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Aumento dos juros é desnecessário e nefasto ao crescimento

O Banco Central, o setor financeiro, a grande mídia e forças políticas conservadoras preparam o ambiente para  uma nova elevação da taxa de juros – armadilha que, se não for desarmada, repercutirá negativamente na trajetória de crescimento econômi

Em que pese os efeitos da crise econômica estadunidense, o momento econômico pelo qual passa o país é razoavelmente bom, de relativa estabilidade. O crescimento reapareceu mais forte em 2007, sustentado na elevação do investimento e do consumo doméstico, no aumento da produção industrial e agropecuária. A inflação apresenta índices moderados, compatíveis com o crescimento interno atingido e com os parâmetros internacionais.



Há um aumento significativo no consumo – de massas e produtivo – a partir dos aumentos reais do salário-mínimo, do crescimento da massa salarial, de maiores facilidades de crédito – onde o sistema público se destaca – e mesmo dos programas sociais do governo. O país tem atraído um bom volume de investimentos estrangeiros diretos. O PAC ganha agilidade e as obras do governo se multiplicam.



No plano externo, o Brasil firma uma via soberana de integração no mundo em transição em que vivemos. É uma rota que leva ao desenvolvimento do potencial energético e alimentar, à retomada industrial e ao aprofundando da integração regional.



Há, no entanto, preocupações sérias por parte do PCdoB e de outras forças progressistas em torno de problemas urgentes. Entre eles a luta entre dois caminhos no plano econômico – o desenvolvimento robusto, com crédito amplamente acessivel e distribuição de renda versus o crescimento econômico contido, sustentado por juros altos permenentes, em benefício dos rentistas e especuladores. Realidade que pressiona o governo do presidente Lula desde seu início e que volta a se manifestar com força. Este recrudescimento se dá no debate sobre análises de indicadores e tendências no quadro econômico atual, mas não se limita a isto. Incide mesmo sobre os rumos que o país deverá seguir em futuro próximo, envolvendo e preparando as eleições de 2010, refletindo interesses contrários.



Já há algum tempo o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) interrompeu a trajetória de queda da taxa de juros básica, a Selic, mantendo-a no patamar dos 11,25% ao ano. Agora, em seu Relatório da Inflação divulgado recentemente, o BC dá a entender que subirá os juros na reunião de 15 e 16 de abril. Sustenta haver pressões inflacionárias causadas pelo aumento do consumo sem a proporcional capacidade de produção da economia. Fiel à cartilha monetarista conservadora, conclui, então, pelo aumento dos juros.



Todavia, por um lado, dados da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) e da Confederação Nacional da Indústria (CNI) desmentem a argumentação do BC. Embora, sim, o consumo tenha crescido pelo crédito e pela melhora dos rendimentos, a capacidade não utilizada da indústria ainda varia entre 17 e 15%. Por outro lado, economistas de variadas tendências têm questionado os prognósticos do BC, como os professores Gonzaga Belluzzo e Delfim Netto. Argumentam não haver motivo para alarde, uma vez que a estimativa apontada para a inflação é 4.6%, enquanto o centro da meta fixada é de 4,5, diferença irrisória, portanto.



As taxas de juros brasileiras já se situam entre as maiores do mundo, o que tem provocado uma avalanche de dólares em direção ao Brasil – uma parte dos quais capital especulativo, de curto prazo. Diante disso, o governo se vê obrigado a comprar grandes quantias de divisa estadunidense para tentar conter a valorização do Real, diminuindo as pressões sobre o câmbio. Isto permite o aumento das reservas internacionais. Mas, ao mesmo tempo, resulta em fenômenos colaterais indesejáveis.



O primeiro deles é o reaparecimento dos déficits em conta corrente. O câmbio valorizado tem levado à diminuição dos superávits comerciais. Nos dois primeiros meses do ano em curso, o saldo comercial foi de US$ 1,8 bilhão, 67,1% menor que o de janeiro e fevereiro de 2007. Além disto, o crescimento nas remessas líquidas nas contas de serviços (juros, transportes) e rendas (lucros e dividendos) ajuda a cavar o buraco.



A conseqüência dessa dinâmica é o desequilíbrio do balanço de pagamentos do país. O BC já calcula para 2008 um déficit em transações correntes de 12 bilhões de dólares. O reaparecimento dessa tendência aponta a possibilidade de o Brasil ser exposto à vulnerabilidade externa, semelhante ao período do segundo governo FHC.



Uma outra questão relevante é o fato de a relação dívida/PIB manter-se alta. Mesmo com a considerável elevação do PIB, a dívida pública tem subido uma vez que ela, em boa medida,  é indexada à Selic. Além disso, há uma quantidade crescente de títulos que o governo é obrigado a emitir para “esterilizar” o mercado, o que consiste em retirar de circulação os reais com os quais compra dólares.



E o  terceiro fenômeno é que a elevação da taxa de juros propiciará um aumento ainda maior da especulação contra o Real. O mercado opera com o diferencial das taxas de juros externa e interna numa ponta e, noutra, aposta na valorização do Real ganhando com a compra de papéis garantidos por mecanismos da ciranda financeira.



Nesta questão é bom levar em conta opiniões como as de H. Flassbeck, atual economista-chefe da Unctad: “a valorização da moeda brasileira está sendo resultado não apenas dos bons fundamentos da economia do País, mas, principalmente, da entrada de capital externo em busca de ganhos com a taxa de juros (…) essa situação não é sustentável para as exportações brasileiras no médio prazo”.



Nessas circunstâncias, o BC – ao defender o aumento dos juros – revela a falsidade de sua proclamada “independência”. Expõe abertamente seus vínculos com os interesses do sistema financeiro, que é quem realmente dá a linha a ser seguida.



Em suma, o aumento dos juros agora, se efetivado, seria danoso e desnecessário. Seria um sinal para frear o desenvolvimento em curso, com seu cortejo de perdas sociais e políticas. Serviria apenas para favorecer o capital especulativo e, em perspectiva, para colocar em risco conquistas econômicas e sociais da gestão do presidente Lula. Tudo o que deseja a direita neoliberal para tentar reaver o governo da República em 2010.



Não há motivos, portanto, para o governo Lula se submeter a essa chantagem que prevê “ou juros astronômicos ou escalada inflacionária”. O dualismo do BC é, na verdade, uma armadilha para aprisionar o governo.



Por tais razões, o PCdoB, neste momento decisivo, explicita sua posição contrária à elevação da taxa de juros. E conclama as forças progressistas, e também os movimentos sociais, a se pronunciarem e se mobilizarem para tentar impedir que se concretize esse erro decorrente da pressão dos poderosos círculos financeiros. Do nosso ponto de vista, o desenvolvimento brasileiro requer juros mais baixos, medidas de proteção contra a especulação e um câmbio (contra o câmbio flexível absoluto) que ajude a manter o país no caminho da soberania, do crescimento e da distribuição de renda.



* Presidente Nacional do PCdoB.