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Manuela d'Ávila: Capitão Nascimento e cultura da impunidade

A controvérsia trazida pelo filme Tropa de Elite nos impõe diversas reflexões sobre segurança pública, tráfico e consumo de drogas. Entretanto, é necessário debatermos a construção, em parcelas da população, de uma espécie de heroísmo em práti

Tropa de Elite é um filme e seus atores interpretam relatos de policiais do Bope (Batalhão de Operações Especiais da PM/RJ) sobre a relação da sociedade com a polícia. Não é correto punir o filme pelo tema ou sua equipe pela abordagem. Fosse assim, não existiriam filmes sobre o nazismo e a propaganda de Goebbels. O problema não reside, portanto, no filme mas na interpretação que é feita a partir de angústias reais da sociedade. Capitão Nascimento, personagem central desse filme, se tornou figura símbolo de um ideário onde valores como a honestidade e o combate à corrupção são centrais.


 


Este mesmo personagem tortura e mata e, ainda assim, é visto com alguma simpatia por alguns. Por quê?


 


É possível estar por trás do fascínio das ações violentas do personagem a sensação de impunidade que vivemos em nosso país. É inegável o corte social de nossas punições. Políticos e empresários quase nunca são presos ou punidos. è na corrupção que a impunidade é mais sólida e visível. O banqueiro Cacciola lesa os cofres públicos foge para a Europa, já em 2005 a doméstica Angélica Aparecida foi condenada e presa por roubar um pote de manteiga. Alguns parlamentares, investigados por crimes comuns e contra o patrimônio público, são encobertos pela “excessiva” imunidade parlamentar.


 


Não seria, pois, a impunidade a justificativa do endeusamento da violência e da tortura? Em Tropa de Elite, o antônimo do corrupto é o torturador.


 


É preciso enfrentar uma legislação que, em muitos casos, ampara a impunidade. Não é o tamanho da punição que inibe o crime, mas sim a certeza de sua aplicação.


 


A Lei de Execuções Penais é avançada e moderna no que tange à execução das penas e sua disciplina. Mas nunca chegou, de fato, a ser aplicada em sua plenitude. caso tivesse, teria combatido a criminalidade e a impunidade em nosso país.


 


Não somos o país mais corrupto, somos um país que precisa centrar ações no combate à impunidade. Queremos um país com justiça para todos, queremos honestidade e punição para todo e qualquer crime, cometido por qualquer brasileiro.


 


Não aceitamos a impunidade e também a tortura. Também não aceitamos capitães Nascimentos.


 


* Manuela d'Ávila é deputada federal (PCdoB-RS)