Antonio Capistrano:UNE, 70 anos de luta

“A UNE veio para unir”. No inicio dos anos sessenta esse era o lema da União Nacional dos Estudantes. Desde sua fundação a UNE vinha realizando um extraordinário trabalho na articulação, mobilização e união da classe estudantil. O Brasil tinha um débito m

A UNE-Volante saiu por todo o país levando através das manifestações artístico-culturais um apelo para o engajamento de todos na luta pelas transformações estruturais, ponto basilar na construção de um país desenvolvido e socialmente justo, sem exclusão. Era a arte como instrumento de luta a serviço do povo. A UNE engaja-se no projeto das reformas de base do governo João Goulart. Luta pela reforma agrária, vai para ruas com projetos artístico/culturais, ocupa as praças, os ginásios, os cinemas, os teatros. A UNE-Volante é um momento mágico, belo, revolucionário, na vida do nosso país.


 


 


            Às vezes fico imaginando como seria o Brasil se não tivesse ocorrido o golpe militar de 1964. Pelo caminhar, na época, do processo de conscientização política o nosso país, hoje, seria, com certeza, diferente. Um país desenvolvido, com uma distribuição de renda justa, as reformas de base teriam sido feitas, o êxodo rural não teria ocorrido da forma que ocorreu, a dependência do capital estrangeiro não teria levado a nossa divida externa a uma situação de submissão aos interesses do neoliberalismo, com isso aumentando à miséria, a desigualdade, a violência, o analfabetismo. Hoje, o Brasil seria, com certeza, outro país.  


 


 


            Desde sua fundação (1937) até o golpe militar (1964) a UNE realizou um trabalho de conscientização política excelente, não só dos estudantes universitários, mas, também, da massa de trabalhadores, urbanos e rurais.  O CPC, que era o braço cultural da UNE, sob a coordenação e a orientação de Oduvaldo Vianna Filho (o Vianinha) espalhou-se por todo o país. Momento rico da história do movimento estudantil, momento esse que tive a felicidade de participar como integrante do CPC/RN, isso sob a influência do Partido Comunista.


 


 


Foi no movimento cultural da UNE, através do CPC, que surgiram, nos anos sessenta, os maiores nomes do teatro, do cinema e da música popular brasileira. O CPC era um celeiro de talentos, todos engajados na luta pelas transformações necessárias para o desenvolvimento pleno do nosso país.


 


 


Para se ter uma idéia da dimensão do CPC – além de Vianinha, tínhamos: Gianfracesco Guarnieri, Arnaldo Jabor, Carlinhos Lira, Nara Leão, Odete Lara, Cláudio Coutinho, Sérgio Ricardo, Geraldo Vandré, Raul Cortez, Carlos Castilho, Marcos Farias, Cacá Diegues, Joaquim Pedro de Andrade, Augusto Boal, Carlos Vereza, Sérgio Cabral, Glauber Rocha, Milton Gonçalves, Francisco Milani, Luis Carlos Maciel, Carlos Estevam Martins, Ferreira Gullar, Paulo Pontes e mais um grande número de jovens que se transformaram em profissionais talentosos nas diversas atividades artísticas e culturais do nosso país. Dessa turma, quem não era filiado ao Partido Comunista era simpatizante.


 


 


            Foi do CPC, Centro Popular de Cultura, que saiu a idéia da criação da serie “Cadernos do Povo Brasileiro”, uma coleção a preço popular, com temas como, “Por que os ricos não fazem greve”, de Álvaro Vieira Pinto, “O que é a Constituição Brasileira”, de Osny Duarte Pereira. Outro livro dessa coleção que fez muito sucesso foi, “Um dia na vida de um Brasilino”.  Nesse mesmo período foi lançada, sob a coordenação de Moacyr Felix e a inspiração de Vianinha a coleção “Violão de Rua”, com poetas engajados nas lutas populares. Fazia parte desse grupo, entre outros: Afonso Romano de Sant’Anna, Ferreira Gullar, Geir Campos, Paulo Mendes Campos e Félix de Athayde. Momento efervescente, político e culturalmente, com uma participação extraordinária da juventude.


 


 


            Na sessão solene do senado, em homenagem aos setenta anos da fundação da UNE, realizado no dia 06 de julho último, quando da fala do senador comunista Inácio Arruda, me emocionei. Primeiro pelo belo e analítico discurso do bravo camarada cearense, falando sobre a trajetória dessa histórica e importante entidade estudantil. Segundo pela lembrança dos anos sessenta, dos jovens que lutavam pelo sonho de um mundo justo, socialista e democrático. Terceiro pela citação do CPC como importante braço cultural da UNE, ressaltando o nome de Oduvaldo Viana Filho, figura que merece todas as homenagens do povo brasileiro pelo que representou como homem dedicado as artes cênicas, a cultura, às liberdades democráticas, ao socialismo, era um verdadeiro um comunista.


 


 


            Faz-se necessário, que agora, sob presidência de Lúcia Stumpf, uma jovem militante comunista, a UNE retome o grande movimento político/cultural que foi o CPC – Centro Popular de Cultura, claro, dentro de um novo contexto, tendo as manifestações artístico/culturais como um instrumento de conscientização política.


 


 


 


 


Antonio Capistrano – foi membro do CPC-RN. É do Partido Comunista desde 1960, ex-reitor da Universidade Estadual do RN, ex-deputado estadual; ex-vice-prefeito de Mossoró; Presidente do Comitê Municipal do PCdoB de Mossoró.