Perenização do Rio Jaguaribe torna verde paisagem agreste
Enquanto muitas regiões no Interior do Ceará enfrentam, neste período do ano, enormes dificuldades de abastecimento de água, milhares de pequenos produtores rurais nas margens do Rio Jaguaribe vivem momentos de alegria, incremento na produção e trabalho i
Publicado 15/09/2008 10:28 | Editado 04/03/2020 16:36
O verde se espalha em diversas lavouras irrigadas. Essa realidade que contrasta com o sertão cearense seco e cinzento, é fruto da perenização do Alto Jaguaribe, num trecho de 175km a partir do Açude Arneiroz II, localizado na região dos Inhamuns.
O Jaguaribe perdeu de modo definitivo a característica de maior rio seco do mundo. Primeiramente, o Orós há vários anos estava garantindo a perenização do Médio e Baixo Jaguaribe, que recentemente ganhou o reforço das águas do Açude Castanhão, o maior do Ceará. Agora todo o trecho está perenizado, pelo menos nos anos em que os açudes e barragens estiveram com capacidade de liberarem água.
Experiência pioneira
A liberação das águas do Açude Arneiroz II é resultado da política pública de recursos hídricos sob a operacionalização da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh). Esse é o segundo ano em que o Alto Jaguaribe é perenizado. Em 2007, a experiência pioneira deu certo. As águas escorreram na calha do rio até a cidade de Jucás, perfazendo um trecho de 124km. Neste ano, a perenização chegou à barra do Rio Trussu, em Iguatu, ampliando o percurso para 175km.
A operação foi favorecida pela forte quadra invernosa que deixou a calha dos rios e riachos cheios, açudes e barragens transbordando. A liberação começou no fim de junho passado. “Logo após o inverno houve negociação com os usuários da bacia”, explicou o técnico da Cogerh, Mardônio Mapurunga. “Antecipamos as reuniões com as partes interessadas e o leito cheio do rio facilitou a perenização, que é um sucesso”, afirmou.
O Açude Arneiroz tem capacidade para acumular 197 milhões de metros cúbicos. Está com 90%. A liberação da água segue em conformidade com a demanda do trecho.
Recentemente houve uma diminuição em face da necessidade de redução de água na barragem de Barrinha, em Saboeiro, que foi danificada durante o inverno e precisa ser recuperada, com urgência.
Água acumulada
Atualmente, as águas do Arneiroz estão chegando até a barragem da cidade de Jucás. O trecho seguinte, até Iguatu, deverá ser perenizado pelas águas do Açude Muquém, em Cariús. Ao longo de todo o trecho do Alto Jaguaribe há oito pequenas barragens ou passagens molhadas que ajudam a acumular água. Essa foi uma estratégia surgida ao longo dos últimos 30 anos.
O Rio Jaguaribe perene e as barragens com nível elevado favorecem o cultivo irrigado de culturas diversas, criação de animais, a pesca e de outras atividades agropecuárias. O quadro favorece milhares de famílias, principalmente os proprietários de terras que ficam nas duas margens do rio. Não há uma estatística, mas estima-se que 20 mil famílias sejam beneficiadas diretamente ao longo do trecho de 175km.
Após o Açude Arneiroz, há oito pequenas barragens e passagens molhadas. Em Arneiroz, a ponte serve também de acúmulo de água. Em Saboeiro, há a barragem dos Caldeirões, que garante o abastecimento de água da cidade, e a do distrito de Barrinha. Em Jucás, existem cinco pequenos e médios reservatórios que trazem grandes benefícios: Poço Comprido, Pilões, Volta, barragem dos Padres e a última na cidade.
Agricultores apostam em maior produção
Nas várzeas do Rio Jaguaribe, desde o município de Arneiroz até Iguatu, o clima é de alegria e de trabalho intenso para aproveitamento das águas. Quando indagados sobre a importância da perenização, todos os produtores respondem como se estivessem combinados uma única frase: “Está bom demais. Isso aqui é uma riqueza”.
Os produtores de hortaliças, Timóteo Honório Cruz e Luíza Honório Brasil, em Barrinha, no município de Saboeiro, há oito anos, sobrevivem da produção de verduras. A renda média mensal de cada um é de R$ 800,00. “Quando o rio seca, temos dificuldades de água, mas desde o ano passado que a irrigação está favorável”, disse Cruz. “Vamos ampliar a nossa área de produção”. Outros agricultores estão seguindo o exemplo da família Honório e começaram a implantar canteiros de alface, cheiro verde e coentro.
Os irmãos Francisco e José de Castro têm criação de ovelhas e de bovinos. A capineira que alimenta os animais está nas várzeas do Rio Jaguaribe, em Saboeiro. A perenização transformou em verde, áreas tradicionais de seca, como a região dos Inhamuns. “Hoje está uma riqueza para todos”, disse José Castro. “Se não fosse esse rio cheio, as dificuldades aqui eram grandes”.
Em Jucás, próximo à barragem dos Padres, o produtor Francisco Antenor Fernandes, desde o ano passado cultiva um hectare de feijão irrigado no período de agosto a outubro. “Está bom, voltando ao tempo passado, quando o rio era cheio, perene, com matas e a água era limpa que dava pra gente tomar banho”, recordou.
Nas localidades de Barro Alto e Quixoá, em Iguatu, uma das maiores áreas de produção de arroz e banana do município, o clima também é de animação. Todos os anos, os produtores sofrem com a redução do lençol freático e a dificuldade de irrigação das lavouras. Esperam ansiosos pela chegada das águas do Açude Muquém. “Neste ano, a água veio mais cedo e favoreceu toda a região”, disse o produtor José Macedo, mais conhecido por José da Barra. “Espero que não baixe muito, mas chegue até o fim do ano”.
O agricultor José da Barra está renovando o parte do plantio de banana que perdeu no ano passado, por falta de água, e cultivou também 2 hectares de macaxeira. O produtor Eliseu Palácio está animado. O cultivo de 6ha de banana está produzindo bem. Palácio acabou de colher 120 sacas de 60kg de feijão.
Acesso à água de boa qualidade
Segundo Mardönio Mapurunga, Engenheiro da Cogerh, hoje, as águas do Açude Arneiroz II estão chegando à Barra do Rio Trussu, em Iguatu, nas saias do Açude Orós, perfazendo um trecho de 175km do Rio Jaguaribe com as águas passando na sua calha durante o período seco do ano, de julho a dezembro. Criando, com isso, um eixo de desenvolvimento sustentável.
São aproximadamente 17.500 hectares de terras com acesso a água de boa qualidade para diversos usos, valorizando economicamente esses imóveis. Atendimento com água bruta de qualidade para uso de abastecimento humano nas localidades e distritos localizados ao longo das margens do rio, nos seguintes municípios: Arneiroz, Catarina, Aiuaba, Saboeiro, Jucás, Cariús, Iguatu e Quixelô, inclusive as sedes municipais de Saboeiro, Jucás e Iguatu.
A negociação das águas foi feita nos moldes da política pública de recursos hídricos, com orientação e acompanhamento da Cogerh e nas deliberações do Comitê da Sub-Bacia do Alto Jaguaribe, integrando diversos usos de forma sustentável e descentralizada, quando a decisão de quanto a ser liberada na válvula e aonde a água deve chegar foi tomada pelos próprios usuários desse recurso hídrico, na cidade de Arneiroz.
A liberação das águas do Orós trouxe muitas vantagens como incremento de áreas irrigáveis, águas novas para as criações e a fauna silvestre, piscicultura, lazer e peixes disponíveis para pesca artesanal ao longo do trecho perenizado. As águas escorrem por gravidade, sem gasto de energia elétrica.
Os irrigantes não precisam se deslocar de suas terras para fazer irrigação, como nos perímetros irrigados. Por fim, é necessário que os setores usuários façam uso racional e sustentável da água, sem desperdício e sem poluí-la.
Fonte: Diário do Nordeste