Pesquisa revela crescimento do apoio popular a Evo Morales

Mais de 70% dos bolivianos aprova o processo de nacionalização dos hidrocarbonetos (gás e petróleo) impulsionado pelo governo do presidente Evo Morales, segundo os resultados de uma pesquisa divulgada neste domingo em La Paz.

A pesquisa de opinião pública da empresa Captura Consulting SRL, divulgada pelo diário El deber, revela que 73,6% da população aprova a política de nacionalização, enquanto que 17,9 por cento não a aprova.


 


Nas classes sociais mais baixas o apoio chega a 76,8%, enquanto que nos extratios médios a aprovação cai para 65,1%.


 


A pesquisa revela que a cidade de El Alto é onde há mais apoio para o processo de nacionaliação, com incríveis 90,6% de aprovação, em segundo lugar vem a capital boliviana La Paz com 78,2% de apoio e o terceiro lugar é o departamento de Santa Cruz (64,8%), onde se concentra a elite do país e onde há anos se trava uma luta separatista.


 


A pesquisa também perguntou aos bolivianos se a nacionalização aumentará o diminuirá o emprego no país. Do total de entrevistados, 69,3% opinou que irá melhorar e 20,1% que irá piorar.


 


Os mais otimistas são os homenss (73,3%) e as pessoas da chamada “classe baixa”, com 72,5% de respaldo.


 



Em busca do equilíbrio


 



Um dos “segredos” para manter a popularidade em alta, segundo analistas, é o fato de que Evo Morales fala duro contra o sistema capitalista e o imperialismo dos Estados Unidos, mas na prática comanda um governo bem mais moderado do que o seu discurso. “É com essa agenda ambígua que o presidente da Bolívia conseguiu aumentar sua popularidade no país, após quase um ano e meio de governo”, afirma o jornalista brasileiro Daniel Buarque, enviado à Bolívia para fazer uma série de reportagens especiais para o jornal O Globo.



 
Quando foi eleito, em dezembro de 2005, ele obteve 54% dos votos. Agora, as recentes pesquisas de opinião pública mostram que ele tem o apoio de 60% da população. 


 


Mas não é preciso recorrer às estatísticas para perceber que Morales, um ex-líder sindical rural, é bem visto pelo seu povo. Basta falar com as pessoas nas ruas para perceber que ele ganhou corações e mentes pelo país.


 


“Evo é presidente porque nós votamos nele. Mas não é ele que vai nos salvar. Nós é que nos salvamos na democracia”, explicou, sereno e confiante, o serigrafista Lorenzo Chayna, de 58 anos, abordado pela reportagem do G1 no centro de La Paz.


 


Na mesma linha de raciocínio, Boris Sanchez, um enfermeiro de 32 anos, comenta a polêmica política de nacionalização adotada por Morales -que resultou na venda de duas refinarias da Petrobras à Bolívia. “Nacionalizar não vai enriquecer a Bolívia, mas já ajuda. Evo é um bom presidente e está trabalhando muito para tentar melhorar a Bolívia.”


 


O enfermeiro Sanchez se refere à polêmica estatização das duas refinarias da Petrobras pelo governo boliviano, na semana passada, que marcou o ápice de um processo que vem ocorrendo há quase uma década: o aumento da dependência brasileira do gás produzido pelo país de Evo Morales.


 


Até mesmo o líder da oposição no Congresso, o deputado Peter Maldonado, de 31 anos, um dos lideres da frente “Unidad Nacional”, vê acertos nas políticas de Morales. “Aplaudimos quando o governo acerta, como está fazendo em relação à corrupção e aos projetos sociais, de saúde e educação, por exemplo. Mas temos sérias críticas à visão estatizante do presidente. Queremos desenvolver a economia, e para isso achamos que não precisamos abrir demais para o capitalismo nem fechar demais nas estatizações”, afirmou Maldonado.


 



Os críticos



 
Para os críticos, incluindo os políticos que fazem movimentos separatistas no interior do país, Morales está adotando um estilo populista semelhante ao de seu amigo e padrinho político, o venezuelano Hugo Chávez.


 


Quem defende esse raciocínio, como o deputado Maldonado, cita promessas feitas pelo presidente que não foram cumpridas. “As pessoas mais pobres, do campo, se iludem com o circo de propaganda de Evo. Um dia ele falou na rádio que vai cobrar visto para os norte-americanos que vierem à Bolívia, mas nunca levou a proposta a sério. O problema é que a população mais pobre não sabe que é só discurso, e fica achando de que fato os gringos precisam de visto para entrar aqui.” 


 


Há um outro exemplo recente, e esse diz respeito ao Brasil. Antes de comprar as duas refinarias da Petrobras que operam na Bolívia, Morales afirmou que se ele fosse presidente do Brasil, “daria de presente à Bolívia, sem pedir indenização, as duas refinarias de petróleo”. No final das contas, pagou US$ 112 milhões.


 


“Evo é uma boa pessoa, bem-intencionada, mas o maior problema é que seu governo tem mais alarde de que ação, virou um circo de discurso midiático que muita vezes não tem nenhuma relação com a administração pragmática que está fazendo no país”, afirmou Maldonado.


 



Relação com a mídia


 



Já os apoiadores de Morales dizem que sua força se dá como resultado de programas que melhoram a qualidade de vida dos bolivianos. “Estamos falando de um quadro de pobreza absoluta, na qual ele de fato atuou”, disse ao G1 Luis Gómez, mexicano fundador da ONG boliviana Ukhampacha, criada para monitorar a mídia no país. A Bolívia é o país mais pobre do continente: tem 64% de sua população abaixo da linha da pobreza.


 


“A classe média, as pessoas da cidade, ainda não sentiram tanta diferença em suas vidas, é algo que deve acontecer no longo prazo. Mas no campo, sim, já há avanços”, admite Maldonado, o líder oposicionista.


 


Seja apenas um administrador pragmático, como diz a oposição, ou o homem que vai tirar os bolivianos da miséria, como defendem outros, o fato é que sua presença quase onipresente na mídia e seus inflamados discursos exercem uma enorme influência entre os bolivianos.


 


O rosto do presidente Evo Morales está nas ruas de La Paz, nos jornais, dezenas deles, de todo o país, e que se vendem em todas as esquinas. Morales é personagem central do noticiário que é acompanhado de perto por uma população bem informada e ávida por notícias, muito mais que por escândalos.


 


“A Bolívia é um país muito politizado. Chega a ser surpreendente a quantidade de jornais para uma população tão pequena [cerca de 9 milhões]. Todo mundo entende de política”, disse o argentino Oswaldo Coggiola, professor de história na USP, entrevistado pelo G1 na semana passada, em São Paulo.


 


O fato de haver muitos jornais e de o rosto do presidente, normalmente tratado apenas pelo primeiro nome, estar estampado não quer dizer, entretanto, que ele tenha o apoio de toda a mídia. “Muito pelo contrário. Quase toda a mídia boliviana é propriedade dos grandes empresários, que usam os jornais para defender seus interesses”, disse Luis Gómez, da ONG Ukhampacha.


 


“As pessoas confiam em Evo, tanto que o colocaram no poder, mas ninguém se engana de achar que ele vai salvar o país. Não tem essa de salvador, e se ele não fizer o governo que se espera dele ele perderá esta confiança da sociedade”, disse Jean Friedman-Rudovsky, norte-americana e co-fundadora da ONG Ukhampacha.


 


Maldonado, o deputado oposicionista, divide a sociedade boliviana em três grupos: os pobres, que sempre votam na esquerda, não são tão bem informados e que acreditam, sim, na idéia do presidente salvador; os ricos, que querem apenas defender seus interesses econômicos e não têm nenhuma preocupação social; e a classe média, que é bem informada, tem visão crítica, mas não acredita em salvação.


 


Para o deputado, Evo Morales está correndo um grande risco político ao priorizar o campo em detrimento de ações que beneficiem a população urbana. “Ele pode perder o apoio decisivo desse grupo urbano, que compõe a classe média.” Outro risco na sua visão é a insistência do presidente com sua reeleição. “Ele está perdendo mais tempo tentando garantir que a nova Constituição permita a reeleição do que realmente governando o país. Morales se vê como um salvador da pátria. E isso é um risco grande para seu futuro político”, diz Maldonado.


 


Futuro incerto


 


Num país de história política conturbada como a Bolívia, onde os caudilhos militares governaram por mais tempo que civis eleitos democraticamente, e governos de esquerda e de direita alternaram políticas opostas (incluindo a nacionalização do petróleo, que depois voltou a ser privatizado), é difícil apontar o futuro da política. 


 


“É até possível que amanhã haja outro golpe de Estado que tire Evo do poder”, disse o mexicano Luís Gómez, da ONG que monitora a mídia boliviana. “Dificilmente um governo ditatorial sobreviveria neste momento, mas tudo é possível”, completou.



 
Já o deputado Maldonado se mostra mais otimista. “Eu sinto a necessidade de ser otimista. O país já chegou à beira do precipício muitas vezes. É hora de melhorar a situação, e vejo condições para isso.”



Da redação,
com informações do G1 e Prensa Latina