Aliança DEM-PMDB no Rio: falta entender o papel de Cabral
Durante a semana de 3 a 9 de setembro, um rumor agitou o mundo político fluminense, com repercussão nacional: o DEM do prefeito carioca Cesar Maia e o PMDB do governador Sérgio Cabral e do ex-governador Anthony Garotinho celebrariam um acordo eleitoral
Publicado 13/09/2007 12:01
Essa especulação, inicialmente vista com muita reserva e até mesmo ceticismo, virou notícia quando, no dia 10, DEM e PMDB divulgaram um comunicado onde anunciavam um “compromisso (que) vai além de 2008 e chega a 2010 com a equação majoritária invertida”. Ou seja, em 2008 o DEM apóia os candidatos do PMDB na maior parte dos municípios (com exceção de Nova Iguaçu onde é aliado do PT de Lindberg) e na capital o PMDB apóia um candidato a prefeito indicado por Cesar Maia. Já em 2010 será a vez do DEM apoiar o cabeça de chapa do PMDB para disputar o governo do estado, e em troca o PMDB apoiará Cesar Maia para o Senado.
Esta engenharia política foi aprovada por ampla maioria no próprio dia 10 pelo Diretório Estadual do PMDB (63 votos a favor, oito contra e um em branco).
Garotinho e Cesar Maia, que até recentemente trocavam pesadas acusações, parecem eufóricos com o acordo e enfatizam a necessidade de derrotar o PT para garantir a sobrevivência política de suas legendas.
PT pego no contrapé
O PT fluminense está naquela situação de um jogador que corre a toda velocidade e de repente é tocado por trás e perde o equilíbrio.
No seu recente 3º Congresso Estadual, realizado no dia 5 de agosto, o PT aprovou uma resolução onde apontava o PMDB como aliado prioritário nas eleições de 2008.
O mapa eleitoral que estava sendo construído pelos petistas em boa parte dos 92 municípios do Rio contava com o PMDB como fator impulsionador, principalmente na capital, onde vários pré-candidatos petistas sonham em ter o apoio da poderosa força política do governo estadual rumo à prefeitura.
Pego de surpresa, o PT parte para o ataque. “É uma aliança entre decadentes”, diz Alberto Cantalice, presidente do PT-RJ, espetando Cesar e Garotinho. “Essa aliança não é coerente com as conversas entre os partidos aliados, os acordos firmados com o governador Sérgio Cabral e o apoio que o Rio vem recebendo do Governo Federal”, afirma a vice-presidente nacional do PT, deputada Maria do Rosário (RS). “Vou defender que o PT impeça de promover alianças com o PMDB de Garotinho e o DEM. Nosso entendimento é com o PMDB de Cabral”, diz o líder do PT na Câmara, Luiz Sérgio (RJ).
O problema desse raciocínio de Luiz Sérgio é justamente entender o que pergunta o próximo subtítulo.
Qual o verdadeiro papel de Sérgio Cabral nessa história?
A primeira vista ficam claros os interesses de Garotinho e Cesar nesta aliança. Garotinho rompe seu isolamento político e abre perspectivas para o futuro, até então nebuloso. Vai firmando também seu deslocamento para a direita, que já se expressou na formação do Governo Rosinha, no apoio a Alckmin no segundo turno das eleições e agora encontra sua apoteose na aliança com um empedernido líder conservador e neoliberal.
Já Cesar Maia, mestre em usar a máquina pública em eleições, vê agregado ao seu projeto de eleger o sucessor um considerável capital político, já que a dupla Garotinho-Rosinha, apesar de acumular um grande desgaste nos setores médios preserva ainda muita influência nas camadas populares. Basta recordar que na eleição estadual de 2002 Rosinha ganhou no primeiro turno, tendo maioria de votos inclusive na capital.
Com Sérgio Cabral a história é outra. Político conhecido pelo seu pragmatismo, o governador nega veementemente que concorde com este acordo ou o avalize, chegando a ameaçar renunciar ao governo estadual para disputar a prefeitura, se isso for necessário à preservação da aliança com o presidente Lula.
Por outro lado, se os petistas elegem um prefeito na capital isso sem dúvida irá fortalecer muito a legenda para a disputa do governo estadual em 2010, quando o PT inclusive já tem candidato anunciado ao governo: Lindberg Farias, atual prefeito de Nova Iguaçu que pode ter como adversário… Sérgio Cabral.
No entanto, de bobo o PT não tem nada, e uma aliança claramente anti-PT, sem dúvida abalaria a aliança Cabral-Lula, o que de forma nenhuma interessa ao governador, já que esta parceria tem sido fundamental para o Estado. O Rio de Janeiro está sem caixa suficiente para novos investimentos e para isso tem contado principalmente com os recursos do PAC e de outros projetos do governo federal.
O DEM tenta apaziguar a reação do governador. “Cabral não tem com o que se preocupar: a eleição é apenas municipal e não confrontará Lula. Não vamos criar constrangimentos aos nossos aliados”, afirma o prefeito Cesar Maia, fazendo questão de enfatizar que o acordo é com todo o PMDB e insistindo que Cabral deu seu apoio à aliança: “nas duas vezes em que ele tomou a iniciativa de me contatar, em minha casa e na casa dele, nas últimas três semanas, reafirmou seu apoio à aliança”.
Cabral segue afirmando ser contra o acordo embora seja inegável que ele não se movimentou para evitar a aprovação da aliança na Direção Estadual do PMDB. Do seu grupo só compareceu à reunião o líder do governo na Assembléia, deputado Paulo Melo, que votou a favor do acordo. Outro dado é que duas figuras chaves para construir o acordo foram, pelo DEM, o deputado federal Rodrigo Maia, e pelo PMDB, o presidente da Alerj, deputado Jorge Picciani, que também tem ligação com o governador.
Mas, por enquanto tudo que se tem são conjecturas sobre os reais interesses de Sérgio Cabral.
Os desafios da esquerda
A aliança DEM-PMDB não pode ser tida como um fato líquido e certo já que ela necessitará ser referendada nas convenções dos dois partidos. Entretanto, se concretizada pode ser considerada muito forte, o que não quer dizer nem de longe que será imbatível.
Em primeiro lugar falta um nome competitivo ao DEM para concorrer em 2008 e a história política já cansou de mostrar que só “máquina” não garante eleição. Esse é o principal drama dessa aliança. Todos os nomes apresentados pelo DEM são frágeis (Índio da Costa, Rosa Fernandes, Eider Dantas, Solange Amaral, entre outros). Embora Cesar Maia anuncie novidades bombásticas, contando com novas filiações até o final do mês, este é o quadro atual.
Em segundo lugar, tanto Garotinho quanto Cesar Maia não estão em alta. Garotinho foi condenado por crime eleitoral pelo TRE e teve suspenso seus direitos políticos. Já Cesar Maia enfrenta forte desgaste entre a população e a avaliação do seu governo por parte dos cariocas piora a cada pesquisa.
Em terceiro lugar as graves acusações que os novos aliados atiravam um contra o outro até bem pouco tempo atrás serão sem dúvida rememoradas em cada passo da campanha.
Para impedir a continuidade de 16 anos de uma administração conservadora e anti-popular, a esquerda deve buscar acelerar sua união em torno de nomes que possam encarnar uma proposta mudancista viável. Deste ponto de vista salta aos olhos que Jandira Feghali, com um cabedal de quase três milhões de votos para o senado (na capital Jandira só perdeu em votos para Lula) desponta como o nome com mais condições de capitanear o enfrentamento à direita conservadora que, atropelando qualquer resquício de pudor, pensa apenas em perpetuar seu poder, celebrando para isso todo tipo de alianças. Diante disso cabe uma resposta da esquerda (principalmente do Bloco de Esquerda – PSB, PCdoB, PDT, PRB, PMN e PHS) que deve mostrar ser capaz de enfrentar esse desafio com generosidade e ousadia.
*Secretário Estadual de Comunicação do PCdoB-RJ