China acusa “instabilidades” na relação com a França
“O caráter estratégico e especial das relações bilaterais entre a França e a China permanecem sempre. Desde que se transcenda aos preconceitos ideológicos, qualquer problema pode ser tratado adequada e judiciosamente”, escreve Cai Fangbai, ex-embaixador d
Publicado 04/02/2009 18:29
Passei um total de 24 anos na França, a começar pela criação da Embaixada chinesa, na qual participei, depois assumindo a função de embaixador acreditado junto do governo francês.
O que está profundamente gravado na minha memória é o evento de 27 de Janeiro de 1964: os governos chinês e francês divulgando, cada qual por sua iniciativa, mas simultaneamente, uma breve declaração conjunta anunciando, em duas frases, o estabelecimento de relações diplomáticas ao nível de embaixador.
A história tem mostrado que as relações sino-francesas sempre se revestiram de um caráter estratégico e especial, marcando profundamente a política internacional e do desenvolvimento da situação mundial.
Quarenta e cinco anos se passaram desde então e agora o que todos querem saber em geral é: o que deve ser feito para continuar o trabalho dos antecessores e abrir novas oportunidades às relações sino-francesas, que se acham perturbadas?
Dias primaveris e dias tempestuosos
A situação é difícil, devido à apreciação errônea do governo francês sobre a evolução do cenário internacional.
Durante os 45 anos desde o estabelecimento das relações diplomáticas, as relações entre a China e a França sofreram dias radiantes de graça primaveril, mas também outros escuros e tempestuosos.
Nos últimos anos, especialmente em 2008, a situação internacional sofreu uma mudança profunda e uma grande reorganização. Os principais eventos de importância, incluíram a crise financeira internacional, o conflito entre a Rússia e a Geórgia, o sucesso dos Jogos Olímpicos de Pequim.
Estes acontecimentos mostram que o poder de o Ocidente tem diminuído relativamente, assim como sua capacidade de controle internacional. Paralelamente, novas potências emergentes fizeram sua aparição, sua influência é cada vez maior e dia a dia cresce o seu papel papel na evolução internacional.
Sarkozy e o Dalai Lama
No contexto acima exposto, surgiram nas relações sino-francesas as maiores instabilidades desde o início dos anos 90. Sobretudo após os distúrbios e revoltas de 14 de Março de 2008 em Lhasa, quando os agentes da desordem aproveitaram a ocasião para cometer atos de violência, destruição, saques e incêndios, a mídia francesa em seu conjunto tem feito todos os esforços para denegrir a imagem da China. As autoridades francesas fizeram repetidos comentários negativos ligados e vincularam aos Jogos Olímpicos de Pequim ao problema do Tibete. Durante a visita a Paris da tocha olímpica, a desportista paraolímpica Jin Jin foi atacada por um bandido que tentou arrebatar a tocha de suas mãos. A prefeitura de Paris não quis ficar atrás e concedeu ao Dalai Lama do título de “cidadão honorário” da cidade.
O mais grave é que, quando as relações bilaterais estavam em processo de recuperação, o líder francês, desprezando os repetidas demarches das autoridades chinesas, teimou em reunir-se, ruidosa e jactanciosamente, na qualidade de presidente da República Francesa e presidente rotativo da União Europeia, com o Dalai Lama enquanto refugiado político que de há muito se consagra à divisão e separação da pátria.
A questão do Tibete diz respeito à soberania e integridade territorial da China. As ações da parte francesa afetam interesses vitais e fundamentais da China, o que, uma vez mais, põe em perigo as relações sino-francesas.
Por que as inconstâncias e caprichos
As pessoas se perguntam: por que a parte francesa mostra-de inconstante e caprichosa, desmentindo-se, retratando-se e criando histórias sobre o problema do Tibete e os Jogos Olímpicos de Pequim?
Penso que a razão principal é que a parte francesa não teve em conta a evolução rápida e complexa da situação internacional. Esqueceu que o caráter estratégico e especial das relações sino-francesas, longe de se enfraquer ou diminuir no mundo de hoje, tem se fortalecido crescido. Este esquecimento levou-a a cometer atos prejudiciais aos interesses fundamentais de sua parceira estratégica.
Por outro lado, o rápido desenvolvimento da China exerce pressão sobre a França e traz-lhe preocupações. Sem conseguir se adaptar a esta situação, que lhe parece insustentável, a França tentou usar os Jogos Olímpicos de Pequim e a questão do Tibete e para pressionar a China. Ela também cria dificuldades para a China quanto a questões como os direitos de propriedade intelectual, a taxa de câmbio do renminbi, o déficit da balança comercial, a política chinesa na África, o que assemelha-se a dificultar o processo de desenvolvimento da China. Joga também com a carta dos direitos humanos para tentar desviar atenções e reduzir a máximo a pressão sobre ela.
Relações estratégicas e especiais
O caráter estratégico e especial das relações sino-francesas ainda existe.
O futuro em perspectiva inspira-me ainda grande confiança e esperança no pleno desenvolvimento das relações entre a China e a França. Ao recordar o curso dessas relações nos últimos 45 anos, estou convencido de que o caráter estratégico e especial das relações sino-francesas ainda existe. Elas sempre tiveram este caráter, quer se desenvolvam satisfatoriamente, quer enfrentem dificuldades, porque o desenvolvimento da parceria estratégica abrangente das relações entre a China e a França não só atende a interesses fundamentais de ambos os países mas também contribui para a paz, a estabilidade e o desenvolvimento conjunto do mundo inteiro.
Na frente política, os pontos em comum são mais numerosos que os pontos litigiosos. China e França defendem o estabelecimento de um mundo multipolar, ambas utilizam o pluralismo e o multilateralismo para lidar com os desafios lançados ao mundo. Os dois países têm uma diplomacia independente e autônoma. A sua posição é idêntica ou semelhante em muitas questões internacionais importantes, motivo pelo qual as duas partes podem coordenar esforços e cooperar entre si para resolver tais problemas.
No plano da economia, a China e a França são parceiros econômicos tecnológicos importantes. Embora a concorrência entre as duas nações no mercado mundial esteja aumentando, na sequência da expansão global do poder efetivo geral da China, a complementaridade entre as duas permanece e a França ainda está na primeira posição. A China precisa de tecnologias e experiências avançadas de gestão, assim como de equipamentos sofisticados, enquanto a França continua a precisar do mercado cada vez maior da China, de produtos chineses de boa qualidade e baixo preço. Ambas as partes podem cooperar, cada uma fazendo valer seus pontos fortes e vantagens. Podem avançar conjuntamente investigações científicas e no desenvolvimento, expandir em conjunto sua atividade em outros países, criando assim uma situação de “duplo vencedor”. Para enfrentar a mais grave crise financeira internacional em mais de sete décadas, é particularmente importante que ambas as partes reforcem a cooperação e coordenação.
No front cultural, a China e a França são dois países com um antigo passado multimilenar, uma brilhante civilização e uma cultura radiante. Ambas as partes pregam a pluralidade cultural. Ambas estão determinadas a contribuir para o diálogo e o intercâmbio entre diferentes civilizações e ao estabelecimento de um mundo harmonioso caracterizado por uma paz duradoura e uma prosperidade partilhada.
Os pontos comuns acima são preciosas aquisições de ambas as partes ao longo de muitos anos e a fonte potencial da força de um contínuo desenvolvimento das relações entre os dois países. Ambos devem apreciá-los, levá-los em consideração e atribuir-lhes grande valor.
Contra o preconceito ideológico
Quando se transcende os preconceitos ideológicos é possível chegar a uma solução adequada dos problemas.
Existe certamente uma notável diferença entre a China e a França no que se refere ao sistema social, a cultura e o nível de desenvolvimento. Por isso é perfeitamente natural que existam litígios e diferenças sobre algumas questões.
As relações sino-francesas entraram numa fase-chave; a pergunta é como fazemos para continuar o trabalho dos antecessores e abrir novas perspectivas de desenvolvimento. “Quem atou o nó que o desate”, “Quem pendurou o sino que o tire”; o grande problema do momento é que a parte francesa deve considerar seriamente as preocupações das parte chinesa e tomar medidas efetivas para remediar os prejuízos que causou às relações bilaterais, para dissipar o efeito negativo, para reforçar a confiança política mútua e de construir junto com a parte chinesa um futuro brilhante, nos próximos 45 anos de relações de cooperação amistosa entre China e França.
* Fonte: Diário do Povo Online: http://french.people.com.cn; intertítulos do Vermelho