Após STF, oposição tenta surfar na onda do ''mensalão''
Diante da opção do governo pelo silêncio e do PT pelo conformismo em relação à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de processar criminalmente 40 pessoas supostamente envolvidas no chamado ''escândalo do mensalão'', sobrou espaço para a oposição,
Publicado 29/08/2007 18:37
Lideranças do governo e do PT deram de ombros para a decisão do STF de aceitar a denúncia contras as 40 pessoas acusadas pela Procuradoria Geral da República por suposto envolvimento no chamado ''esquema do mensalão'' que, vale ressaltar, até agora não foi comprovado e há dúvidas sobre se realmente existiu da forma como a mídia e a oposição o pintaram.
As poucas lideranças diretamente envolvidas na questão que se pronunciaram sobre a decisão do STF se limitaram a dizer que foi uma decisão injusta. Em sua única e discreta manifestação, o ex-ministro José Dirceu disse que é réu de um processo sem provas. Já o deputado José Genoino (PT-SP), que também passou a ser réu no processo aberto pelo STF, tem buscado apresentar sua defesa pessoal com tecnicismos jurídicos sem entrar no mérito da disputa política que envolve todo o episódio.
Outras lideranças, não diretamente envolvidas, mas politicamente interessadas no desfecho do caso, como o presidente nacional do PT, Ricardo Berzoini, além de dizer que falta sustentação às denúcnias, apenas comentou que a decisão do STF é preliminar e faz parte do processo democrático. ''O acatamento da denúncia é uma decisão preliminar, que abre o processo judicial no qual a acusação tem que apresentar provas robustas e a defesa apresenta sua contestação. Não nos cabe debater minúcias da decisão. Apenas reafirmar que a acusação original de compra de votos continua carente de sustentação, principalmente quando se vê o então presidente da Câmara e o então líder do governo entre os processados por corrupção. Teriam eles algum motivo para vender seus votos? Mas o importante é encarar isso como parte do processo democrático e acreditar que, no julgamento do mérito, seja feita a mais absoluta justiça'', disse Berzoini em entrevista publicada no site do PT.
As declarações de Berzoini acabam reforçando o discurso da mídia de que o STF fez um julgamento idôneo e sem pressões —aliás, vale observar que nunca antes na história deste país o STF foi tão elogiado pela mídia dominante como está sendo agora. Mas os advogados de defesa dos acusados e vários analistas independentes avaliam que muitos ministros do Supremo, mesmo não concordando com os argumentos da acusação, aceitaram as denúncias para dar uma satisfação à opinião pública manipulada pela imprensa. A matéria do jornal O Globo expondo mensagens eletrônicas trocadas entre dois integrantes do STF foi reveladora desta pressão que a mídia exerceu sobre os magistrados.
Dentro do governo, a ordem é evitar dar opinião para ver se o assunto morre. Ainda assim, o ministro Luiz Dulci (Secretaria Geral) arriscou uma avaliação que coincide com a argumentação que vem sendo usada pela base de que o governo não tem nada a ver com isso. ''O governo já foi julgado nas urnas democraticamente e recebeu uma aprovação consagradora do povo brasileiro. Esse é o julgamento. Na democracia quem julga politicamente não são as pessoas, ainda que as opiniões sejam todas respeitadas. Quem julga na democracia é o povo soberano, e o povo soberano reelegeu consagradoramente o presidente Lula'', disse o ministro.
Indagado se as decisões do STF deverão integrar a pauta do 3º Congresso do PT neste final de semana, em São Paulo, Dulci disse que o partido discutirá assuntos que interessam à maioria da população, como inclusão social e geração de emprego. “É compreensível que a oposição queira impor sua pauta ao PT, mas é compreensível também, e desejável, que o PT discuta os problemas que interessam à maioria da população. Condição de vida, qualidade de vida, inclusão social, geração de emprego, esses são os problemas que interessam à maioria da população. Se tem um processo aberto pelo Supremo, que ele tramite que as pessoas tenham pleno direito de defesa, e no momento oportuno, a Corte tomará sua decisão”, disse.
Fora o ministro Luiz Dulci, nenhuma outra autoridade do governo –até o momento em que esta matéria foi publicada– se pronunciou.
Diante desta opção do governo pelo silêncio e do PT pelo conformismo, sobrou espaço para a oposição, generosamente auxiliada pelo partido da mídia, difundir a sua versão de que o STF colocou o ''governo no banco dos réus''.
É com esta tese que a direita golpista pretende ressuscitar o clima de escândalo nacional que acuou o governo em 2005 e no início de 2006. Se a estratégia funcionar, não tardará para que vozes menos risíveis que a de Roberto Jefferson venham a público pedir a cabeça do presidente Lula. A mídia já está eufórica com esta hipótese, tanto que desde o início da semana a pauta prioritária dos editores de política nas redações dos principais veículos da grande imprensa é buscar quem se disponha a confirmar a avaliação de que o ''rei está nu''.
É para concretizar esta pauta que a mídia abriu seus microfones para que cardeais tucanos como Fernando Henrique Cardoso, Geraldo Alckmin e Tasso Jereissati declinassem suas sentenças de condenação sumária ao governo.
Ontem, o presidente nacional do PSDB, Tasso Jereissati, deu a senha para o discurso. Segundo ele ''todo'' o governo e a antiga cúpula do PT estão no banco dos réus. ''Mas, ao mesmo tempo, todos esses homens estão por aí, trabalhando por aí, exercendo influência dentro do governo. Isso vai ficar dessa maneira?'', criticou. Para Jereissati, o mesmo sistema que levou ''à formação dessa quadrilha'' continua em vigor. ''Se vota em troca de cargos. Se vota em troca de emendas que não são prioritárias. Se troca de partidos. Se forma todo um processo de corrupção, que vai comendo toda a estrutura do Estado'', acrescentou.
Hoje (29), foi a vez do ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin bater na mesma tecla. ''É o governo Lula quem está no banco dos réus. Isso é óbvio, pois tudo aconteceu dentro do governo'', disse Alckmin, após participar hoje de evento que discutiu o voto distrital, na capital paulista.
Segundo Alckmin, o STF acende ''esperança de mudar o quadro de desencanto e desalento que perpassa por toda a sociedade''.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso também foi convocado a desancar o governo. Em declaração a jornalistas, disse que o presidente Lula parece mostrar conivência com a corrupção ao não repudiar os ex-colaboradores que protagonizaram o ''escândalo do mensalão''.
FHC disse que a decisão do STF mostra que há alguma coisa grave. Acrescentou que, frente a essa gravidade, o chefe de Estado não pode seguir dando a entender que não tem nada a ver com a situação. ''Não estou dizendo que ele seja responsável, mas, enquanto não manifestar seu repúdio, está dando a sensação de conivência, ou de lenidade, para utilizar uma expressão mais branda'', afirmou o ex-presidente.
Bem menos polido, o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) rasgou o verbo e foi direto no ponto. Para ele, o julgamento mostrou que Lula deveria ter enfrentado um processo de impeachment por causa do mensalão. ''O julgamento mostrou que as provas são consistentes e eu sinceramente não esperava outra decisão do STF. Isso acaba colocando o Supremo em uma condição ainda mais respeitável e o que está sendo julgado é o presidente Lula e o seu governo. O Supremo acaba de convalidar a tese de que deveria ter havido impeachment. Isso porque, enquanto o presidente Lula chamava o José Dirceu de capitão do time, o procurador-geral chamava-o de chefe da quadrilha'', disse o tucano, afirmando que o escândalo partiu do Palácio do Planalto.
Até o ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio Mello –que durante as sessões do STF fez questão de deixar clara sua satisfação com o acatamento das denúncias– resolveu jogar no lixo a imparcialidade que se espera de um magistrado que irá julgar os réus e repetiu o mesmo discurso dos cardeais tucanos. Perguntado por jornalistas se a decisão do STF desgasta a imagem do governo, Mello não titubeou em responder que sim. ''Claro que há um desgaste, sem dúvida alguma para o partido (PT) e, conseqüentemente, para o governo. Agora nós temos que seguir e vamos avançando. A evolução é permanente'', afirmou o ministro.
Mello também estimou o prazo no qual espera que o julgamento seja concluído: três anos, ou seja, o assunto voltar a esquentar em 2010. Para a oposição, a preferência é que seja bem pertinho das eleições presidenciais.