Jornal destaca trajetória de vereador comunista
Como o título ''Ex-oposicionista agora 'blinda' governo'' o jornal Correio Popular, da Rede Anhanguera de Comunicação, dedicou uma página inteira da edição de domingo (17/02) para destacar a trajetória e traçar uma breve biografia de Sérgio Benass
Publicado 18/02/2008 15:03 | Editado 04/03/2020 17:19
Nos últimos anos, a esquerda brasileira passou por um processo de transformação provocado, principalmente, pela chegada ao poder, um fenômeno verificado nacionalmente e que se reproduz em Campinas. Os políticos que antes infernizavam a vida da direita – com seus discursos afiados, passeatas, invasões de terra etc. – trocaram de papel com seus antigos opositores. São eles que agora têm que alinhavar alianças políticas e em nome da ''governabilidade'' assumem o caráter de fisiologismo que tanto criticavam. A recorrente derrota da oposição na Câmara de Vereadores, que não consegue emplacar uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) para investigar denúncia da existência de funcionários ''fantasmas'' no poder público, tem um nome: Sérgio Benassi (PCdoB), líder de governo do prefeito Hélio de Oliveira Santos (PDT).
O comunista, responsável pela ocupação da Vila União e dos bairros Mauro Marcondes e Shangai, participante ativo de várias passeatas contra a política econômica do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC) e que, metodicamente, ia à tribuna da Casa de Leis em todas as sessões ordinárias para direcionar a metralhadora contra as administrações dos tucanos José Roberto Magalhães Teixeira e Edvaldo Orsi, que deu caráter investigatório a uma simples comissão de acompanhamento dos precatórios e que dizia que a existência de indício já era um elemento para ser investigado, é hoje o homem que comanda com mão-de-ferro a base governista e exige provas contundentes para qualquer investigação. Ele é o responsável pela rejeição de diversos requerimentos de convocação de secretários e de informações e até mesmo de barrar a instalação de comissões de investigação contra o atual governo.
Benassi, no passado imbatível no discurso articulado, trocou o poder das palavras por outro instrumento de convencimento: as mãos. Com um simples levantar de uma das mãos, comanda a base governista, que, obediente, vota ao seu comando.
A opinião dos colegas de mandato que acompanharam a trajetória legislativa do comunista nos últimos 15 anos não é unânime. Enquanto alguns avaliam que o líder de governo esqueceu as suas raízes ideológicas e de defesa da transparência, outros avaliam que é um homem de partido e que executa o seu papel de forma eficiente – na oposição ou situação.
O ''estar do outro lado'' é evidenciado em episódios como a queda-de-braço que teve com o sindicato dos servidores durante a votação, no ano passado, da alteração do plano de cargos, carreiras e salários. Enquanto Benassi comandava a base para votar favoravelmente à matéria, antigos companheiros de partido, como o ex-coordenador do sindicato dos servidores municipais, Fábio Custódio, rivalizam com o comunista das cadeiras do plenário.
Mudança radical
O ex-vereador tucano Biléo Soares, que integrava a bancada governista do PSDB em 1993, enfrentou não apenas a verve irônica e combativa do comunista, como também viu Benassi impetrar diversos processos judiciais contra o governo que Biléo defendia. ''Esse Benassi de hoje não é o mesmo que eu conheci. Ele fazia uma oposição extremamente virulenta, sistemática e radical. Ao impedir e obstruir investigação de denúncias, ele faz exatamente o contrário do que defendia. Não sei se a mudança foi ideológica, mas que mudou, mudou'', avaliou o tucano, hoje assessor do deputado federal Carlos Sampaio (PSDB), aliado do vereador Artur Orsi (PSDB), forte opositor ao governo Hélio.
Da mesma opinião é um outro vereador que acompanhou Benassi como oposição e hoje divide com ele a bancada governista. ''Ele fazia uma oposição ferrenha. Houve uma mudança radical'', diz o parlamentar, que pediu para não ser identificado.
De lados opostos no mandato legislativo de 1993 a 1996, o vereador Luiz Riguetti (DEM), líder de governo de Magalhães Teixeira, foi um dos vereadores mais visados por Benassi, que era o seu calcanhar-de-aquiles. Hoje, os dois integram a mesma bancada e dão apoio a Hélio. ''O fato é que Benassi é extremamente inteligente, bom de tribuna e é um político esperto. Na época do Grama, o que ele fazia era que aproveitava o vácuo do que o governo municipal deixava de fazer. Para mim, ele cumpriu o papel de oposição e, agora, o de situação'', avalia Riguetti. Para ele, a mudança de Benassi foi apenas de estratégia de atuação. ''Antes, ele ia à tribuna todos os dias. Agora, dá para contar nos dedos quando ele responde à oposição. Isso é para não alimentar os opositores'', avalia o democrata.
Para outro parlamentar, que enfrentou Benassi nas duas situações, a forma de agir é a mesma. ''Ele usa os mesmos métodos. É truculento, agressivo e leva a base no cabresto curto. Para mim, ele é um soldado da causa. Cumpre o papel que o partido lhe determina. Trocou o idealismo pelo pragmatismo'', diz.
A manutenção do apoio da base, de acordo com esse vereador, não é resultado de sua capacidade de articulador. ''Os vereadores não querem perder as benesses políticas como os cargos e os favores nos bairros'',avalia.
O ex-presidente da Câmara Dário Saadi (DEM), que também rivalizou com Benassi quando integrava a bancada tucana, afirmou apenas que: ''Ele foi um opositor competente e usa a mesma competência para ser líder''.
Companheiro de vários mandatos, Francisco Sellin (PDT) avalia que a mudança de Benassi é resultado da experiência adquirida nos últimos anos. ''Ele mudou o perfil de sua atuação política por conta do amadurecimento. De qualquer forma, ele não alisa muito a base. É um homem de palavras firmes e fortes'', afirma.
Oposição
Os integrantes da oposição da Câmara de Campinas que duelam com Benassi não poupam críticas. ''O líder de governo não permite que a pequena oposição que existe cumpra o seu papel. Ele caracteriza uma esquerda cuja ética é aquela que os fins justificam os meios'', disse Carlos Francisco Signorelli (PT).
Paulo Bufalo (PSOL) disse que Benassi representa o símbolo campineiro das contradições da esquerda. ''Fez uma opção pelo pragmatismo levado ao extremo, que é equivocada. Aquela que enquanto esquerda faz defesa apenas para melhorar o governo e não pela defesa de um projeto de sociedade'', disse. Para o socialista, a pior faceta é o impedimento de aprovações de requerimentos de convocação de secretários. ''Impedir o acesso à informação e da prestação de esclarecimento desmoraliza o Parlamento'', ressalta.
Para ele, a confusão ideológica é um processo que começou a se desencadear no final dos anos 80. ''Um exemplo é o fato de Lula (presidente Luiz Inácio Lula da Silva) ter sido eleito pela esquerda, mas aplicar um projeto de direita'', avalia. Bufalo ainda tem esperança. ''Nesse momento, Benassi poderia dar uma contribuição nessa crise e possibilitar que a investigação sobre a denúncia de fantasmas seja feita.'' Mas Marcela Moreira (PSOL) é categórica. ''Ele mudou de lado e, de comunista, só resta o nome do partido.''
TRAJETÓRIA
Benassi nasceu em 1952. É médico veterinário formado pela Universidade de São Paulo (USP) e funcionário público da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati), da Secretaria de Estado da Agricultura e Abastecimento.
Foi membro da direção nacional do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) – legenda a qual se mantém fiel. Faz parte da direção municipal e estadual do partido.
Em 1992, elegeu-se vereador pela primeira vez em Campinas. De 1993 a 1996, foi ferrenho opositor à Administração tucana. Na gestão do ex-prefeito Francisco Amaral (então PMDB e hoje PP), integrou a bancada de oposição.
Entre os anos de 2001 e 2004, passou a integrar a bancada de sustentação da prefeita Izalene Tiene (PT). Com a condução de Hélio de Oliveira Santos (PDT) à Prefeitura, Benassi assumiu a liderança de governo. De acordo com o seu próprio site, Benassi denunciou a emissão de títulos públicos da Prefeitura, resultando no escândalo dos precatórios e também presidiu a Comissão Processante que apurou e constatou as improbidades administrativas cometidas pelo ex-prefeito Chico Amaral. Integrou várias CEIs.
As táticas vão se alterando de acordo com a necessidade
O líder de governo, Sérgio Benassi (PCdoB), disse que se mantém defensor do caráter ideológico e programático do mesmo partido, o PCdoB, antes mesmo de ser eleito vereador. Porém, ressaltou que o socialismo ruiu e essa transformação fez com que a esquerda mudasse: ''As disputas políticas passaram por transformações no cenário político brasileiro e mundial, e há sempre um ajuste no campo de idéias. As estratégias de caráter ideológico e as táticas vão se alterando de acordo com a necessidade. A correlação de forças vai se transformando. O próprio socialismo ruiu e demandou um esforço teórico e reelaboração de estratégias de conceitos''.
Ele sustenta ainda que, quando era oposição, o confronto era contra o neoliberalismo e, hoje, no Brasil, está sendo construído um projeto democrático e popular que ele sempre defendeu. ''Eu estou vivendo momentos em um novo projeto. Devo reconhecer que para fazer tudo isso tive que passar pelo teste da minha própria maturidade. O comunista disse ser difícil avaliar como seria sua atuação hoje se estivesse na oposição.
Em relação à oposição na Câmara, Benassi disse que ela oscila entre ''a obstrução sem causa e as paranóias do Zé do Apocalipse''. Segundo ele, o que caracteriza um oposicionista é o conteúdo pelo qual está trabalhando. ''Não tendo proposta e nem discurso faz um uso provocativo apenas para obstruir e impedir que o outro faça. Já o Zé do Apocalipse, por falta de argumentos, anuncia cataclimas, crises, desastre, faz bravatas e denúncias nunca comprovadas apenas para ser um pouco de notícia, firmar um perfil de oposição'', ironizou. ''Eu sempre agia e era um opositor de ação. Eu dizia que tinha um problema, assumia a responsabilidade de acusar, provar e me submeter ao julgamento. Quando eu apresentava uma denúncia, antes de tornar público. eu já tinha tudo na mão. Então são estilos muito diferentes.''
Para ele, a oposição, hoje, é ineficiente. ''Se o jogo político da Câmara é neutralizado, existe o MP (Ministério Público), ação popular. Eu, muitas vezes, participei de comissão de inquérito e era o único membro de oposição e fazia barulho. Eu nunca propus uma, mas várias coisas que fiz nem foi por comissão de inquérito, foi pela Justiça'', disse ele.
Quanto ao impedimento de instalação de CEI para investigar o caso do assessor ''fantasma'', Benassi disse que não é necessário. ''A investigação da Corregedoria (da Câmara) tem uma rapidez maior do que qualquer outro instrumento. Esse trabalho, que não é palco de perseguição política, mas de levantamento de provas, assegura o direito de defesa e encaminhamento de acusação. A própria oposição deixou claro que há interesse político eleitoreiro com objetivo de desgastar o governo. Eu não vou contribuir para isso'' argumentou.
De Campinas,
Agildo Nogueira Junior