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Procuradores: combate à violência não pode violar direitos

O combate à violência urbana não pode justificar a violação das garantias fundamentais e dos direitos humanos. A deliberação faz parte da Carta do Rio de Janeiro, divulgada pelos participantes do Encontro

Em dez pontos, o texto destaca a necessidade de fiscalizar a atividade policial, incentivando a criação das ouvidorias e corregedorias, defende o controle e a aplicação de recursos públicos nas áreas de educação, saúde e inclusão social e a capacidade de investigação do órgão.

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Antônio Carlos Bigonha, lembrou que, desde a consolidação da Constituição de 1988, o Ministério Público vem buscando formas de exercer controle sobre as práticas policias. No entanto, sempre encontrou resistência de setores da polícia.

“Como a polícia detém o monopólio da violência legítima, da força do Estado, esse poder tem que ser fiscalizado”, disse o procurador. Embora reconheça que a força policial às vezes é necessária, Bigonha ressalta que o “fortalecimento do aparelho repressor” não pode ser a única estratégia para resolver a violência. “Nós discutimos muito e achamos necessários serviços públicos de qualidade e medidas na área social para as comunidades violentas”.

Os procuradores também definiram como “indispensável” a capacidade de investigação do órgão no combate ao crime organizado. Manifestaram também que o Ministério Público deve acompanhar todas as propostas de mudanças na legislação que tratam dos grampos telefônicos. “O grampo é um instrumento valoroso para as investigações, mas, por outro lado, existe a privacidade”, ressaltou Bigonha.

Segundo ele, a prática deve ser usada com moderação. Sabemos que, pela facilidade, as interceptações telefônicas são muito utilizadas”. Bigonha destacou, entretanto, que existem outras formas de investigação e que esse deve ser “um procedimento excepcional, e não ordinário”.

No documento final, os procuradores também apontam como necessários mais recursos para os programas de proteção a vítimas e testemunhas e rapidez na tramitação de inquéritos e processos judiciais.

Veja a íntegra do documento.

''Os membros do Ministério Público Federal, reunidos no Rio de Janeiro, no 24º Encontro Nacional dos Procuradores da República, ocorrido entre os dias 30 de outubro e 02 de novembro de 2007, em torno do tema central “O Ministério Público Federal e os desafios da violência urbana”

Considerando que a Constituição Federal tem como objetivo a erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais, bem como a elevação do direito à segurança ao patamar de direito fundamental;

Considerando que a Segurança Pública é dever do Estado e responsabilidade de todos, cumprindo ao Ministério Público Federal fiscalizar o correto e eficiente funcionamento dos órgãos de Segurança Pública, a partir de um efetivo controle externo de suas atividades;

Considerando a necessidade de privilegiar as políticas públicas de educação, saúde e outros programas relativos à inclusão social, que viabilizam o enfrentamento do problema da violência urbana sob o foco da prevenção;

Concluem que:

1. Faz-se necessária a elaboração, em nível nacional e regional, de um completo e detalhado diagnóstico da violência urbana em todas as suas dimensões, com o objetivo de subsidiar a formulação de políticas públicas mais eficazes no combate às causas da criminalidade e seus efeitos danosos à sociedade;

2. Cabe ao Ministério Público Federal, com base na legislação e regulamentação já existentes, exercitar da forma mais ampla possível o controle externo da atividade policial, a fim de garantir o pleno respeito aos direitos humanos sem perder de vista a eficiência dos serviços prestados pelos órgãos de segurança pública, e de reconhecer a necessidade de reforço dos mecanismos de controle interno, inclusive com a criação de Ouvidorias e melhor aparelhamento das Corregedorias;

3. O Ministério Público Federal deve promover sistematicamente o controle da aplicação dos recursos públicos destinados aos programas governamentais no âmbito da educação, saúde e outros programas de inclusão social, a fim de zelar pela correta aplicação de tais verbas que podem ter um efeito positivo na contenção da violência urbana;

4. É papel fundamental do Ministério Público Federal o acompanhamento do Plano Nacional e dos Planos Estaduais de Segurança Pública, para evitar a malversação dos recursos públicos da União a eles destinados e garantir a sua efetiva concretização;

5. Devem ser privilegiados, no exercício das atividades de investigação, os métodos e técnicas mais modernos, principalmente no combate à criminalidade organizada;

6. O poder investigatório do Ministério Público Federal é instrumento indispensável e eficaz no combate ao crime organizado;

7. É imprescindível o acompanhamento das propostas de alterações legislativas no âmbito das interceptações das comunicações telefônicas, no sentido de que a nova regulamentação, ao tempo em que alcance um maior grau de proteção do direito à privacidade, não contribua para a perda de eficácia desse método investigativo;

8. Deve ser aprimorado o programa de proteção a vítimas e testemunhas, não somente com o aporte de maior volume de recursos públicos, mas sobretudo com o incremento da participação e controle estatal e a garantia de uma tramitação mais célere dos respectivos inquéritos e processos judiciais;

9. O aperfeiçoamento do sistema prisional deve objetivar a eficácia da atividade repressiva estatal com o incondicional respeito à dignidade da pessoa humana.

10. O justo anseio no controle e repressão da violência urbana e o fortalecimento do aparelho repressor do Estado não podem justificar a violação de garantias fundamentais e a direitos humanos. ''