Caso Quartim de Moraes: Arruaceiros da internet
Por José Carlos Ruy
Os nazistas ficaram famosos, nas décadas de 1920 e 1930, por mobilizar bandos de arruaceiros para bater em democratas e comunistas; em usá-los para invadir seus comícios e dissolvê-los na base da pancadaria. É
Publicado 23/08/2007 11:48
Neste particular, o manifesto ''Solidariedade a João Quartim de Moraes'' (que pode ser consultado aqui) está sendo cenário para uma inovação: os batepaus fascistas entraram nele em bando para emporcalhar a lista e tentar inviabilizá-la – da mesma forma como as tristemente célebres tropas de choque do nazismo, as AS (sturmabteilung) e SS (schutztaffel) e seus desordeiros de camisas pardas ou pretas, invadiam comícios daqueles que resistiam ao avanço do nazismo e lutavam contra ele.
Até a manhã da quinta-feira, dia 23 de agosto, a lista em solidariedade a Quartim de Moraes apresentava 1.016 nomes, entre eles 158 que se escondiam sob o anonimato para escrever insânias raivosas contra o professor, a esquerda e particularmente os comunistas. E havia 21 que entraram na lista apoiando o acusador do professor marxista, o autointitulado filósofo O. de Carvalho. Isto é, havia 179 assinantes que entraram na lista para criar confusão.
A lista de obcenidades escritas sob o confortável e covarde anonimato é extensa e, em nome das boas maneiras, não deve ser reproduzida. Os apelidos usados pelos arruaceiros da internet indica uma raiva anti-comunista extrema e um saudosismo militante dos tempos do DOI-Codi e das sessões de tortura e assassinato praticadas nos porões da ditadura militar de 1964. ''Sílvio Frota'', ''Fleury'', ''CCC'', são algumas dessas alcunhas. Elas lembram o general linha dura que não se conformou nem mesmo com a linha de ''abertura lenta, gradual e segura'' do general Geisel, de quem foi ministro do Exército, e tentou dar um golpe militar para manter o regime de tortura e medo. Terminou afastado do ministério por Geisel, no final de 1977, mas deixou muita saudade entre os torturadores e assassinos da ditadura. O delegado Sérgio Paranhos Fleury foi o célebre perseguidor de todos aqueles que lutavam contra a ditadura, responsável pela tortura e morte de muitos heróis do povo brasileiro. E o CCC foi o Comando de Caça aos Comunistas que, das décadas de 1960 e 1970, foi uma espécie de braço civil da repressão política, famoso por agressões contra estudantes, artistas e oposicionistas. No outro extremo da baixaria, um dos apoiadores de O. de Carvalho assina-se como ''Pênis de 30 cm''… E há outro que, no campo onde a lista pede a atividade profissional do assinante, define-se como ''torturador do DOPS''.
A lista em apoio ao professor João Quartim de Moraes foi uma reação democrática contra acusações levianas feitas por O. de Carvalho em dois artigos publicados em fevereiro. Neles, acusa Quartim de Moraes como ''mandante do assassinato do capitão americano Charles Chandler'' e afirma que, ''na falta de realizações intelectuais, o homicídio político é uma glória curricular'' do professor marxista (Jornal do Brasil, 8.2.2007). No outro, refere-se explicitamente a uma entrevista de Quartim de Moraes para a revista Princípios, reproduzida depois no portal Vermelho. Ele incomodou-se particularmente com a seguinte frase da entrevista: “perante a memória histórica do povo brasileiro, cometeríamos a pior das infidelidades à memória de nossos mortos se consentíssemos em pagar, pelas boas relações com os militares de hoje, o preço do esquecimento dos crimes cometidos pela ditadura” (Diário do Comércio, 6.2. 2007).
Não se pode negar que O. de Carvalho seja consequente em seu devaneio direitista. Ele defende os torturadores e assassinos da repressão política de 1964 e tenta insuflar os militares de hoje para ações semelhantes, que os oficiais já não aceitam. Acusa diretamente o general Andrade Nery e o brigadeiro Sérgio Ferolla de ''ódio anti-americano'' (Jornal do Brasil, 8.2.2007) e de serem os ''primeirões na fila à espera de uma oportunidade de servir sob o comando do general Hugo Chávez na grande guerra patriótica contra o imperialismo ianque'' (Diário do Comércio, 6.2. 2007).
Além disso, recrima a Unicamp por ter criado, sob inspiração de Quartim de Moraes, o ''Núcleo de Estudos Marxistas”, e de ter recusado a sugestão feita por ele de formação, naquela universidade, de um ''Núcleo de Estudos Anti-Marxistas''!
A luta de classes, no campo das idéias, é sempre tão incisiva quanto na sociedade e na política. É o campo em que as insânias da direita são combatidas e derrotadas. Mas é preciso ressaltar a novidade que a ação dos desordeiros da internet significa. Ela mostra que eles não vão para o combate de peito aberto, ao contrário do que fizeram, no passado, seus comparsas das SA e das SS que, pelo menos, corriam o risco de receber de volta os golpes que desferiam contra democratas, comunistas e trabalhadores. Estes, não. Ocultam-se atrás de apelidos raivosos, indecentes e que revelam a covardia e a indigência intelectual de seus autores. Falam em debate, mas pregam a mentira, a tortura e o assassinato político, quando pregam alguma coisa. Na maior parte das vezes, ficam apenas nas palavras chulas, nos xingamentos de baixo calão, próprio das latrinas que frequentam.
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