Presidente do Parlamento do Mercosul pede agilidade na integração regional

O novo presidente do Parlamento do Mercosul, o deputado uruguaio Roberto Conde, defende a agilidade do processo de integração regional como condição fundamental para o desenvolvimento da América do Sul.

Conde assumiu o cargo no último dia 25 de junho, em Montevidéu. Ele substitui o senador paraguaio Alfonso González Nuñes. Seu mandato de seis meses coincide com o da presidência temporária do Mercosul, que passou do Paraguai para o Uruguai neste segundo semestre.



No dia seguinte, Conde concedeu entrevista à TV Senado, em Montevidéu, ocasião em que falou dos planos para dar prosseguimento à implantação do parlamento, principalmente com a aprovação de seu regimento interno – já na sessão marcada para 30 de julho –, da necessidade de acelerar o processo de integração e do papel da nova instituição parlamentar, que começou a funcionar este ano, nessa empreitada.



Roberto Conde também comentou o episódio do fechamento da emissora de televisão RCTV pelo governo de Hugo Chávez, na Venezuela, e o incidente com o Senado brasileiro, que aprovou moção pedindo a revisão da decisão e foi chamado pelo presidente venezuelano de “papagaio do Congresso americano”. O ingresso da Venezuela no Mercosul precisa ser ainda aprovado pelo Congresso Nacional brasileiro, assim como o paraguaio. Conde diz ter “confiança na grande sabedoria que há no sistema político brasileiro para avançar sobre as dificuldades conjunturais em direção aos objetivos estratégicos”, no sentido de superar o conflito com Chávez.



Ele também observa que Chávez é um presidente legítimo e que não cabe invocar o Protocolo de Ushuaia para barrar a entrada da Venezuela no bloco. O protocolo diz que “a plena vigência das instituições democráticas é condição essencial para o desenvolvimento dos processos de integração entre os Estados partes”.



O fato de o Uruguai ser a sede do Parlamento do Mercosul e estar na presidência do bloco pode ajudar a impulsionar as atividades da instituição?
Eu creio que sim, que temos que assumir este compromisso de dar impulso inicial, porque é uma experiência nova, estamos começando os trabalhos do parlamento, e o impulso inicial é muito importante. Queremos instalar todo o necessário para que funcione com eficácia, nestes seis meses, e também começar a analisar os temas mais importantes da integração. O parlamento é um fenômeno complexo. Há mais de 20 partidos políticos representados nele. E estamos começando a conhecer os estilos parlamentares dos distintos países. É um parlamento com ambições de funcionar séria e eficazmente, e, no meu modo de ver, é um cenário privilegiado para analisar os problemas da integração.



Como o senhor crê que vão se agrupar os parlamentares: por tendências ideológicas ou por nacionalidades?
Das duas maneiras, dependendo um pouco dos temas. Há temas que vão fazer com que as delegações cheguem a uma posição nacional. Nos primeiros tempos ainda haverá muitas delegações que atuarão em função do interesse nacional, porque as posições ou as tendências ideológicas têm que dar lugar. Eu creio que não se deve apressar ou se precipitar. Na América Latina não é como na Europa, em que, apesar de serem quase 800 parlamentares, os blocos políticos e ideológicos são nítidos, são quatro ou cinco grandes blocos. Aqui há ainda uma fragmentação de partidos e tendências políticas, na América Latina, muito grande. Ninguém pode ainda falar com muita clareza como seriam os alinhamentos ideológicos. Ainda que, sem nenhuma dúvida, haverá uma tendência de parlamentares de distintos países em determinados pontos ou temas. Estou seguro que, em muitos temas, os parlamentares vão se agrupar não por países, mas em função de sua maneira de ver essa temática, e é claro que isso influi nas tendências ideológicas.



Qual será a agenda prioritária do parlamento nestes seis meses?
Parece-me que o título da agenda deveria ser “como contribui o Parlamento do Mercosul para aprofundar o processo de integração?” Aqui no Uruguai surgiu um debate muito interessante sobre se a integração no Mercosul deve flexibilizar-se ou aprofundar-se. Eu creio que o caminho é aprofundar a integração, tomar medidas que há dez, cinco anos, vêm-se discutindo, mas que não terminam de se concretizar. Quando essas medidas, essas decisões, se concretizarem, o Mercosul se transformará em uma realidade irreversível. Ninguém mais estará pensando se no futuro o Mercosul se consolidará ou não se consolidará. Agora é o momento de consolidá-lo. Nossos países já estão maduros, já têm uma história de integração suficientemente rica para avançar de um modo definitivo. Então tem de se aplicar o programa de [reduzir] assimetrias, conseguir aplicar o código aduaneiro comum, encontrar formas de distribuição clara da renda aduaneira, seguir aprofundando os regulamentos de política de fronteira, avançar na coordenação macroeconômica – por sorte se está avançando muito bem na constituição do Banco do Sul –, impulsionar os projetos de investimento em infra-estrutura, de integração energética – agora já estamos preparando a interconexão de uma rede elétrica entre Uruguai e Brasil, que é vital para o crescimento do Uruguai. Enfim, há uma quantidade de temas que estão bem planejados, mas que, na hora de levá-los à prática, se avança com demasiada lentidão. Se formos capazes de acelerar um pouco o passo nos próximos dois anos, eu creio que poderemos assistir a algo que poderia chamar-se “a consolidação definitiva do Mercosul”. E o parlamento tem de ajudar, tem de colocar esses debates, ordenar a informação, dialogar com as demais instituições do Mercosul, com os governos, com os cidadãos, fazer propostas, em suma, ajudar a avançar mais rápido.



Um ano atrás, o senhor disse que faltava base material, que faltava comércio, no Mercosul. Estamos conseguindo construir essa base?
Nesse ano, creio que houve avanços nesse campo. Continuou a crescer o comércio intra-regional. Foram colocados em funcionamento o Fundo de Convergência Estrutural, para impulsionar alguns projetos de infra-estrutura e projetos fundamentais de trabalho social, e estamos a ponto de conseguir a aplicação definitiva do código aduaneiro. Houve também um aumento nos investimentos dentro do bloco. Creio que não houve avanços espetaculares, porém o caminho é de progresso. De qualquer forma, o ponto-chave que tem de melhorar é a livre circulação de bens, de capitais e de pessoas, em que costumam aparecer travas. Tem de se garantir o acesso dos países pequenos aos mercados e tratar de levantar eficaz e rapidamente as travas para a circulação de bens dentro do bloco. Esse é talvez o problema mais difícil que temos nisso que chamo de “avanço material” da integração, que é a integração econômica.



No que se refere à agenda política, seguramente o tema da Venezuela vai ser discutido. Como tratar essa questão?
Nós temos que tratar esse assunto com o particular cuidado de não cometer uma intromissão nos assuntos internos do estado venezuelano, tendo em conta que a decisão do governo venezuelano sobre a não-renovação do contrato do grupo de explorava a concessão da Radio Caracas Televisión [RCTV] é uma decisão legal. Está amparada pelo ordenamento jurídico vigente na Venezuela, pelo estado de direito. De forma que esse assunto tem de se tratado no Poder Judiciário venezuelano. O governo da Venezuela não cometeu nenhuma violação do estado de direito. Portanto, não se pode invocar o tratado de Ushuaia, porque este se aplica quando um país rompe o estado de direito, e não é o caso dessa situação na Venezuela. Pode-se estar de acordo ou não do ponto de vista político com a decisão que o governo venezuelano tomou. E, do ponto de vista político, isso depende da visão que tenha cada partido.



O senhor acredita que o fechamento da RCTV e o mal-estar com o Senado brasileiro poderão dificultar ou impedir a aprovação do ingresso da Venezuela pelo Paraguai e o Brasil?
Aí você introduz outro tema, que são as expressões, eu diria diminutórias, não sei se ofensivas, porque não creio que houve vontade do presidente [Hugo] Chávez de ofender o Senado do Brasil. É um presidente legítimo, democrático. Não creio que tenha ele a vontade de ofender uma instituição tão importante na América do Sul como o Senado do Brasil. Porém as suas expressões foram claramente diminutórias. Bem, compete ao Senado do Brasil analisar essa situação, posicionar-se ante ela, pedir as explicações ou as desculpas que os senadores creiam que têm de pedir, mas me parece que isso não deve ser obstáculo para analisar os temas de fundo. Esse incidente é uma questão conjuntural, enquanto o ingresso da Venezuela no Mercosul é uma questão estratégica, parte de uma construção histórica de grande perspectiva. Temos que ter a sabedoria de ir superando incidentes conjunturais para ir avançando no caminho histórico, no caminho estratégico. Eu creio que no sistema político do Brasil há muita sabedoria para compreender essas coisas. Mas é um assunto interno do Senado do Brasil, ao qual eu respeito extraordinariamente, e não compete a mim opinar. Mas tenho confiança na grande sabedoria que há no sistema político brasileiro para avançar sobre as dificuldades conjunturais em direção aos objetivos estratégicos.



E o Parlamento do Mercosul poderá ajudar a convergir opiniões neste sentido, não?
Sem dúvida é parte de seu papel. Não temos nenhum temor em discutir esses temas [como o da Venezuela]. Ao contrário, se discutimos os temas difíceis e se conseguimos nos entender, é um grande avanço na construção de consensos políticos e da confiança política.



Com relação ao regimento interno do Parlamento do Mercosul, na terceira sessão do parlamento, o Paraguai enviou apenas três representantes e não houve condições de votar a proposta. O senhor crê que se poderá votar o regimento na próxima sessão, em 30 de julho?
Ainda que não se tenha podido votar, houve um avanço, que foi a distribuição de uma primeira proposta, que tem uma grande quantidade de artigos que já estão acordados, e umas 14 ou 15 emendas, que ainda se têm de discutir. Para mim, é um avanço que, depois de alguns meses de trabalho da comissão [encarregada de formular a proposta], todos os parlamentares tenham hoje um mesmo texto básico, muito próximo do final, faltando somente uma etapa final de discussão. Assim, creio que, na próxima reunião, estaremos em condições de aprovar o regimento, que é o documento fundamental para o trabalho interno, porque ali está o sistema de garantias para a tomada de decisões.



E como se fará para evitar a falta de quórum em outras sessões?
Eu manterei contato com os presidentes de cada uma das seções regionais para assegurar o quórum. Todos são conscientes da importância do regimento.Assim, todos farão um esforço para assegurar o quórum na próxima sessão.



Fonte: Agência Senado