de Administração Financeira para Estados e Municípios.



Após uma enorme reação que incluiu as entidades estudantis, de professores e funcinários, a SBPC, intelectuais e as próprias reitorias, o Governador declinou de algumas de suas intenções. De maneira no mínimo desastrada voltou atrás na composição do Cruesp (o Secretário Pinotti por várias vezes disse que não sabe quem demitiu a reitora da USP e o empossou como presidente do Cruesp: “– O Sr. não sabia? –- Não, nem o governador. –- Mas então quem fez? –- Foi a área burocrática, que achou que seria natural,…”), justificou o contingenciamento com a não aprovação da Lei Orçamentária pela Assembléia Legislativa do Estado e abriu mão da proibição da contratação de servidores.



Uma das principais polêmicas, no entanto, era tratada sob várias interpretações. A exigência de enquadrar os gastos das universidades ao Siafem (que já era feita anteriormente com periodicidade mensal) teria que se cumprir diariamente. A polêmica, gerada por declarações contraditórias por parte de integrantes do Governo Estadual, era se as universidades teriam garantida a sua autonomia de execução do orçamento ou se teria que se submeter a autorização do Governador para procedê-la.
As declarações do Secretário Pinotti são conclusivas: “Certos remanejamentos, que mudem dinheiro de um item econômico para outro… precisam da autorização do governador…”; “—Mas antes as universidades não precisavam de decretos? – Não, mas isso não é ruim… Suponha que haja um remanejamento maluco. Cabe ao Governador dizer não.”. Questionado se a gestão Serra pretende aumentar os recursos da educação ele respondeu categoricamente que não.



Por um posicionamento imediato das reitorias!



Está claro que a prerrogativa da autonomia universitária está sendo fortemente ferida pelo Governo do Estado. De maneira truculenta, sem nenhum tipo de debate público, constróem-se uma série de maneiras de interferir sobre os rumos das universidades. A principal delas é sobre a sua execução orçamentária e, diferente do que pensa o Secretário Pinotti, trata-se de questão muito grave a possibilidade de um governo avaliar o que seria um “remanejamento maluco” e ter a possibilidade de restringir orçamento conforme sua interpretação. Trata-se de ferir duramente uma conquista de quase 20 anos.



Os reitores das três universidades estaduais devem se pronunciar! Como representantes de suas comunidades acadêmicas esperamos que eles defendam os interesses das nossas universidades. O momento exige firmeza e não existe espaço para medidas diplomáticas que evitem desgaste.



Na luta por uma nova universidade



A defesa da autonomia das universidades estaduais não deve ser confundida com uma defesa incondicional da sua estrutura e dos seus rumos. A USP, a Unesp e a Unicamp ainda seguem uma lógica perversa da exclusão de uma enorme quantidade de jovens das suas salas de aula – apenas cerca de 1% dos jovens paulistas de 18 aos 24 anos tem acesso a uma vaga -. Seu funcionamento interno funciona de forma anti-democrática com a excessiva representação de docentes nas suas decisões – a USP sequer realiza cosulta direta para eleição do seu reitor e em nenhuma das universidades estaduais os estudantes representam mais de 15% dos colegiados -. Seus rumos ainda servem pouco aos interesses de nosso povo e da necessidade da construção de nossa nação.



A maior armadilha para a destruição das nossas universidades é fazer com que elas dialoguem pouco com o conjunto da sociedade. Se queremos que o povo paulista as defenda, precisaremos repensá-la para que esteja mais sintonizada com seus interesses. Por isso, a UEE-SP e a UNE permanecem na defesa da construção de um novo modelo, que garanta mais acesso e permanência e com mais democracia interna, e faz uma encisiva defesa do aumento dos investimentos públicos em educação, na expectativa da construção de um Brasil mais justo, desenvolvido e soberano.



De olho no inimigo: rumo ao Palácio!



O movimeno estudantil, bem como todo o movimento educacional deve se manifestar. Precisaremos de unidade e radicalidade para enfrentar tais medidas. Atividades como a ocupação por parte de estudantes da reitoria da USP precisarão se multiplicar. Precisaremos dialogar com o conjunto da sociedade, estrapolando os muros das universidades. Teremos que ir em direção ao Palácio dos Bandeirantes para pressionar Serra que revogue suas medidas e derrotar as suas pretenções de interferir nas universidades estaduais paulistas!



Uma coisa está clara: o debate não está encerrado. Com certeza não será através dos grandes veículos de comunicação que propagandearemos a nossa opiniaõ e que ocuparemos o nosso espaço de pressão. Pois que seja, portanto, as salas de aula e as ruas e avenidas de São Paulo!