Rio: emoções à vista numa eleição em aberto
De todas as maiores cidades brasileiras é o Rio de Janeiro que mostra uma indefinição mais elevada e emocionante nesta reta final da campanha eleitoral para prefeito. Ali, só é garantido que haverá segundo turno; mas permanecem em aberto os dois nomes
Publicado 22/09/2008 20:40
Observe o gráfico e os números ao lado, extraídos da pesquisa estimulada da última rodada do Datafolha, divulgada neste sábado (20) pela Folha de S. Paulo (exceto Fortaleza, em que a última pesquisa foi coletada no dia 6). O gráfico mostra os três primeiros colocados em cada uma delas, indicando a) a intenção de voto no primeiro deles; b) a soma dos dois favoritos; c) a soma dos três favoritos. Em todos os três casos, é no Rio que a soma é mais baixa.
Medalha de ouro da indefinição
A julgar por estes números, é possível distinguir três blocos.
Curitiba, Fortaleza e Recife se encaminham para eleger já no dia 5 de outubro o tucano Beto Richa e os petistas Luizianne Lins e João da Costa. Márcio Lacerda, do PSB de Belo Horizonte, também pode se incluir nesse grupo, embora esteja apenas quatro pontos acima da soma dos adversários, dentro da margem de erro de três pontos percentuais para mais ou para menos.
Em outras duas capitais (ou três, caso BH caia para este segundo bloco) deve haver segundo turno porém um dos seus personagens já é conhecido. Em São Paulo, Marta Suplicy (PT); e em Porto Alegre, José Gogaça (PMDB). A disputa é da segunda vaga no segundo turno, excluindo-se eventuais tsunamis pré-eleitorais.
Por fim, o terceiro bloco, que reserva as emoções mais fortes desta eleição, é formado pelo Rio e por Salvador. Aqui, as duas vagas estão em aberto e tudo pode acontecer.
Mas Salvador aparece no último Datafolha com a medalha de prata da indefinição. O ouro cabe ao Rio, nas três modalidades estudadas: menor intenção de voto para o primeiro colocado na pesquisa, para a soma dos dois primeiros e para a soma dos três primeiros.
Veja o gráfico: Eduardo Paes (PMDB), Marcelo Crivella (PRB) e Jandira Feghali (PCdoB) somam apenas 57% das intenções de voto, e apenas 13 pontos separam o primeiro da terceira colocada. Mesmo comparando com as 18 capitais de estado não pesquisadas pelo Datafolha, é um embolamento recorde.
Medalha de ouro da pulverização
A charada eleitoral carioca deriva de dois fatores. De um lado, um grande número de eleitores sem candidato, ou declarando que votarão nulo ou em branco. Do outro, uma grande pulverização de votos por outros candidatos.
Na pesquisa estimulada (onde os nomes dos candidatos são apresentados ao entrevistado), os eleitores que não indicam um nome, ou rejeitam todos os candidatos, sobem a 17% no Rio, contra 8% em São Paulo, 8% em Fortaleza, 9% no Recife, 10% em Curitiba, 14% em Porto Alegre e 14% em Salvador. Apenas Belo Horizonte suplanta o número do Rio, com 22% de indecisos (o que justifica que se deixe as barbas de Lacerda de molho).
Na pesquisa espontânea os números são ainda mais gritantes: 49% dos cariocas não tomaram a iniciativa de declarar um candidato, contra 22% em Curitiba, 28% em São Paulo, 30% em Fortaleza, 33% em Porto Alegre, 34% no Recife e 44% em BH.
Quanto à pulverização, outra medalha de ouro para o Rio: 25% das intenções de voto dos cariocas (na estimulada) se distribuem por outros cinco candidatos que obtêm mais de 2% – Fernando Gabeira (PV-PSDB, 11%), Solange Amaral (DEM, 5%), Alessandro Molon (PT, 4%), Chico Alencar (Psol, 3%) e Paulo Ramos (PDT, 2%).
Jandira aposta no ''recall'' de 2006
No Rio, os movimentos em relação à rodada anterior do Datafolha, duas semanas antes, foram todos dentro da margem de erro. Paes oscilou um ponto para cima – encerrando uma fulgurante ascensão de 13 pontos em seis semanas. Jandira também um para cima, Crivella três para baixo, Gabeira três para cima. Porém dado o embolamento, até movimentos dessa ordem podem mudar o cenário. A distância entre Crivella e Jandira, de cinco pontos, configura empate técnico. Assim como aquela que separa Jandira de Gabeira – embora o Ibope e o Vox Populi atribuam 5% ao candidato do PV-PSDB.
Soma-se a este quadro uma incerteza jurídica. Nesta semana, o STF (Supremo Tribunal Federal) julga recurso do DEM-RJ que requer a cassação da candidatura de Paes, por ter se desincompatibilizado do cargo de secretário de estado fora do prazo legal. O relator é o ministro Eros Grau e a decisão deve sair entre quarta e sexta-feira.
Os movimentos das candidaturas obedecem a essas interrogações que as pesquisas não alcançam resolver. O verdadeiro embolamento, não só de candidaturas mas de projetos, estaria no crescimento de Jandira, que no Datafolha apenas se esboça. O PCdoB mantém o Rio como uma das suas prioridades nesta eleição, e deslocou para lá o seu secretário nacional de Organização, Walter Sorrentino.
''Jandira tem o maior 'recall', dada a sua votação para o Senado em 2006: ela teve mais votos no município que Cabral, Paes, Crivella e o próprio Dornelles, que acabou eleito graças ao interior. E ela pode ter uma reserva não desprezível – do voto das camadas mais sensíveis à necessidade de levar uma candidatura das forças populares para o segundo turno'', argumenta Sorrentino.
O dirigente do PCdoB lembra a existência de um comitê suprapartidário, o ''Braços Abertos'', atuando na busca desse voto progressista. Cita também o site www.lutario.com.br, lançado por César Benjamin para travar este mesmo debate. ''Além disso, há ainda uma força militante (na campanha Jandira) que protagonizou na semana passada uma passeata com 5 mil pessoas'', afirma Sorrentino.
As direções do tiroteio
O Ex-blog do atual prefeito, Cesar Maia (DEM), bate duro em Paes, sentencia que este ''empacou'' e que Crivella ''não irá para o segundo turno''. Mas não está claro se Cesar mantém a candidatura Solange para valer ou, com vistas ao projeto Serra 2010, descarrega votos por exemplo em Gabeira, candidato dos tucanos que faz uma campanha em direção ao centro-direita. Não deixaria de ser um final melancólico para o prefeito concluir assim, com um tiro no pé de sua fiel candidata, os 16 anos da ''era Cesar Maia'' na Prefeitura.
Paes bate em Crivella e vice-versa, o que interessa a ambos, visando consolidar uma ainda precária indicação de segundo turno. O programa de TV de Jandira levou ao ar os discursos de Paes, agora, dizendo-se parceiro número um de Lula, e em 2005, afirmando que o presidente ''tem sido solidário com todos os corruptos''. Lula, longe do Rio, comentou neste sábado ''onde chega a hipocrisia'' dos que ''me xingam na Câmara'' mas ''distribuem santinho do Lula nas cidades onde moram''. Em pesquisas qualitativas, aparecem eleitores que comparam a imagem de Paes a uma ''casca'' e o comparam com Fernando Collor.
O tiroteio não é aleatório, mas obedece à complicada lógica de uma eleição onde três, quatro ou cinco candidatos conservam alguma chance de chegar no segundo turno. Nos 12 dias até o 5 de outubro os eleitores cariocas afinal se decidirão, de olho nas faíscas que ainda podem agregar ainda mais adrenalina ao cenário. Se o resultado desmentir os leitores lineares de pesquisas, não será a primeira vez, desde Leonel Brizola em 1982.