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Eleição de Judas causa polêmica no Cariri

Com 2.681 votos, 22,77% do total, o bispo de Barra, Bahia, dom Luiz Cappio, que fez greve de fome contra a transposição do São Francisco, foi eleito o “Judas da Semana Santa”, em eleição promovida pela Fundação do Folclore Mestre Eloi, na cidade de Cra

Proclamado o resultado, o boneco, representando o bispo, subirá à forca no próximo dia 22, Sábado de Aleluia, no Largo Centro Cultural do Araripe (Rffsa), sob a acusação, segundo o regulamento da Comissão Julgadora, “de haver traído o povo com maior requinte de crueldade, gozando de maior índice de antipatia”.



“Isso é ridículo”, reagiu o vigário da Sé Catedral do Crato, padre Edmilson Neves, esclarecendo que o gesto de dom Luiz Cappio não foi bem interpretado. O bispo, segundo o vigário, “chamou a atenção para a necessidade urgente de revitalização do rio e de ações que garantam o verdadeiro desenvolvimento para as populações pobres do Nordeste: uma política de convivência com o semi-árido, para todos, próximos e distantes do rio”.



Padre Edmilson antecipou que, durante as cerimônias da Semana Santa, vai falar sobre este assunto com o objetivo de esclarecer o posicionamento de um bispo que defende a sociedade, a continuidade de um amplo diálogo sobre o projeto de transposição do Rio São Francisco. “Ele não pode ser considerado um traidor do povo. Ao contrário, o objetivo da greve de fome foi sinalizar para a importância da revitalização do Rio e a garantia de toda população ao acesso à água de boa qualidade como um direito humano e um bem público”.



A indicação de dom Cappio como Judas da Semana Santa surpreendeu também os movimentos jovens ligados à Igreja Católica. O presidente do grupo Missão Resgate, Geraldo Correia Braga, que congrega jovens da Pastoral da Juventude, diz que o bispo foi, sobretudo, um idealista e, como tal, deve ser respeitado. Adverte que um governo democrático “tem a responsabilidade de interpretar as aspirações da sociedade civil, em vista do bem comum, de oferecer aos cidadãos a possibilidade efetiva de participar nas decisões, de acatar e de respeitar as determinações judiciais, em clima pacífico, sem ironias”.



A festa de malhação do Judas, promovida pela Fundação do Folclore Mestre Eloi, não é a única da cidade. Está programada a malhação de cerca de 50 bonecos. A mais tradicional é o Judas da Rua dos Cariris, que é enforcado ao lado da Prefeitura. A festa tem mais de 100 anos e obedece a um ritual. Os coordenadores do evento passam a noite que antecede ao enforcamento em vigília, bebendo cachaça.



Antes do suplício, alguém lê o “testamento” do Judas, em versos, colocado especialmente no bolso do boneco. O testamento é uma sátira das pessoas e coisas locais, com humor.



Tradição



Malhar o Judas é uma prática ainda comum no Brasil, apesar do costume praticamente ter sido banido das grandes cidades por falta de locais adequados e dos perigos. No interior, porém, a tradição continua, e os bonecos de palha ou de pano são queimados no Sábado de Aleluia.



A lenda



Diz a lenda que Judas, apóstolo traidor, cognominado Iscariotes por ser oriundo de Carioth, cidade ao Sul de Judá, já um ano antes de Jesus ter sido supostamente crucificado, havia perdido a fé no mestre e continuava a acompanhá-lo por comodidade e para ir furtando do que ofereciam aos apóstolos. Obcecado pelo dinheiro, antes de se afastar de Cristo, resolveu entender-se com os sinedritas (membros do Sinédrio, conselho supremo dos judeus). Judas assistiu à última ceia, em que Jesus revelou a sua traição, mas foi logo ao encontro das autoridades locais para cumprir o que tinha combinado e receber 30 moedas. Arrependido, Judas teria se enforcado.