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Contra a crise, Argentina estimula consumo e queda do peso

A piora dos principais indicadores macroeconômicos do país levou o governo da Argentina a divulgar novas medidas de estímulo à atividade econômica e alterar sua política cambial, acelerando a desvalorização do peso frente ao dólar. É o segundo pacote em d

Na última semana de novembro, foi anunciado um plano de obras públicas de US$ 21 bilhões e um projeto de incentivos para atrair a repatriação de dinheiro depositado no exterior. 



No front cambial, depois de muita resistência às queixas dos empresários, o Banco Central tem deixado o peso cair um centavo por dia há uma semana. Ontem a moeda americana chegou a valer 3,45 pesos, maior cotação em seis anos. A desvalorização acumulada no ano está em cerca de 14%. 



A surpresa das medidas anunciadas ontem pela presidente Cristina Fernández de Kirchner ficou para uma inédita redução nos percentuais do imposto sobre exportações (retenções) de milho e trigo. É o primeiro gesto em direção ao setor agropecuário desde a grande disputa política do início deste ano por causa de um aumento das mesmas retenções.



Cristina anunciou a liberação de 13,2 bilhões de pesos (US$ 3,8 bilhões) em empréstimos através do Banco de La Nación e do Banco de Investimentos (Bice) para fazer frente aos efeitos da crise financeira internacional e reaquecer a economia que vem desacelerando desde maio. 



Não foram divulgados detalhes sobre como este dinheiro vai chegar aos destinatários, mas a presidente explicou que quer estimular a venda do primeiro carro usado, de eletrodomésticos, as indústrias e as micro e pequenas empresas (veja quadro). 



“Serão destinados 3,5 bilhões de pesos, com um máximo até cinco mil pesos para o consumo (limite por operação). Isso permitirá a concessão de 700 mil empréstimos orientados aos setores da linha branca (eletrodomésticos) que tem 50 mil trabalhadores e que, além disso, fazem a qualidade de vida da sociedade”, afirmou Cristina Kirchner ao anunciar as medidas durante uma solenidade. 



Parte dos recursos será injetada na economia via exportadores, através de linhas de pré-financiamento a exportações e também para micro e pequenas empresas a juros referenciais de 11% ao ano. A condição para ter acesso a estes recursos é comprometer-se a não demitirem empregados. Os exportadores de milho e trigo terão 1,7 bilhão do total de três bilhões de pesos destinados ao comércio internacional dentro do pacote. Além da redução das retenções em cinco pontos percentuais (para 20% no trigo e 25% no milho), foi lançado um programa de estímulo às duas culturas, que dará desconto de um ponto percentual nas retenções a cada milhão de toneladas a mais no total produzido. 



As medidas foram recebidas com ceticismo pelo economista Aldo Abram, do Centro de Pesquisas de Instituições e Mercados da Argentina (Ciima-Eseade). “O que o governo está fazendo é apenas tirando dinheiro de um lado e colocando em outro”, afirmou referindo-se ao avanço estatal sobre os recursos dos exportadores, com as elevadas retenções sobre produtos agrícolas, e mais recentemente com a estatização dos fundos de pensão privados. 



A preocupação com a inflação, que levou o BC a segurar a desvalorização do peso o quanto pode, “passou a segundo plano”, na opinião de Hector Blanco, da corretora ABC Mercados de Câmbio. “Hoje creio que o governo está mais preocupado com o crescimento e o caixa”, explica o operador que prevê o dólar a 4,00 pesos para 2009. 



De fato, no quesito crescimento as notícias não são nada boas. A arrecadação de impostos cresceu em novembro apenas 17,6%, menos da metade da expansão dos meses anteriores. A desaceleração teve origem principalmente na forte queda na arrecadação de retenções sobre o trigo e o milho (-10,7%), soja (-70%), óleos (-60%) e petróleo (-56,5%). 



Seguindo a tendência mundial, a produção e a venda de automóveis estão despencando. O setor automobilístico que junto com a construção civil e o financeiro liderou o elevado crescimento do PIB argentino nos últimos seis anos, exibiu nos últimos dois meses seus piores resultados. A produção de carros de outubro ficou em 33.637 unidades, 26,4% menos que no mesmo mês de 2007, segundo a Adefa, entidade que reúne as montadoras. No varejo, as vendas de carros caíram 15% em novembro comparado a novembro de 2007 e 31% comparado a outubro, disse a associação de concessionárias (Acara). Ainda assim, o número de veículos vendidos este ano no país, acumulado em 589.957, já bateu todos os recordes. 



Por isso a presidente foi cautelosa com os incentivos. Vai liberar 3,1 bilhões de pesos, mas só para financiar quem vai comprar seu primeiro automóvel. “Estamos discutindo com quem produz e comercializa os automóveis e nesse sentido é preciso saber que já não podem manter as margens de rentabilidade de outras épocas, porque este esforço dos argentinos deve compreender também os empresários”, disse Cristina. 



Fonte: Valor Econômico