UFBA e IMG lançam livro sobre Engels
A Editora da Universidade Federal da Bahia acaba de lançar o livro Friedrich Engels e a ciência contemporânea. Este é o resultado do seminário realizado pelo Grupo de Pesquisa Marx no Século 21 (FHC-UFBA) e o Instituto Maurício Grabóis, realizado qua
Publicado 11/09/2007 13:36
Como afirma a apresentação, escrita por Augusto Buonicore, ''a homenagem não deixa de ter um sabor de vingança – uma caprichosa vingança da história, pois desde o início do século 20, desenvolveu-se, no campo da intelectualidade de esquerda, uma forte corrente que buscou minimizar – ou mesmo desqualificar – as contribuições de Engels ao processo de formação do marxismo''.
Segundo David Mclellan: ''Engels explorou seu imenso talento nas áreas mais variadas possíveis: foi lingüista de primeira categoria, importante crítico militar, pelos menos se igualou a Marx como historiador, foi pioneiro da antropologia e reconhecido orientador de uma dúzia de partidos marxistas então emergentes''. O livro que, agora, o público tem em mãos procura dar conta dessas múltiplas dimensões da produção teórica daquele que influenciou inúmeras gerações de combatentes pelo socialismo.
Entre os autores desta obra coletiva se encontram João Quartim de Moraes, Muniz Ferreira, Mauro Castelo Branco, Lígia Osório, Olival Freire Jr., José Carlos Ruy, Renildo Souza, Antônio Luigi Negro, Aldrin Castellucci, Maria Rosário de Carvalho, Naomar de Almeida Filho e Elizete da Silva.
Veja, abaixo, um trecho extraído de sua apresentação, que resenha o conteúdo dos artigos ali publicados. Para maiores informações sobre a compra do livro veja em http://www.edufba.ufba.br/vendas.html.
''Dois autores, sob ângulos diferentes, procuram analisar as contribuições de Engels à história e sociologia do trabalho. Aldrin Castellucci realça o valor do livro A situação da classe trabalhadora na Inglaterra – desde a utilização de fontes até as teses originais ali defendidas. O livro de Engels seria um dos primeiros estudos sobre a cidade industrial moderna e da relação entre as questões ambientais e o capitalismo industrial em expansão, especialmente as suas conseqüências para os trabalhadores urbanos. Rebate, segundo a linha de Hobsbawn, os que buscaram suavizar a situação dos operários ingleses na primeira metade do século 19.
Antônio Luigi Negro – armado da perspectiva thompsoniana – apresenta as diferenças entre a visão desses dois autores sobre a constituição da classe operária. Thompson recusou a idéia de que a classe operária fosse o resultado natural da soma da energia do motor a vapor e a indústria algodoeira e que ela tivesse uma missão histórica pré-estabelecida. As conseqüências de tais esquemas teóricos, segundo ele, seriam: a subestimação de outros grupos de trabalhadores e a incompreensão do processo de formação da classe trabalhadora em outros lugares, como o Brasil.
Muniz Ferreira trata de uma das facetas menos conhecida da produção teórica de Engels: suas contribuições no terreno da ''ciência da guerra''. Pouquíssimos sabem que, pelos seus conhecimentos sobre o tema, Engels foi convidado a escrever verbetes e artigos para diversas publicações especializadas nos EUA, Inglaterra e Alemanha. Ele defendeu ''a historicidade da ciência militar'' e demonstrou ''a influência da dinâmica econômico-social sobre a organização e composição dos exércitos, sobre os métodos de condução das operações militares e sobre a contribuição aportada por cada exército ao desenvolvimento da arte da guerra'' e vinculou ''o desenvolvimento da arte e da ciência da guerra aos momentos de efervescência revolucionária''.
Quartim de Moraes, por sua vez, realça a atualidade do pensamento engelsiano – e materialista – sobre a origem da linguagem e da consciência. No seu artigo, combate as concepções idealistas que buscam sublimar a consciência e separá-la da natureza e da matéria. A consciência, no entanto, não seria anterior à linguagem. Ao contrário, sustenta o autor, a linguagem seria mais antiga que a consciência, pois se constituiria enquanto sua condição social. No artigo, reforça a justeza do materialismo filosófico que afirma que ''o homem é um produto da história natural''. Isto, continua Quartim, ''não significa reduzir a história da humanidade às chamada leis naturais. O próprio Engels diversas vezes rebateu essas idéias que buscavam ‘naturalizar’ as relações sociais''.
A interpretação engelsiana sobre a religião é feita por Elizete da Silva. Corretamente ela afirma que, para Engels, os fenômenos religiosos só poderiam ser plenamente entendidos na sua relação com as lutas de classes. Foi dentro desta perspectiva que, por exemplo, Engels buscou compreender as guerras camponesas na Alemanha e constatou que Lutero e Münzer, ambos protestantes, ''partiam de lugares sociais distintos'' e ''representavam dois partidos de classes divergentes''. O primeiro representava a burguesia ascendente; o segundo, as massas camponesas. Os conflitos de classes, muitas vezes, se disfarçavam sob a máscara dos conflitos entre religiões.
O jornalista José Carlos Ruy, seguindo na mesma trilha, concentra suas atenções sobre o livro As guerras camponesas na Alemanha. Ruy destaca três aspectos desta obra: 1º, a importância do trabalho de generalização e interpretação dos dados empíricos; 2º, encarar a luta política e religiosa como aspectos da luta de classes; 3º, a subordinação da atividade intelectual do historiador às necessidades da luta política do seu tempo – no caso aos interesses das classes populares. A própria análise das guerras camponesas XV e XVI só poderia ser plenamente entendida à luz do processo revolucionário por que se passava na Alemanha em meados do século 19.
A polêmica relação de Engels com a etnologia evolucionista foi abordada por Maria Rosário de Carvalho. Segundo ela, os dois amigos ficaram entusiasmados com as descobertas de Morgan. Marx chegou mesmo a afirmar que o antropólogo norte-americano, por outras vias, estaria chegando ao materialismo-histórico. Talvez, argumenta a autora, porque Morgan tenha sido ''o primeiro que, com conhecimento de causa, introduziu uma ordem precisa na pré-história da humanidade, e o fez à luz do pressuposto de que todas as grandes épocas de progresso da humanidade coincidem, de modo mais ou menos direto, com as épocas em que se ampliam as fontes de subsistência''.
Renildo Souza e Mauro Castelo Branco de Moura, em dois interessantes artigos, abordam as contribuições de Engels à Economia Política. Renildo destaca o pioneirismo de Engels que, aos 24 anos, lançou Esboço da crítica da economia política. Nesse trabalho, além de acentuada crítica moral ao capitalismo, Engels ''deteve-se na análise das categorias econômicas clássicas, aportando formulações embrionárias importantes para o marxismo''. Entre as antecipações contidas ali estariam: a descoberta da tendência de a livre concorrência transformar-se em monopólio; a tendência do capitalismo à instabilidade e ao desequilíbrio, fruto da anarquia imperante na produção.
Mauro Castelo Branco de Moura também destaca o papel de Engels na conversão de Marx ao estudo da economia política e introduz uma outra faceta: a de ''decano dos comentaristas e divulgadores'' de O Capital. Nos artigos escritos logo após o lançamento desta obra, Engels alertava para a centralidade que adquiria ali a categoria de ''exploração da força de trabalho'' e concluía pela necessidade de a ação revolucionária dos trabalhadores superar aquela exploração.
Por fim, Olival Freire trata da influência do materialismo dialético nas ciências da natureza, especialmente na antiga União Soviética. Os últimos anos, segundo o autor, ''têm permitido uma avaliação mais multilateral da fortuna do pensamento de Engels nas ciências da natureza no século 20''. A conclusão que se poderia extrair é que ''o pensamento de Engels, e o marxismo em geral, foi, em um número de casos, um quadro de pensamento que se revelou inspirador para o desenvolvimento das ciências''.