Chico Lopes: ''O PCdoB é um partido de transformação social''

Nesta segunda-feira, dia 24, o jornal O Estado, publicou um entrevista do deputado federal Chico Lopes (PCdoB) concedida à jornalista Georgea Veras, onde ele fala sobre seu partido, que completa 86 anos de existência. As perguntas não são nada amistosas,

Em março de 1922 nasceu o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), que comemora neste 25 de março 86 anos de história. A legenda mais antiga que o Brasil possui passou por muitos momentos da história do país, tendo sido um austero crítico do regime ditatorial e por muitos anos viveu na clandestinidade.


 


Hoje, o que circula nos bastidores, é que o PCdoB é uma legenda a serviço do Governo Lula. O deputado federal Chico Lopes discorda. Segundo ele o partido participa do Governo Lula para ajudar a construir as mudanças que o país necessita e por isso tem opiniões próprias, em especial no que diz respeito à política econômica.


 


Para o deputado cearense, o PCdoB se mantém fiel aos ideais do socialismo científico e à teoria marxista-leninista e ainda continua opositor ferrenho do sistema capitalista, que para ele é um sistema ''fadado ao lixo da história''.


 


Quanto ao futuro da sigla no âmbito local e nacional, o parlamentar diz que no Ceará vê com entusiasmo o futuro do  PCdoB, pois ''deveremos ampliar ainda mais o número de prefeitos e vereadores nas eleições deste ano''. Com relação ao Brasil, o projeto do partido é o desenvolvimento nacional com valorização do trabalho.


 


Leia a entrevista:


 


Partido Comunista do Brasil. O que da ideologia comunista o partido traz na sua performance política hoje?


O PCdoB se mantém fiel aos ideais do socialismo científico e à teoria marxista-leninista. E é justamente essa ideologia transformadora, voltada para a ação política, dentro da realidade concreta, e não numa situação imaginária, que orienta a atividade política dos comunistas brasileiros. O PCdoB se dedica a conhecer em profundidade a história e realidade atual de nosso país, a vida de nosso povo, as forças políticas que atuam em nossa sociedade e a partir daí traça seus objetivos e sua ação, ou como você pergunta, fazemos nossa performance política. O PCdoB não vive de fazer proselitismo político inócuo, sem resultado concreto, mas atua para criar as condições reais de promover os avanços e as transformações que o Brasil e os brasileiros necessitam. Os avanços têm sido muitos no governo do Presidente Lula, e as transformações mais profundas virão no futuro, dentro de uma nova situação em que as forças mais avançadas da sociedade consigam hegemonizar o quadro político e estabeleçam uma nova correlação de forças. É essa energia que faz do PCdoB um partido de transformação social, mas também um partido que atua na vida concreta, nas condições atuais da luta política do Brasil. Podemos até ter cometido alguns erros, mas esse é nosso caminho ao longo desses 86 anos de história. E os fatos demonstram que é um caminho cheio de vitórias.


 


Na época da ditadura militar o partido foi um ferrenho opositor do sistema. Hoje o PCdoB ainda é um forte crítico dos opositores ou se tornou mais brando em suas lutas?


Como já lhe respondi anteriormente, o PCdoB é um partido de transformação social, sendo assim somos opositores do sistema capitalista (creio é que desse sistema que você fala) desde 1922, quando surgimos no Brasil, portanto muito antes da ditadura militar. Continuamos opositores ferrenhos do capitalismo e foi por isso que não embarcamos na perestroika enganadora de Gorbachev, nem deixamos de acreditar no socialismo depois do fim da experiência na União Soviética e no Leste Europeu. Muito pelo contrário, aproveitamos aqueles episódios para aprofundar ainda mais nosso estudo sobre as experiências socialistas e sobre o próprio capitalismo, incorporamos novas contribuições à teoria marxista-leninista e nos detivemos em construir um novo programa socialista para o Brasil, aprovado em nossa 8ª Conferência Nacional, realizada em agosto de 1995. Continuamos a afirmar que o capitalismo é um sistema sem futuro, fadado ao lixo da história e que só tende a agravar a situação de milhões, ou até bilhões de pessoas, como está demonstrando mais uma vez a atual crise, que desta vez não é nos países periféricos, mas no seu principal centro, os Estados Unidos. Mas volto a dizer, a luta pelas transformações econômicas, políticas e sociais se dá na realidade concreta e exige muita capacidade de atuar dentro da política real, concreta e não fazendo apenas afirmações de princípios.


 


O PCdoB é hoje uma mera legenda de aluguel a serviço do Governo?


O PCdoB é o mais antigo partido político desse país e sua trajetória é cheia de grandes contribuições para a luta política. Apenas para citar alguns momentos mais relevantes, os comunistas ajudaram a organizar a Aliança Nacional Libertadora, que se constituiu numa ampla frente de combate à ditadura Vargas; participamos das mobilizações para organizar a Força Expedicionária Brasileira (FEB), que enfrentou o nazi-fascimo na Segunda Guerra Mundial; elegemos uma bancada expressiva e participamos ativamente da Assembléia Nacional Constituinte de 1946; estivemos no centro do movimento O Petróleo é Nosso, que resultou na criação da Petrobrás em 1953; enfrentamos com muito destemor o regime militar instalado em 1964, inclusive com a perda de muitos militantes nos porões da tortura e na gloriosa Guerrilha do Araguaia, um momento elevado da luta política de nosso país e que aos poucos vai sendo conhecida e respeitada pelo povo brasileiro; lutamos pela anistia ampla, geral e irrestrita, pelas diretas já, no Fora Collor e em todas as grandes mobilizações que a sociedade brasileira promoveu; atuamos intensamente na Constituinte que elaborou a atual Constituição do Brasil e estivemos com Lula desde a primeira campanha em 1989 até sua eleição em 2002. No Governo Lula temos dado uma contribuição valiosa, tanto no Ministério, como no Congresso Nacional. Não devemos esquecer que num dos momentos mais delicados do primeiro governo, o deputado Aldo Rebelo, do PCdoB, foi eleito presidente da Câmara dos Deputados, chegando a ocupar interinamente a Presidência da República. Participamos do Governo Lula para ajudar a construir as mudanças que o país necessita e por isso temos nossas opiniões próprias, em especial no que diz respeito à política econômica, que precisa dar muito mais ênfase ao desenvolvimento nacional. Acredito que esta não é uma trajetória de um partido efêmero, que esteja sujeito a interesses deste ao daquele governo, agrupamento ou personalidade política.


 


O PCdoB ainda é um partido de esquerda?


Acredito, sem modéstia alguma, que, se partido de esquerda é aquele que busca construir avanços que possibilitem a melhoria na vida do povo, o PCdoB se enquadra perfeitamente neste perfil. Mas creio que o PCdoB, por sua ideologia transformadora, é até mais do que isso, é um partido de vanguarda, até mesmo revolucionário. Mas também acho que não se deve ser maniqueísta e taxar esse ou aquele partido ou político de forma esteriotipada. O mundo, e o Brasil não está fora dele, vive um realinhamento de forças políticas, por isso devemos fugir dos modelos tradicionais.


 


Aqui no Ceará o partido nunca teve o comando do Estado nem da Capital, nessas eleições municipais possivelmente irá apoiar a reeleição da petista Luizianne Lins, como o senhor vislumbra o futuro do partido no âmbito político cearense?


A trajetória histórica do PCdoB no Ceará é das mais dignas e por isso temos o respeito de amplos segmentos políticos e sociais. Mas devemos atentar para o fato de que durante mais de seis décadas fomos perseguidos e obrigados a atuar na clandestinidade. Ainda assim a nossa contribuição é destacada no âmbito dos movimentos sociais, da cultura, das ciências e no plano político-institucional a atuação dos comunistas no parlamento sempre foi destacada e mais recentemente passamos a atuar no poder executivo com igual destaque. Merece destaque o trabalho do companheiro Mariano Freitas e tantos outros na SER I e em outros órgãos da Prefeitura, bem como a atuação do Secretário de Saúde, João Ananias. Em 2004 elegemos apenas um prefeito no Estado e em 2007 outros sete prefeitos ingressaram no Partido. Isto significa um grande salto em nossa experiência administrativa. Neste sentido vejo com entusiasmo o futuro do PCdoB no Ceará, já que deveremos ampliar ainda mais o número de prefeitos e vereadores nas eleições deste ano. O PCdoB é assim, o partido mais antigo do Brasil, mas quanto mais tempo de vida, mais energia para atuar.


 


Faz parte dos planos do partido, a nível nacional, chegar ao Palácio do Planalto?


O PCdoB é um partido com atuação nacional e temos um projeto para o país, por isso temos debatido com amplos segmentos da sociedade brasileira a construção de um projeto de desenvolvimento nacional com valorização do trabalho. Estamos propondo seis reformas democráticas (política, tributária, agrária, urbana, da educação e dos meios de comunicação) para orientar a ação política organizada de um amplo movimento democrático, contrapondo-se de forma ativa às reformas de cunho neoliberal, sendo importante força motriz para o avanço do projeto nacional de desenvolvimento, com distribuição de renda e valorização do trabalho e da produção. que precisam ser realizadas de modo a fazer o Brasil avançar.  Neste sentido, é evidente que tendo um projeto nacional, o PCdoB almeja conduzir os destinos do pais. E desde já sabemos que não é tarefa para um partido sozinho, portanto não abrimos mão de construir alianças com outras forças políticas. Mas se você fala com relação à disputa de 2010 para a Presidência da República, acredito que o quadro ainda está muito longe de uma definição e por isso creio que não devemos definir uma posição desde já, mas devemos atuar para assegurar e até acelerar as mudanças que o Brasil vive atualmente.


 


O partido ainda sonha com um mundo comunista ou a experiência em Cuba, China Comunista e União Soviética demonstra que o capitalismo reinará sempre?


Volto a dizer que o PCdoB busca a transformação profunda da sociedade e o capitalismo tem como destino certo o lixo da história, por isso o socialismo não poderá ser descartado jamais. Depois da experiência soviética uma coisa ficou muito clara: não há modelos a serem seguidos. Tanto a China, como Cuba, além do Vietnã e da Coréia do Norte, desenvolvem ao seu modo, guardando sintonia com as peculiaridades de cada um, suas experiências de socialismo. Cada qual com seu cada qual, como diz o ditado, constrói o bem estar de seu povo e, uns mais outros menos, promovem um desenvolvimento muito superior ao dos países capitalistas. Do lado do capitalismo só se fala em crise, guerra e um verdadeiro pânico no tal mercado. Isto não significa que ele cairá de podre, será necessário ainda muita luta dos que buscam uma nova sociedade. O capitalismo resistirá de todas as formas, inclusive de forma agressiva, como sempre tem feito ao longo da história, mas seu reinado está mais perto do fim do que se pode imaginar.


 


 


Fonte: O Estado