Erick Guimarães – Quando o poder político e mídia se misturam
Chama a atenção o número de políticos com mandato que são donos de meios de comunicação eletrônica, informa o Instituto de Estudos e Pesquisas em Comunicação (Epcom).
Publicado 24/03/2008 14:30 | Editado 04/03/2020 16:36
O Instituto cruzou a lista dos proprietários de emissoras de rádio e TV, da Anatel, com a de parlamentares, prefeitos e governadores de todo o País. Descobriu que, oficialmente, 271 políticos possuem rádios ou televisões. Desse total, mais da metade (147) é de prefeitos. O levantamento identificou também 55 deputados estaduais, 48 federais, 20 senadores e um governador. Detalhe: o número leva em conta apenas os proprietários oficiais – ou seja, desconsidera os políticos que usam laranjas para controlar rádios ou emissoras de TVs.
O tipo de mídia varia de acordo com a área de atuação do político. Entre os prefeitos, por exemplo, a maior prevalência é de rádios OM ou comunitárias. Já entre deputados e senadores as mídias possuem alcance maior: rádios FMs ou emissoras de TV. Na divisão de partidos, boa parte desses canais estão nas mãos de políticos filiados aos Democratas (58), ao PMDB (48) e ao PSDB (43) – embora políticos de partidos ditos de esquerda, como PT e PSB também apareçam na relação.
Os números do Epcom reacendem um velho debate sobre a mistura entre poder político e a mídia, que não avança porque toca em questões fundamentais para a democracia brasileira: a autoconcessão de rádios e TVs. O artigo 54 da Constituição Federal já proíbe que parlamentares federais mantenham contratos com empresas que sejam concessionárias públicas, mas a falta da regulamentação abriu brechas jurídicas que permitiram que este tipo de situação continue.
O princípio da norma é simples: como todo pedido de renovação ou novas outorgas de rádio e TV passam pelo Congresso, há um claro conflito de interesses com os parlamentares-proprietários, que têm poder para barrar concorrentes ou facilitar a concessão a aliados. Trata-se aqui da questão da impessoalidade do Estado posta em xeque pela expansão da cultura patrimonialista. Há outra questão que vai além dos parlamentares federais e que, este ano, atinge principalmente prefeitos: o uso político de concessões públicas em campanhas eleitorais. A posse dessas concessões por agentes políticos desequilibra as disputas eleitorais e só serve para reforçar velhas estruturas de poder.
No ano passado, uma subcomissão da Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara dos Deputados chegou a apresentar uma emenda à Constituição vedando de forma ainda mais explícita a mistura de políticos e empresários de comunicação. A proposta ainda aguarda votação, mas é fácil perceber que este é um debate que interessa a pouquíssimos parlamentares.
Fonte: O POVO