Site ''O Binóculo'' entrevista deputado Carlin Moura

O site “O Binóculo” –página no ar desde 2004 e que reúne um grupo de jovens jornalistas para escrever sobre política, música, literatura e outros temas– publicou no último fim de semana uma entrevista com o deputado estadual Carlin Moura (PCdoB/MG). O par

Oposição de conteúdo


 


Orozimbo Junior


 


Existem controvérsias entre historiadores sobre quando surgiu a idéia de partido político moderno. Entre datas imprecisas e algumas suposições, temos afirmações de que a Inglaterra do século XVII viu nascer tal noção. Já no ano de 1680, ainda na “Terra da Rainha”, a oposição política, uma doutrina básica da democracia, consolidou-se a partir da premissa de que os adversários do governo não são inimigos do Estado, assim como os opositores não são traidores ou subversivos.


 


De acordo com esse princípio democrático britânico, o deputado estadual Carlin Moura (PCdoB) conduz sua atuação na Assembléia Legislativa de Minas Gerais. Em entrevista exclusiva ao O Binóculo, o parlamentar falou de sua atuação na Casa, onde tem ganhando notoriedade por sua oposição ao governo mineiro.


 


Antes, pois, faz-se necessária uma melhor apresentação deste novato no parlamento estadual. O nome de batismo é Carlos Magno de Moura Soares, e a cidade natal é a pequena Virgolândia, no Vale do Rio Doce. Filho de lavradores, Carlin chegou à Região Metropolitana de Belo Horizonte no início da década de 80, adotando em 1983 a cidade de Contagem como sua nova morada. Após completar seus estudos em escolas públicas, em 1989 ingressou no curso de jornalismo da PUC/MG. Um ano depois, foi aprovado em direito na UFMG, tendo que cursar as duas universidades paralelamente.


 


Foi na Federal que ele se aproximou do movimento estudantil e, conseqüentemente, da militância política, com o ingresso no PCdoB ocorrendo em pouco tempo. Como advogado do Sindicato dos Metalúrgicos e dos Petróleos, Carlin percebeu de perto as necessidades dos trabalhadores. Em 2000, disputou pela primeira vez um cargo eletivo, não sendo eleito para vereador de Contagem. Mas já no pleito seguinte, em 2004, foi eleito vereador na cidade, dando um salto imediato na carreira política, elegendo-se deputado estadual em 2006.


 


Como você define sua postura em relação ao Governo Aécio Neves?


Estou convicto de que fui eleito por movimentos que são oposicionistas ao governo estadual, ou seja, que não estão satisfeitos com o atual momento vivido em Minas Gerais. O que procuro fazer é uma oposição de conteúdo, frente à base forte que o governo tem na Casa. Estamos em um momento em que pouco se debate os problemas de Minas. O cerceamento à imprensa, por exemplo, esconde problemas cruciais do Estado, como o sistema injusto de arrecadação e a situação do funcionalismo público. Vivemos o chamado Estado Mínimo [característica do neoliberalismo], no qual os servidores são sufocados por uma política salarial rígida, em que a concessão de aumentos é muito difícil. Sem falar na política de terceirização da mão-de-obra, o que ocorre em vários segmentos estatais, como na Cemig.


 


Além dessas falhas, o que mais você aponta no momento atual de Minas?


Vivemos uma fase de fortalecimento da marca maior do jeito mineiro de fazer política. Assim como em outros tempos, Minas cresce atrelada à chegada ao Palácio do Planalto [como aconteceu com Juscelino Kubitschek e Tancredo Neves]. Passamos uma imagem de estarmos bem no campo da política. Na realidade, estamos mal, pois o desenvolvimento real do Estado está atrasado. O crescimento vem sendo deixado em segundo plano, temos potencial para muito mais. Ao contrário, estamos perdendo espaço, com nosso posto de segundo Estado do Brasil sendo ameaçado pelo Rio de Janeiro e pelos Estados do Sul. O projeto neoliberal do Aécio Neves não acrescenta nada.


 


Aécio Neves tem amplo apoio na ALMG. Como é ser oposição diante de uma situação assim?


Atuo com base no Regimento, tento obstruir algum projeto que o governo queira aprovar e que contenha algo com que não concordo. Vou à tribuna discursar, enfim… Com a base de apoio que tem, o governo do Estado aprova o que quiser. Principalmente agora, com a aliança PT/PSDB, ser oposição está ainda mais difícil. Mas é possível fazermos algo, tentar amenizar, alterando algumas coisas, como no caso do projeto de lei que tinha como base a isenção do ICMS para os ricos.


 


Como ter motivação para defender sua postura oposicionista com uma base governista tão esmagadora?


Tenho uma experiência de vida quando fui diretor da UNE [União Nacional dos Estudantes]. Em 1991, fizemos a campanha ‘Universidade em Tempo de Collera’. O país vivia uma epidemia de cólera e estava sob o comando do ex-presidente Fernando Collor de Melo. Naquele ano, já víamos muita coisa errada no governo federal e falávamos em impeachment ao presidente. Ainda assim militávamos contra uma figura que tinha 70% de aprovação popular. Ou seja, quanto maior o desafio, maior a motivação. Estamos fazendo uma radiografia do modelo de governo em curso no Estado. A máscara vai cair. Tenho visto um amadurecimento, ainda que lento, por parte da população.


 


Como é a relação com os demais deputados, especialmente os do bloco de apoio declarado ao governo?


Sou um democrata. Separo bem as coisas, até por ser advogado. Não tenho dificuldade nem problema de relacionamento com nenhum deputado. Tenho trânsito livre com todos eles. Faço questão do bom relacionamento, já que a Assembléia preserva o clima ameno da casa mineira.


 


Por sua postura, você já sofreu alguma represália, constrangimento ou tentativa de intimidação?


Nunca houve nenhuma dessas situações. Recebo muitos e-mails de pessoas que apóiam o governo, mas que buscam debater os problemas de Minas.


 


Sua postura, certamente, deixa bem clara qual é sua posição. Isso pode fazer com que você tenha antipatias. Por outro lado, angaria apoio de quem tem postura crítica sobre as questões de Minas. Quais são seus projetos para sua vida política, há em vista um passo maior, como tentativa de ingresso na Câmara Federal ou na prefeitura?


O Futuro a Deus pertence. [risos].


 


Você é formado em jornalismo. Qual sua opinião sobre a relação que a mídia exerce com o governo do Estado e com o governo Lula?


São dois pesos e duas medidas. A mídia brasileira é ideologizada. Isso fica claro quando, em vez de discutir o bom momento do país, a mídia prefere dar amplo espaço para falar de epidemia de febre amarela, que não aconteceu, falar de CPI e outros assuntos menores. Estamos perdendo uma ótima oportunidade de aproveitar o crescimento do país, que poderia ser maior, caso houvesse um debate mais profundo.


 


Que paralelo é possível traçar entre a oposição ao governo federal e ao governo estadual?


A oposição federal segue os moldes clássicos do Udenismo, é rasteira, moralista, sem conteúdo. Os oposicionistas ao governo Lula são filhotes da UDN [União Democrática Nacional, partido político fundado em 1945, opositor às políticas e à figura de Getúlio Vargas e de orientação liberal]. Em Minas, buscamos fazer uma oposição moderada, de conteúdo. Às vezes, nem tem oposição [risos].


 


Qual sua opinião sobre a quase certa aliança do PT com o PSDB na capital mineira?


Isso é o cruzamento de vaca com jumento. Não dá leite, nem puxa carroça. As pessoas não enxergam proximidade entre os partidos [ao contrário de muitos dos defensores da aliança, que entendem que PT e PSDB têm a mesma raiz ideológica, a social democracia]. Para o povo, o PT nasceu para defender os interesses dos trabalhadores, enquanto que o PSDB existe para garantir os privilégios da elite dominante deste país. Essa aliança é um retrocesso. Para o povo, petistas e tucanos são como óleo e água, não se misturam. A aliança é um desserviço à trajetória de luta da sociedade brasileira.


 


Comente o atual momento do Partido Comunista do Brasil.


O PCdoB vive um excelente momento, fruto de sua postura. Fomos muito importantes na eleição e reeleição do presidente Lula. O país tem alcançado avanços, como a equalização da dívida externa, que teve início num processo nascido há 17 anos. Temos outras conquistas, mas reconhecemos que é preciso fazer muito ainda. Precisamos avançar no sentido de colocar em prática as seis reformas democráticas [Reforma Tributária, Reforma Política, Reforma da Educação, Reforma Urbana, Reforma Agrária e Democratização da Mídia]. Temos que nos empenhar para o pagamento da maior das dívidas do país, que é a dívida social, através da inclusão social, da distribuição de renda etc. Esse desafio coloca o partido em crescimento. Precisamos seguir com a luta popular, aproveitando o bom momento do Brasil para avançarmos mais.


 


 


Visite o site O Binóculo: http://www.obinoculo.com.br/orozimbo_junior.htm