Metalúrgicos do ABC propõem câmaras setoriais; Lula se opõe
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não encampou a proposta do presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (filiado à CUT), Sérgio Nobre, de recriar as câmaras setoriais para discutir as demissões no setor automotivo. A informação é do jornal V
Publicado 22/01/2009 17:21
Durante reunião de aproximadamente uma hora, na manhã de quarta-feira, Nobre levou ao presidente um pacote de medidas específico para a cadeia automotiva. Na principal proposta, o sindicalista tentou mostrar que as câmaras seriam um mecanismo eficaz para negociação entre trabalhadores, empresários e governo.
Foi a proximidade de Lula com a entidade — ele a presidiu de 1975 a 1980 — que rendeu a Nobre a conversa privada com o presidente, à parte das discussões que vêm sendo feitas com as centrais sindicais. Antes da reunião, Nobre brincou: “Lula tem o sindicato como uma referência, até para seus discursos. E ele me deve isso, já que estou sem sala por causa dele”.
Era uma referência à produção do mais novo filme de Fábio Barreto, Lula — O Filho do Brasil. A produção do longa-metragem está reformando a sede do sindicato para que o local tenha a aparência da década de 70, quando Lula era presidente da entidade. A sala de Nobre está entre os locais em reforma.
O que disse o governo
Lula se comprometeu, no máximo, a apoiar um seminário envolvendo os prefeitos da região do ABC, sindicatos e empresários — o que deve acontecer ainda em fevereiro. Os sindicalistas sabem bem a diferença central entre a proposta sonhada e a conquistada: a câmara setorial é um espaço para negociação e tomada de decisões concretas. O seminário terá a possibilidade de propor idéias.
Mesmo assim, os sindicalistas acham que não saíram perdendo após o encontro com Lula. “A câmara pode surgir independentemente do governo federal. É claro que a participação da União dá um peso maior”, disse o presidente do sindicato.
Para Nobre, a crise vem gerando informações imprecisas e desencontradas, o que só serve para aumentar o pânico. “Alguns falam em crescimento de 4%, outros em crescimento zero. Há quem fale em demissões generalizadas”, disse ele, lembrando que seu sindicato continua com o mesmo volume tradicional de homologações de demissões — 450 por mês. “Mas algumas empresas que ainda não mandaram trabalhadores embora vêm nos procurar, o que é um sinal de que cortes poderão vir.”
Na visão do presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, se for efetivada a flexibilização das relações trabalhistas — com redução da jornada de trabalho e diminuição de salário —, o resultado seria a diminuição do poder de compra dos trabalhadores. Sem dinheiro, assinalou, não há consumo. Sem consumo, a recessão se instala e o desemprego aumenta.
“É muito barato demitir no Brasil. A multa de 40% do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) foi incorporada aos custos da produção das empresas”, afirmou o sindicalista. Para embasar o argumento, Nobre lembra que nos países desenvolvidos as demissões começaram após um ano e meio de crise financeira. “Aqui estamos sofrendo há três meses e os empresários já estão cortando postos de trabalho.”
Os porquês da câmara setorial
O sindicalista afirmou que os empresários não estão se dando ao trabalho sequer de esperar a conclusão do primeiro trimestre, apontado pelo governo e especialistas como o ponto crítico da crise no Brasil. “Por que eles não esperam? Porque sabem que depois vão recontratar o mesmo trabalhador pela metade do salário.” É em razão disso que o sindicalista aposta em repetir a fórmula da Câmara Setorial Automotiva.
O expediente das câmaras setoriais foi criado em março de 1992, reunindo governo, montadoras, autopeças, distribuidores e representantes dos trabalhadores para definir ações contra a crise que o setor vivia. Na época, a câmara setorial foi importante para impedir uma crise maior no setor automotivo, em meio à abertura do mercado nacional às marcas importadas. O então presidente Fernando Collor chegou a dizer que no Brasil só havia a produção de carroças.
Na experiência de 1992 e 1993, governo, indústrias e sindicatos reuniram-se e estabeleceram metas de produção e vendas. O governo baixou alíquotas de impostos, e o nível de emprego foi mantido. As medidas tiveram êxito: as vendas do setor voltaram a crescer.
É o que os metalúrgicos do ABC propõem também para os dias hoje. “Todo o debate até o momento foi emergencial e pontual. Na câmara setorial, poderemos pensar em medidas para agora e para o futuro”, disse Sérgio Nobre. “É preciso criar uma agenda positiva, definir metas de produção e vendas — e isso implica mexer no spread bancário, na taxa de juros e na tributação.”
Da Redação, com informações do Valor Econômico